O julgamento sobre a suspeição do ex-juiz Sergio Moro na condenação do antigo Presidente brasileiro Lula da Silva foi suspenso, devido ao facto de o magistrado Nunes Marques ter pedido mais tempo.
A conclusão do julgamento sobre a suspeição do ex-juiz Sergio Moro na condenação do antigo Presidente brasileiro Lula da Silva foi esta terça-feira adiada, após o magistrado Nunes Marques pedir mais tempo para analisar o processo.
Neste caso, os juízes do Supremo Tribunal Federal (STF) decidirão se Moro, que também já foi ministro da Justiça no atual Governo de Jair Bolsonaro, agiu com parcialidade ao condenar Lula da Silva no caso do apartamento triplex do Guarujá (São Paulo), investigação no âmbito da Operação Lava Jato no Paraná. Uma primeira decisão ditou que Moro não teria competências, em termos geográficos, para julgar o caso, o que levou à anulação – ainda não definitiva – das condenações de Lula; uma decisão pela imparcialidade de Moro poderá mesmo ditar a anulação das provas.
Com o placar da votação empatado com dois votos a favor e dois contra, o julgamento sobre as suspeitas de parcialidade foi suspenso devido ao facto de Nunes Marques ter entrado com um pedido de vista [mais tempo para analisar o processo], faltando apenas mais um voto para a conclusão do mesmo.
Na tarde desta terça-feira, os juízes Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski votaram pela anulação de todos os atos assinados por Moro no caso do triplex. Por outro lado, os magistrados Edson Fachin e Cármen Lúcia já haviam se posicionado a favor de Moro no final de 2018, quando a análise do caso foi iniciada e suspensa devido a um pedido de vista de Gilmar Mendes.
Contudo, esta terça-feira, Cármen Lúcia indicou que dará um novo voto sobre o tema, o que pode indicar uma mudar de posição.
Nos agora votos proferidos, Gilmar Mendes apresentou duras críticas ao ex-juiz, ao afirmar que Moro cometeu um crime para perseguir Lula da Silva e tirá-lo do processo eleitoral de 2018.
O combate à corrupção tem que ser feito dentro dos moldes legais, não se combate crime praticando crime. (…) Cada um vai ter o seu tamanho no final da história, um pouco mais de modéstia, calcem as sandálias da humildade”, criticou Mendes.
Para o magistrado do Supremo, houve um “jogo de poder ” um “conluio” entre Moro e os procuradores que atuaram no grupo de trabalho da Lava Jato no Paraná, advogando que Sergio Moro interferiu na produção de provas contra os acusados, dirigiu as investigações do Ministério Público Federal e juntou documentos de ofício, sem manifestação do órgão.
“Diversas vezes, Moro não se conteve em pular o balcão. Ele gerenciou os efeitos da exposição mediática dos acusados. Estava na dianteira de uma narrativa que culminaria num projeto de poder, que passava pela deslegitimação do PT [Partidos dos Trabalhadores], especialmente de Lula, para afastá-lo do jogo político”, argumentou o juiz.
Segundo Gilmar Mendes, os atos praticados por Sergio Moro não permitem manter a perceção de que o julgamento de Lula foi feito por um juiz destituído preconceitos quanto à sua culpabilidade.
Mendes voltou ainda a criticar a operação anticorrupção Lava Jato no Paraná e no Rio de Janeiro, afirmando tratar-se do maior escândalo judicial da história brasileira.
Também Lewandowsi votou pela suspeição do ex-juiz da Lava Jato, sustentando que “restou escancarada uma devida confusão entre as atribuições de julgar e acusar por parte do então magistrado Moro”.
“Todos os desdobramentos processuais, concomitantes e posteriores, levam ao inexorável desenlace no sentido de que o ex-juiz extrapolou a não mais poder os limites da função jurisdicional da qual estava investido, neutra e imparcial por definição, ao assumir o papel de verdadeiro coordenador dos órgãos de investigação e acusação, em paralelo à função de julgador. Ficou patenteado o abuso de poder”, frisou Lewandowsi.
O julgamento ainda não tem data marcada para ser retomado.
O STF brasileiro anulou na segunda-feira todas as condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pela Justiça Federal no Paraná, relacionadas com as investigações da operação Lava Jato.
Isto não quer dizer que o antigo chefe de Estado brasileiro tenha sido inocentado já que os processos serão remetidos para a justiça do Distrito Federal, que vai reavaliar os casos e pode receber novamente as denúncias e reiniciar os processos anulados. Com a decisão, porém, Lula da Silva voltou a ser elegível e recuperou seus direitos políticos.
O caso não é linear, uma vez que não estão em causa apenas as suspeitas sobre uma eventual parcialidade de Moro na forma como julgou o caso. Há também uma questão processual, que valeu desde logo a anulação das condenações e a necessidade de as reavaliar: o juiz Fachin decidiu que a 13ª Vara Federal de Curitiba – a secção liderada pelo ex-ministro da Justiça de Bolsonaro – não tinha competência, em termos geográficos, para julgar Lula, pelo que remeteu o caso e as respetivas provas para a Justiça Federal do Distrito Federal, explica o jornal Folha de São Paulo. Pelo contrário, se a decisão do tribunal for pela parcialidade de Moro, as provas que tiverem tido a sua “anuência” ficarão invalidadas, pelo que os resultados dos dois casos se cruzam.
Com as notícias que, na imprensa brasileira, dão conta de que Lula se torna assim o mais forte candidato a disputar a presidência do Brasil em 2022 contra Bolsonaro, o atual presidente já veio pedir a reversão da decisão sobre Lula e acusar o juiz que a ditou de ter uma “forte ligação com o PT”, o partido de Lula, assegurando, em entrevista à CNN Brasil, que o país se recorda da “bandalheira” vivida durante a governação do ex-presidente.
Artigo atualizado às 9h31 do dia 10 de março com mais informação sobre a decisão do tribunal e a reação de Jair Bolsonaro.