Um dos réus foi evacuado, mas continua detido, e desconhece-se o paradeiro do segundo réu infetado. A defesa pediu ao tribunal “condições para prosseguir” o julgamento.
Duas das mais de cem pessoas detidas sábado (24.10) numa manifestação em Luanda, Angola, das quais uma aguarda julgamento, testaram positivo à Covid-19, disse à Lusa um dos advogados do processo, acrescentando que a defesa pediu ao tribunal “condições para prosseguir”.
Laurindo Fonseca, um dos 15 advogados que representa a centena de manifestantes cujo julgamento deverá iniciar-se esta terça-feira (27.10), afirmou que todos os detidos foram testados antes de recolherem às celas, no sábado, mas os resultados só foram recebidos na segunda-feira (26.10), registando-se dois casos positivos.
“Um dos réus acusou positivo e foi evacuado”, mas está ainda detido e será ainda julgado.
O paradeiro da outra pessoa é desconhecido. “Pensamos que pode ser um dos jornalistas que foram detidos e entretanto libertados, que não fazem parte deste processo, mas não temos certezas”, admitiu Laurindo Fonseca.
O advogado sublinhou que os arguidos têm estado juntos nas celas e que os seus representantes já tomaram diligências no sentido de o tribunal “criar condições para se poder prosseguir o processo”.
Réus acusados de desobediência
Entre os 104 arguidos, sete têm menos de 18 anos: seis são considerados imputáveis, por terem entre 16 e 17 anos e um, de 15 anos, inimputável face à lei angolana foi solto na segunda-feira e irá responder numa jurisdição de menores.
Os réus são acusados de desobediência ao decreto presidencial 276/20, de 23 de outubro, com medidas mais restritivas no âmbito da prevenção da Covid-19, incluindo a proibição de ajuntamentos públicos com mais de cinco pessoas, quatro ofensas corporais voluntárias e dois crimes de danos voluntários sobre bens da Polícia Nacional.
Na segunda-feira, os arguidos estiveram no tribunal mas não chegaram a ser ouvidos, tendo o dia sido ocupado com a discussão de questões prévias.
“Foi discutida a repartição dos réus pelos advogados, questões relacionadas com correção de identidades e com os menores que se encontram entre os detidos, bem como a inconstitucionalidade de algumas normas do decreto presidencial”, adiantou Laurindo Fonseca.
“Tudo vai depender das condições sanitárias”
Questionado sobre a linha que irá seguir a defesa dos arguidos, Laurindo Fonseca salientou que o Ministério Publico terá de provar que foram autores dos crimes, já que a responsabilidade criminal é individual.
“Terão de provar que cada um dos 104, agora 103, acusados terão participado em cada um destes crimes, caso contrário terão de ser soltos”, indicou
Tratando-se de um processo sumário, Laurindo Fonseca afirmou que os réus terão de ser julgados e conhecer a decisão do tribunal num prazo máximo de oito dias.
Os réus já estão nas celas do tribunal provincial de Luanda, mas o julgamento não tem hora para começar: “tudo vai depender das condições sanitárias”, reforçou o advogado.
Na sexta-feira (23.10), o Governo angolano emitiu novas medidas de combate e prevenção da Covid-19, num decreto sobre o Estado de Calamidade Pública, que entre várias restrições, proibiu ajuntamentos na rua de mais de cinco pessoas.
Governo nega mortes e fala em vandalismo
No dia seguinte, uma manifestação em Luanda resultou na detenção de mais de cem pessoas, entre as quais dirigentes da UNITA, o maior partido da oposição, ativistas da sociedade civil e jornalistas.
O secretário de Estado do Ministério do Interior, Salvador Rodrigues, que negou a existência de qualquer morte resultante do evento, disse ainda que seis polícias ficaram feridos na sequência de confrontos entre o cordão policial e os manifestantes.
De acordo com o governante angolano, as forças da ordem foram recebidas com violência, “apedrejamento, queima de pneus na estrada”, tendo ficado queimada uma motorizada da força pública, uma viatura dos bombeiros, uma ambulância que ficou com o vidro partido e uma viatura da unidade de trânsito.
A governadora de Luanda, Joana Lina, classificou a marcha como um “ato de vandalismo”.
As condenações
Várias organizações não-governamentais condenaram entretanto a violência contra os manifestantes e os ataques à liberdade de imprensa, devido à detenção e agressão de jornalistas que foram obrigados a apagar imagens das suas câmaras fotográficas.
Na segunda-feira, a chegada dos detidos ao Tribunal Provincial de Luanda foi recebido aos gritos de “Liberdade, Já” por várias dezenas de jovens que se concentraram frente ao edifício durante todo o dia e só desmobilizaram ao início da noite, protagonizando alguns momentos de tensão com a polícia.
LUSA