Os ex-trabalhadores do Banco Angolano de Negócios e Comércio (BANC) acusam o juiz Osvaldo Malanga de ordenar a comissão liquidatária vender bens incorporado na massa falida, antes do momento processual, atesta um conjunto de documentos em posse do Jornal Mercado.
O juiz (nomeado pelo Tribunal Provincial de Luanda para conduzir o processo de liquidação do BANC), em declarações exclusivas ao Mercado, confirmou a orientação e disse ter agido assim por falta de dinheiro para o funcionamento da comissão liquidatária (ad hoc), que é a causa de desentendimento entre o magistrado e ex-trabalhadores bancários.
“Houve a solicitação de apoio ao BNA e ao Tribunal, para que fossem disponibilizadas verbas para dar início ao processo de gestão do acervo patrimonial, mas não houve atendimento aos pedidos, de modo a viabilizar o início do trabalho de gestão”, esclareceu o juiz Osvaldo Malanga, transferido à Sala do Comércio do Tribunal Provincial de Luanda.
Antes da autorização da venda antecipada de algum património para a cobertura das despesas de gestão da massa falida, explica, a administração judicial endereçou um requerimento ao síndico (magistrado da ProcuradoriaGeral da República junto do Tribunal) a solicitar anuência, mas sem sucesso.
Acto considerado legal
O procedimento, dianta o juiz na missiva endereçada ao Mercado, tem respaldo legal, conforme disposto no artigo 1214.º do Código de Processo Civil (CPC).
Inglês Pinto, advogado e exbastonário da Ordem dos Advogados de Angola (OAA), chamado a falar sobre a matéria, disser ser legalmente normal o procedimento do magistrado judicial (Osvaldo Malanga), mas desde que esteja salvaguardada o interesse dos ex-trabalhadores porque é da massa falida que sairá o dinheiro para indeminização e imposto ao Estado.
A constituição da comissão liquidatária é a principal causa da discórdia. Para os ex-trabalhadores do BANC, como está expresso nos documentos em posse do Mercado, a comissão criada pelo Tribunal deveria incluir indivíduos ligados ao banco em causa por que se consideram (únicos) aptos para dar suporte à administração da massa falida.
Protestos à comissão liquidatária
“Em termos práticos, a gestão da massa falida do BANC em liquidação foi entregue aos membros da comissão liquidatária ad hoc, os quais agem sob orientação do Tribunal de Direito e não do Síndico, único com poderes de orientação sobre os actos praticados pelo administrador da massa falida, conforme previsto na lei processual (CPC)”.
Os antigos trabalhadores, ainda nos documentos em posse do Mercado, também contestam a comissão liquidatária ad hoc pelo facto de maior parte dos integrantes desempenham, acumulativamente, funções em outras instituições, o que (segundo eles) fere o previsto no artigo 31º da Lei de Base das Instituições Financeiras (LBIF).
A comissão liquidatária constituída pelo Tribunal é considerada (pelos ex-bancários) um risco de dissipação do património da massa falida do banco criado em 2007 e cancelada a licença (pelo Banco Nacional de Angola) em 2019 por incapacidade de cumprimento do Aviso nº02/2018 de 2 de Março que impunha o aumento dos rácios de capital.
Remuneração aceitável
Sobre esta matéria, o advogado e docente universitário, Inglês Pinto, considera razoável porque está de acordo com a média praticada do mercado. “Há administradores em bancos que auferem salários de 5 ou 6 milhões Kz”, disse o jurisconsulto ouvido pelo Mercado.
Juiz Osvaldo Malanga contraria os argumentos avançados pelos ex-trabalhadores do BANC, afirmando que os membros da comissão liquidatária da massa falida têm o perfil exigido, inclusive pelo Banco Nacional de Angola (BNA), na qualidade de regulador.
“O perfil exigido é de contabilista, jurista e economista. Os nomeados são docentes em várias universidades e alguns deles com obras no mercado. Os actos praticados pela administração judicial têm perfeita anuência do síndico, aliás, o administrador tem 40 anos de BNA é contabilista e jurista de profissão.”, disse magistrado judicial, em declarações exclusivas ao Jornal Mercado.
Juiz diz-se ofendido
Osvaldo Malanga diz-se ofendido pelas declarações dos ex-trabalhadores do BANC, expressas numa carta e promete responsabilizar criminalmente os subscritores.
“É muito grave a acusação que contra nós é feita, enquanto juiz, visto que em momento algum terei subtraído o que quer que seja do património do falido e aditado ao nosso”.
O magistrado judicial também disse que “se tivesse interesse nalguma coisa teríamos usado outro mecanismo, como por exemplo comprar por interposta pessoa ou outro qualquer fraudulento, mas que não o fizemos e nem pretendemos fazer”.
Ainda disse que fruto da actividade dele foi aberta uma conta bancária onde foi depositado todo o dinheiro arrecadado e será posteriormente transferido para a conta do Tribunal, a fim de se pagar os credores.
Alves Bernardo, jurista, diz que não legal e muito menos moralmente recomendável que membros do banco, cuja licença comercial lhe foi retirada por práticas desconformes aos fundos próprios regulamentares e deficiência no modelo de governança participem do processo de recuperação de activos para posterior liquidação.
O jurista também esclareceu que, no caso em concreto, a administração da massa falida do BANC não tem como escopo o exercício da actividade mercantil, tem a missão de administrar o património do falido e recuperá-lo para o alcance das finalidades do processo de falência.
“Para dizer que a administração da massa falida não tem qualquer vinculação empregatícia com os colaboradores do falido”, declarou o jurista citado para justificar a ausência dos antigos trabalhadores do BANC na comissão liquidatária.