De acordo com o Observador, o juiz Carlos Alexandre deu seguimento a um pedido do Estado angolano para que o arresto à empresária e filha do ex-presidente daquele país fosse alargado até cinco mil milhões de euros, passando a incluir as participações da Isabel dos Santos em várias empresas portuguesas.
Angola não desiste de tentar ser ressarcida dos alegados prejuízos provocados por Isabel dos Santos aos cofres públicos de Angola.
E promoveu mesmo o alargamento das contas bancárias e dos bens móveis e imóveis que a filha de José Eduardo dos Santos detém em Portugal e noutros países até a um valor de cinco mil milhões de euros — quase quintuplicando o anterior valor que já tinha decretado pelo juiz Carlos Alexandre, tal como o Observador noticiou em março em primeira mão.
Ao que o Observador apurou, a promoção apresentada pelo Tribunal Supremo de Angola, o órgão do poder judicial angolano que está a solicitar a cooperação judicial a Portugal, visava igualmente o arresto de vários imóveis localizados em Londres que são propriedade de diversas sociedades de Isabel dos Santos que estão sediadas em Malta e no Dubai. O juiz Carlos Alexandre terá recusado esta quinta-feira incluir tais bens imóveis no arresto mas aceitou alargar o objeto da medida preventiva patrimonial até perfazer a quantia de cinco mil milhões de euros — o novo valor máximo dos bens que podem ser arrestados.
Esta nova promoção do Tribunal Supremo de Angola visa igualmente especificar matérias relacionadas com as participações de Isabel dos Santos no banco Eurobic (onde tem uma participação de 42,5% através das sociedades maltesas Santoro Financial Holding SGPS, SA, e Finisantoro Holding Limited), na Nos (onde controla 26,02% indiretamente) e na Efacec Power Solutions (onde controla 67,2% da Efacec Power Solutions).
O Governo de António Costa decretou a 2 de julho de 2020 a nacionalização da participação de Isabel dos Santos na Efacec e agora o Tribunal Supremo de Angola requereu ao juiz Carlos Alexandre que decretasse o arresto da indemnização que terá de ser paga pelo Estado português. Recorde-se que Pedro Siza Vieira, ministro da Economia, disse na altura que “tem de haver discussão sobre quem tem direito a receber o valor da indemnização”, tendo em conta que existiam vários penhores de bancos sobre as ações de Isabel dos Santos.
Já no que diz respeito às participações na operadora Nos e no banco Eurobic, Angola reforçou agora com novos argumentos o arresto do produto da venda daquelas duas posições acionistas que já tinha sido deferido pelo Tribunal Central de Instrução Criminal. Com o arresto original de março, Isabel dos Santos já tinha sido impedida de dispor dos benefícios da titularidade daquelas ações, nomeadamente ao nível dos dividendos.
A Sonae, que anunciou ao mercado em abril que iria contestar o arresto decretado pelo juiz Carlos Alexandre, acabou por romper em agosto a parceria formal que tinha com a filha de José Eduardo dos Santos. Ou seja, o grupo da família Azevedo anunciou que a sociedade ZOPT, que controlava a holding da Nos com uma posição de 52% e que era participada a meias por Isabel dos Santos e pela Sonae, seria dissolvida.
Resultado: a Sonae anunciou igualmente que iria comprar a posição de 7,38% do BPI na ZOPT, assumindo assim uma participação direta na Nos equivalente a 33,45% do capital social da operadora. Já Isabel dos Santos deverá fica com uma participação direta na Nos de cerca de 26%. É o eventual produto da venda desta última participação que fica agora igualmente arrestado.
O arresto preventivo de contas bancárias e dos bens acima descritos foi decretado originalmente em março pelo juiz Carlos Alexandre por promoção do Ministério Público. Tudo na sequência do cumprimento de uma carta rogatória expedida pelo Tribunal Supremo de Angola que chegou à Procuradoria-Geral da República a 28 de janeiro.
A justiça angolana queria então garantir o pagamento de cerca de 1,1 mil milhões de euros de prejuízos alegadamente causados ao Estado angolano por Isabel dos Santos. A filha de José Eduardo dos Santos é suspeita de ter alegadamente praticado em Angola os crimes de burla qualificada e abuso de confiança tendo alegadamente desviado dos cofres do Estado e da Sonangol as verbas que lhe permitiram adquirir as participações na Nos, Eurobic e Efacec.
Ao que o Observador apurou, o alargamento do arresto para um valor até cinco mil milhões de euros tem subjacente novas imputações que o Tribunal Supremo de Angola faz a Isabel dos Santos relacionadas com a gestão da Sonangol — principal empresa pública angolana que Isabel dos Santos liderou entre 2016 e 2017.
Tal como o Observador noticiou, na origem destes arrestos está um processo aberto no Tribunal Supremo de Angola relacionado com os alegados benefícios ilícitos que o então Presidente José Eduardo dos Santos terá concedido à sua filha para que esta e o seu marido Sindika Dokolo (recentemente falecido) entrassem no negócio de diamantes em Angola — e que já estiveram na origem do arresto dos bens de Isabel dos Santos em Angola.
Além dos prejuízos do negócio dos diamantes, a Justiça angolana imputa ainda a Isabel dos Santos alegados desvios de fundos públicos da Sonangol, tendo como pano de fundo as consultoras contratadas que estiveram no centro do caso Luanda Leaks revelado pelo Expresso e pelo Consórcio Internacional de Jornalistas: a Matter e a Ironsea.
De acordo com a Justiça angolana, está em causa um prejuízo de cerca de 131,1 milhões de dólares (cerca de 118,1 milhões de euros ao câmbio atual) por serviços que nunca terão sido prestados à Sonangol e que resultaram na transferência entre maio de 2017 e 16 de novembro de 2017 daquela quantia saída dos cofres da petrolífera para a Matter e a Ironsea. Cerca de 69,3 milhões de dólares (cerca de 62,4 milhões do câmbio atual) foram pagos horas depois de Isabel dos Santos ter sido exonerada pelo Presidente João Lourenço da liderança da petrolífera.
Também alegados aumentos salariais irregulares da administração da Sonangol, logo após a sua tomada de posse e sem a autorização do Governo, são igualmente imputados pelo novo regime de Angola. Não só Isabel dos Santos se aumentou a si própria de 31.500 dólares para 50.488 dólares, como subiu igualmente os salários dos administradores e até de diretores.
Texto do Observador