“É importante devolver a dignidade das línguas africanas” — José Eduardo Agualusa

Em entrevista à DW África no Dia Mundial de África, o escritor angolano José Eduardo Agualusa defende que se deve dar espaço às línguas autóctones africanas. “Temos de ser fortes culturalmente”, frisa o autor.

Em alusão ao dia 25 de maio, data em que se comemora o Dia Mundial de África, o escritor angolano José Eduardo Agualusa em entrevista à DW África conversou sobre o papel da arte da escrita, da cultura e das línguas africanas no desenvolvimento em África.

O escritor falou abertamente sobre o seu otimismo quanto ao desenvolvimento do continente e dos desafios a enfrentar.

José Eduardo Agualusa é dos mais premiados escritores angolanos, sendo o que tem mais obras traduzidas e vendidas no mundo.

DW África: Que papel teve e tem a arte da escrita na equação do desenvolvimento africano?

José Eduardo Agualusa (JEA): A literatura é sempre um espaço de debates, de reflexão e de pensamento. Nos nossos países tem tido um papel muito importante. Os movimentos que conduziram às independências nacionais foram precedidos por movimentos culturaisTudo começou pela poesia, a ficção e depois a reflexão através da escrita, e finalmente este pensamento permitiu que se organizassem os movimentos que começaram as independências dos nossos países. Portanto, só a partir daí já se percebe a importância da literatura em todo este processo.

DW África: A língua é o principal instrumento de comunicação e também o principal elemento de qualquer cultura. Tem obras traduzidas em mais de 25 línguas, mas sem traduções nas línguas africanas. Como vê a questão da valorização das línguas africanas e o seu papel no desenvolvimento do continente?

JEA: Defendo que se devia dar mais atenção ao ensino das línguas nacionais africanas e os Estados deviam participar ativamente na utilização literária destas línguas. É importante devolver a dignidade das línguas africanas de origem. Tenho uma proposta para traduzir em umbundu o meu último livro. Sinceramente, espero não morrer antes de saber falar fluentemente o umbundu.

DW África: Acredita piamente que a escrita transforma o mundo, por isso traz nas suas obras críticas políticas e sociais. Como vê o futuro do continente e que mensagem deixa?

JEA: Vejo com grande otimismo o futuro do continente. Eu falava da importância da literatura na construção do mundo e no caso concreto das independências dos países e o que nós assistimos neste momento é o tributo das literaturas africanas. É bom lembrar que, no ano passado, praticamente todos os grandes prémios literários foram ganhos por africanos ou por pessoas de origem africana. Então acho que isso mostra a vitalidade e a potencialidade da nossa literatura africana. Há uma grande vitalidade da cultura africana no seu conjunto. Se o continente tem esta vitalidade cultural, não devemos ter receio do futuro. Porque é a cultura que conduz tudo. Não há como compreender o presente sem compreender o passado. Então é preciso ir lá atrás.

DW África: Quais são os principais desafios do continente? 

JEA: Em primeiro lugar temos de ser fortes culturalmente e somos já. Já temos esta vitalidade. Então, agora o desafio é mesmo democratizar completamente os nossos países e desenvolvê-los. Isso implica combater a corrupção. Estes males estão identificados. É importante que todo o conjunto da sociedade civil se emprenhe neste combate e nesta mudança. Mas o essencial – que é a cultura e a vitalidade cultural – nós já temos.

 

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