Nada disso. Antes, pelo contrário, Agostinho Neto sentenciou naquele dia, conforme lemos no Texto da Proclamação da Independência, o seguinte:
«Realizando concretamente as aspirações das largas massas populares, a República Popular de Angola, sob a orientação do MPLA, caminha progressivamente para um Estado de Democracia Popular. Tendo por núcleo a aliança dos operários e camponeses, todas as camadas patrióticas estarão unidas contra o imperialismo e seus agentes.
Os órgãos do Estado da República Popular de Angola guiar-se-ão pelas directrizes superiores do MPLA mantendo-se assegurada a primazia das estruturas do Movimento sobre as do Estado.»
Ora, de 1975 a 1992, o citado «Estado de Democracia Popular» não foi senão um Estado de inspiração comunista (marxista-leninista), de um único partido, sem direitos, liberdades e garantias, economia planificada etc. Nada a ver com o Estado Democrático de Direito e Economia de Mercado.
A Holden Roberto (líder da FNLA) e a Jonas Savimbi (líder da UNITA) restaram basicamente as seguintes opções: (1) guerra de resistência para a mudança do sistema político e do regime (de inspiração comunista, isto é, marxista-leninista); (2) submissão e extinção da FNLA e da UNITA (os quadros acabariam absorvidos pelo regime); e (3) desistência e exílio no estrangeiro.
Jonas Savimbi, ao contrário de Holden Roberto, decidiu que iria resistir, e assim aconteceu. A guerra de resistência para a mudança do sistema político e do regime levou ao fim da República Popular de Angola e deu lugar à República de Angola.
Como se pode notar, em 1975 o MPLA impôs a sua vontade e tomou o poder (violando o Acordo de Alvor) segundo o seu projecto de poder. Foi necessário que a UNITA tivesse levado a cabo uma feroz resistência político-militar contra o regime do MPLA para que o estabelecimento de um Estado Democrático de Direito e de Economia de Mercado fosse uma realidade, ainda que parcial em termos de materialidade efectiva.
O projecto de poder do MPLA não conhece limites senão ele próprio. Tal como apontei num texto anterior (disponível aqui), esse partido seria capaz de mergulhar novamente Angola numa guerra se a guerra fosse o último recurso para manter-se no poder.
Neste ano, que está nos seus últimos dias, ficou evidente que, com recurso à maracutaias diversas (a pandemia foi apenas uma), as autarquias não serão uma realidade em Angola a curto prazo enquanto o MPLA não quiser, ou seja, à luz do seu projecto de poder, as autarquias (e outros compromissos nacionais) não devem ser implementadas em Angola senão depois de 2022. A máquina de estratégia do MPLA chegou à conclusão de que implementar as autarquias antes de 2022 criaria graves problemas de manutenção do seu poder. O presente estado nacional de desencanto e raiva anti-MPLA levaria à sua derrota nos municípios-chave de Angola, logo, nas eleições de 2022, a derrota do MPLA seria tão grande, que seria necessário um esforço de proporções gigantescas para conseguir manipular os resultados eleitorais.
Questiono: o Povo angolano – já farto de uma desastrosa governação de 45 anos – vai simplesmente deixar o MPLA gerir a questão das autarquias a seu bel-prazer, ou vai obrigar o partido delinquente a implementar as autarquias à luz da vontade popular?
Obviamente, o Povo não apenas não deve permitir que o MPLA transforme a agenda das autarquias num mecanismo de manutenção do poder, como deve recorrer aos diversos meios que tem à disposição para pôr fim à veleidade do partido delinquente em adiar Angola mais uma vez.
Sobre os meios, não sejamos ingénuos: cidadanias de sofá, apelos públicos, petições públicas e Assembleia Nacional serão inúteis.
Presentemente, o mecanismo de pressão política que o MPLA mais teme e que melhor se adequa à estratégia popular de forçar a implementação das autarquias antes de 2022 é este: manifestação.
Não me refiro a manifestações de meia-dúzia de pessoas. Nos últimos 3 meses de 2020, ficou evidente que é possível – com manifestações – encher as ruas do País e, desta forma, obrigar o MPLA a escolher entre ceder e ver-se sem saída, acabando por precipitar a sua destituição.
As manifestações deverão durar dias, semanas ou meses, se possível. Isto não é destilação de uma visão romântica. É possível. Para tal, será necessária uma logística que poderá ser suportada através de uma extensa e organizada rede de contribuições.
As manifestações deverão, se necessário, fazer parar o País.
A regra é simples: não deixar João Lourenço e o MPLA dormirem.
Tenho como proposta de calendário de manifestações contínuas o seguinte:
1 – Manifestação de 4 de Janeiro de 2021;
2 – Manifestação de 4 de Fevereiro de 2021;
3 – Manifestação de 15 de Março de 2021;
4 – Manifestação de 4-5 de Abril de 2021;
5 – Manifestação de 1 de Maio de 2021;
6 – Manifestação de 5 de Junho de 2021;
7 – Manifestação de 3 de Julho de 2021;
8 – Manifestação de 7 de Agosto de 2021;
9 – Manifestação de 17 de Setembro de 2021;
10 – Manifestação de 15 de Outubro de 2021;
11 – Manifestação de 11 de Novembro de 2021;
12 – Manifestação de 10 de Dezembro de 2021.
Cada manifestação deverá ser realizada em cada capital de província. A adesão será garantida através de um eficiente e eficaz processo de consciencialização e mobilização.
Somos milhões, e contra milhões o MPLA não poderá prevalecer.
Nuno Álvaro Dala