Processo de impugnação do concurso que designou Manuel Pereira da Silva como presidente da CNE está estagnado há 11 meses. Críticos dizem que morosidade é sinal de falta de independência do sistema judiciário angolano.
Há cerca de um ano que quatro dos candidatos que perderam o concurso à presidência da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) pediram a nulidade do processo e a suspensão da tomada de posse do novo presidente, Manuel Pereira da Silva “Manico”.
Em causa estaria o perfil do candidato e alegadas irregularidades na candidatura. Entre os queixosos está o juiz-conselheiro do Tribunal Supremo de Angola, Agostinho António Santos.
Onze meses depois, a câmara administrativa do Supremo ainda não se pronunciou sobre o assunto. Devido ao silêncio, os queixosos recorreram ao Tribunal Constitucional, alegando, entre outras irregularidades, a denegação de justiça e omissão de julgar o processo por parte do Supremo.
No entanto, a imprensa aponta para a publicação em breve de um acórdão do tribunal favorável aos queixosos.
Seriedade do sistema judicial em causa?
Inglês Pinto, advogado e antigo bastonário da Ordem dos Advogados de Angola, não tem dúvidas de que este processo está a pôr em causa a seriedade do sistema judicial. “Estou extremamente preocupado com todas as questões polémicas, quer do ponto de vista da análise extremamente jurídica, quer do ponto de vista político, porque a estrutura da CNE e do Tribunal Supremo é essencialmente política, formal”, lembra.
“Sempre questionei a forma de constituição desses órgãos, sempre tive algumas reticências. Toda essa polémica pode levar também o cidadão a pôr em causa a firmeza, a confiança e a seriedade nas instituições”, alerta o advogado.
O novo presidente da CNE é tido como pró-MPLA e não é bem visto entre os partidos da oposição. A tomada de posse de Manuel Pereira da Silva, a 19 de fevereiro, foi viabilizada com 111 votos dos deputados do MPLA. Os partidos na oposição abandonaram o Parlamento.
Sobre Manuel Pereira da Silva pesam acusações de gestão danosa do erário público quando era o presidente da comissão provincial de Luanda, a maior praça eleitoral do país, cargo que desempenhou até se candidatar à liderança da CNE.
“Um dia muito triste” para a democracia
Liberty Chyaka, o líder do grupo parlamentar do maior partido na oposição, a UNITA, diz que o dia da tomada de posse de Manuel Pereira da Silva como presidente da CNE foi “um dia muito triste” para a democracia no país. “A casa da democracia acabou de cometer um suicídio”, declarou.
O MPLA e o seu Presidente, João Lourenço, entendem que o processo relativo à escolha de Manuel Pereira da Silva, bem como o conflito desencadeado junto dos tribunais, diz respeito aos órgãos de justiça.
Mas para a CASA-CE, a terceira força política do país, os partidos não podem ficar indiferentes em relação a este caso. O vice-presidente da coligação, Manuel Fernandes, fala numa violação da Constituição por parte do guardião da justiça em Angola.
“Estamos perante a denegação de justiça por parte deste órgão, o que é muito mau. Pensamos nós que estamos num Estado democrático de Direito, e todos nós temos que lutar para a consolidação do processo democrático no nosso país, bem como o Estado de Direito. E é muito mau que aqueles que devem ser o guardião sejam eles a denegar o direito de justiça dos cidadãos”, criticou.
O advogado Arão Bula Tempo, conhecido ativista dos direitos humanos em Cabinda, diz que este caso é uma prova da falta de independência do sistema judiciário do país. “A maioria das decisões ou a prática dos juízes tornaram-se práticas políticas. Enquanto o tribunal não for independente teremos sempre estas dificuldades”, conclui.