A destituição do rei Ekuikui V está a gerar polémica na província angolana do Huambo. O soberano foi acusado de lesar a ordem moral e as tradições do reino “Umbala Bailundo”. Defensores dizem que há perseguição política.
O soberano Armindo Francisco Kalupeteka – Ekuikui V – que esteve oito anos à frente dos destinos da “Umbala Bailundo”, o maior reino ovimbundu, foi acusado de práticas que lesam a ordem moral e as tradições culturais do reino. Ele foi afastado do poder a 26 de março por um coletivo de sobas, autoridades tradicionais.
Na província do Huambo, a decisão da representação local da associação das autoridades tradicionais de Angola é tida como inédita e polémica.
Ouvido pela DW África, Armindo Francisco Kalupeteka refuta as acusações e diz não reconhecer competência ao órgão que o destituiu do cargo. “Até hoje a corte da Umbala Mbalundo, não reconhece está substituição. Eu morro como rei, mesmo na urna sou chamado como rei. A nossa constituição tradicional não rege estes atos, que alguém possa ser substituído vivo. A nossa ombala está interrogada, porque nunca viram e nunca ouviram isso”:
As polémicas envolvendo o rei do Bailundo começaram com o seu julgamento e condenação à pena de 6 anos de prisão efetiva, em fevereiro do corrente ano, pelo tribunal provincial do Huambo. Foi acusado de participação num homicídio, em 2017, na sequência de um julgamento tradicional, por crenças no feiticismo.
“Humilhação pública”
Kalupeteka descreveu a decisão judicial como uma humilhação pública a um rei. Na altura, chegou a prometer marchar a pé do Bailundo a Luanda, acompanhado pela sua corte, para pedir explicações ao Presidente da República, João Lourenço. Acabou por anunciar que iria trocar a marcha por uma carta ao chefe de Estado.
Tal como Ekuikui V, muitos não encontram legitimidade na posição das autoridades tradicionais e consideram a medida fora do contexto da umbala. Para o engenheiro agrónomo e munícipe do Huambo Elias Kalende, o soberano do Bailundo é vítima de uma cabala política.
“Eu não concordo com a destituição do rei do bailundo. Cada área tem a sua cultura e o rei do bailundo é eleito pela família até a sua morte. O que estão a fazer é a política e não uma coisa séria”, disse Elias Kalende.
O coletivo das autoridades tradicionais aponta, na sua resolução, erros graves de governação do reino, como a concentração de poderes, venda ilegal de parcelas de terra das populações, para além de acusar o rei de se desfazer da estrutura tradicional e funcional da corte do reino.
“Mão invisível”
Perante todas as acusações, o soba Domingos Manuel considera que há matéria suficiente para justificar o afastamento de Armindo Kalupeteka do trono. “Aqui temos muitos sobas e a decisão que foi tomada deve ser acatada por todos isso é mesmo assim”.
Já o político e jurista António Soliya Selende classifica a destituição do rei do Bailundo como uma “vergonha”. Selende diz existir uma mão invisível do poder político no afastamento dos vários reis do Huambo.
“É vergonhoso de facto, o que nós acompanhamos, as sucessivas destituições dos reis do Huambo. Muitos só despertaram com a destituição do rei do Bailundo, mas nós vimos este desde o ano de 2018, o poder tradicional a ser invadido pelo poder político. Um rei pelo que sabermos só pode sair do trono com a sua morte”.
Formado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade José Eduardo dos Santos, Armindo Kalupeteka subiu ao trono a 13 de abril de 2012, depois da morte do rei Katchitiopololo “Ekuikui IV”, no mesmo ano.
Em sua substituição, foi indicado João Kawengo Kasanji, de 52 anos, atual soba grande da umbala Chilume.