Angola: “A governação de Luanda e as nossas expectativas” – Filomeno Manaças

A nova governadora de Luanda sequer tinha respirado o ar do gabinete de trabalho, no Governo Provincial, nas redes sociais, já rolava a discussão sobre o mérito da sua escolha, para gerir, técnica e administrativamente, os assuntos da maior e mais problemática praça eleitoral do país.

Cada vez que um novo governador para Luanda é nomeado, renasce a expectativa de ver começar a ser implementado um “mini plano-Marshall” para salvar a capital dos infortúnios que, de modo cíclico e pelos piores motivos, a atiram para as manchetes dos jornais. Mas, tal como a antecessora, Ana Paula Chantre Luna de Carvalho não tem uma varinha mágica para resolver os problemas da capital do país.

As grandes dores de cabeça para a governação de Luanda sempre foram:

  • 1 – o saneamento urbano (a recolha de resíduos sólidos ou, numa linguagem mais terra-a-terra, o lixo), que, de algum tempo a esta parte, passou a ser um puzzle;
  • 2 – a macro e a micro-drenagem, que, na época das chuvas, ganham contornos dramáticos e agudizam a situação em torno de tudo o resto;
  • 3 – a mobilidade urbana, cada vez mais caótica, com o aumento da população;
  • 4 – a infra-estruturação da própria cidade.

    Todos estes assuntos passaram a ter carácter estruturante para a cidade-província, na medida em que uma implementação e uma gestão correctas dos projectos a eles ligados acabam por ter influência na funcionalidade da grande metrópole que é Luanda.

    A gestão da maioria dos últimos governadores que passaram pelo GPL esbarrou em três questões essenciais, nomeadamente, no tratamento do negócio do lixo, nos estragos provocados pelas chuvas e no choque de competências em relação à jurisdição sobre espaços territoriais. As duas primeiras tiveram, por norma, com o passar do tempo e do ponto de vista mediático, o efeito de desgaste da imagem pública, quando as coisas não correram bem. A terceira, mais de carácter interno, suscitou clivagens entre o inquilino do palácio da Mutamba e os demais poderes, espelhadas particularmente nos desabafos que dois dos governadores trouxeram a público – Bento Bento e Sérgio Luther Rescova.

    Percebe-se, à partida, e de modo muito claro, que a ex-governadora também encontrou dificuldades para traduzir em resultados concretos as grandes expectativas em si depositadas, para, pelo menos, atacar, de modo mais eficaz, o combate ao lixo e as consequências das chuvas.

    No imediato, o que se espera da nova governadora é que comece a dar tratamento, com particular incidência, a essas duas questões, não descurando, como é óbvio, as demais. Nem tudo – é bom sublinhar – depende exclusivamente de si. Uma boa notícia, para já, é a possibilidade de, ainda este ano, de o projecto do Metro de Superfície para Luanda, com 149 quilómetros de extensão, sair do papel e começar a ser implementado. A cidade capital precisa de ser refundada. E isso só será possível com obras de grande envergadura, concebidas na perspectiva de servir não apenas para o presente, mas olhando para aquilo que pode ser o seu crescimento exponencial. É coisa que não se faz em meses ou em um ano e meio. Pode durar décadas.

    Voltando à questão do lixo, a dívida contraída pelo GPL junto das empresas de recolha de resíduos leva, hoje, algumas vozes a questionarem o modelo de negócio implementado, que se está a revelar excessivamente oneroso para o Estado. E é este último aspecto dos que mais preocupa, numa altura em que se quer saber como são, afinal, gastos os dinheiros públicos. Por arrasto, questionada também é a idoneidade profissional de algumas das empresas desse sector, face aos resultados práticos da sua prestação de serviços, nem sempre condizente com o que delas se espera. Mas aqui a conversa é outra e tem a ver com o que reza o contrato, com quem fiscaliza a sua aplicação, com a forte penalização dos incumprimentos e por aí adiante…

    Há quem defenda que devia ser o próprio Estado, através de uma empresa sua, a cuidar do lixo, porque formou-se um “cartel” e agora o GPL está com as mãos atadas. Mas a interrogação está em como seria isso feito, sem cair na ociosidade que tomou conta de muitas empresas públicas, que afectou e ainda afecta seriamente o seu desempenho, em termos de ganhos de eficiência, e com os gestores mais preocupados consigo próprios do que em servir a sociedade, obrigando o Estado a admitir a sua privatização.

    Entre discussões e reflexões sobre o assunto, a verdade é que Luanda não pode continuar no estado em que se encontra, devendo, por conseguinte, imperar o pragmatismo na procura de uma solução que, para já, a liberte da situação em que se encontra. Uma solução que permita, no futuro, que o problema do lixo não se coloque cada vez que haja um novo governador.

 

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