Angola/Cafunfo: Human Rigths Watch (HRW) denuncia “abusos e pede investigação urgente e séria”

A representante da Human Rigths Watch para Angola disse hoje haver indícios “claros” de abusos policiais na resposta à manifestação de sábado nas Lundas, que fez vários mortos, e pede “investigação urgente” e “séria” às autoridades de Luanda

A representante da Human Rigths Watch (HRW) para Angola disse hoje haver indícios “claros” de abusos policiais na resposta à manifestação de sábado nas Lundas, que fez vários mortos, e pede “investigação urgente” e “séria” às autoridades de Luanda.

Em declarações à agência Lusa, por telefone, Zenaida Machado, que representa Angola e Moçambique, adiantou que os investigadores da organização de defesa dos direitos humanos ainda estão a tentar estabelecer o que realmente aconteceu, no passado sábado, em Cafunfo, quando uma manifestação anunciada como pacífica resultou num número indeterminado de mortes.

A polícia angolana contabiliza seis mortes e vários feridos, entre eles efetivos das forças da defesa e segurança, resultantes de um alegado ato de rebelião atribuído ao Movimento do Protetorado Português da Lunda Tchokwe (MPPLT), cujos elementos acusa de, na madrugada de sábado, terem tentado invadir uma esquadra policial de Cafunfo.

O MPPLT contraria a versão policial e o seu presidente disse, no sábado à Lusa, que as forças angolanas dispararam indiscriminadamente contra manifestantes desarmados, provocando 15 mortos e dez feridos.

Zenaida Machado adiantou que, pelas informações que recolheu, há um número ainda indeterminado de mortos superior ao avançado pela polícia, resultantes de uma manifestação “tida como pacífica”, mas que terá sido infiltrada “por índivíduos estranhos” ao MPPLT.

“As imagens que obtivemos dos momentos após o tiroteio que resultou num número não identificado de pessoas mortas mostram algumas irregularidades no comportamento da polícia”, disse.

De acordo com a responsável da HRW, estas imagens contradizem a versão oficial que aponta para uma tentativa de invasão à esquadra do Cafunfo às primeiras horas da manhã, que terá sido imediatamente controlada e detidas várias pessoas.

“As imagens que estamos a receber mostram o contrário. Pessoas ainda deitadas no chão, o número de imobilizados é muito superior ao número de mortos que a polícia diz e vê-se claramente um membro das forças de defesa e segurança de Angola, que se pressupõe seja o líder do grupo que estava a controlar a manifestação, a abusar de alguém que não representava nenhum perigo”, relatou

De acordo com Zenaida Machado, a informação e o material que a HRW tem estado a receber revela que “há claramente um excesso de força por parte das forças de defesa e segurança e há também uma forma irregular de tratar pessoas que não demonstram nenhum perigo no momento em que estão a ser detidas”.

A ativista lembra que este não é um acontecimento isolado em Angola e sublinha a “necessidade urgente” de o Governo de Luanda investigar o que se passou “de forma séria e com resultados muito claros, muito convincentes”.

“Se a polícia não teve nenhum nenhuma ação errada terá que justificar porque houve a necessidade de matar pessoas que, pelo menos pelas imagens que temos estado a receber, estão visivelmente desarmadas”, disse.

A responsável da HRW adiantou ainda que a maior parte dos casos de suspeitas de abuso das forças policiais em Angola ficaram por investigar e que os poucos que foram investigados terminaram com a penalização o de um ou dois elementos envolvidos.

“Angola tem de mostrar que está séria e tem um compromisso com o respeito pelos direitos humanos, pela liberdade de manifestação e pelo direito de expressão. Para fazer isso tem de começar a investigar estes casos de uma forma séria com o objetivo, não só de penalizar os implicados, mas também de reformar completamente as forças de defesa e segurança”, defendeu.

Para Zenaida Machado, é preciso que “fique claro” que casos como estes “não são tolerados” e que o Governo está interessado em mostrar que Angola “é um estado de direito em que as liberdades e direitos dos cidadãos são respeitados”.

“De cada vez que o Governo angolano falha na sua responsabilidade de investigar a conduta das forças de segurança, este tipo de incidentes tende a aumentar porque os membros destes grupos separatistas sentem a necessidade de cada vez mais demonstrar a sua voz e porque dentro das forças de defesa e segurança há um clima de impunidade total”, disse.

“Sentem que podem terminar manifestações, podem deter pessoas inocentes, podem até atirar para matar manifestantes desarmados porque sabem que nunca serão responsabilizados por esses atos”, acrescentou.

A ativista considerou ainda “lamentável” que o Governo do Presidente João Lourenço tenha chegado ao poder com a promessa de melhorar o que estava mal na presidência do seu antecessor, José Eduardo dos Santos, e, nesta altura, esteja a cometer os mesmos erros.

“Alertamos para a necessidade não só de investigar corretamente o episódio, mas também de penalizar exemplarmente quem estiver envolvido no abuso, mas também aqueles que deram ordens para que tal acontecesse ou aqueles que, sendo pessoas de autoridade, permitem que tais atos continuem a acontecer em Angola”, defendeu.

Zenaida Machado considerou que, até agora não houve uma “resposta aceitável” por parte do Governo de Luanda ao comportamento das forças de segurança, adiantando que só é possível concluir que “é do interesse do Governo de João Lourenço continuar a ter uma força de defesa de segurança indisciplinada, que deliberadamente insiste em não respeitar a Constituição da República de Angola e os direitos dos cidadãos”, sublinhou.

O Movimento Protetorado da Lunda Tchokwe luta pela autonomia da região das Lundas, no Leste-Norte de Angola.

A autonomia da região das Lundas (Lunda Norte e Lunda Sul, no leste angolano), rica em diamantes, é reivindicada por este movimento que se baseia num Acordo de Protetorado celebrado entre nativos Lunda-Tchokwe e Portugal nos anos 1885 e 1894, que daria ao território um estatuto internacionalmente reconhecido.

Portugal teria ignorado a condição do reino quando negociou a independência de Angola entre 1974/1975 apenas com os movimentos de libertação, segundo o movimento.

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