Surpreendo-me com a comiseração de muitos com a situação, aparentemente degradante, do antigo chefe de Estado, apresentada num vídeo, acompanhado pelo nosso embaixador nos Emirados Árabes Unidos.
Suspeito que muitos dos que tomam esta atitude de comiseração para com esta situação particular – componentes da elite da nossa sociedade, aquela que verdadeiramente condiciona os rumos do nosso devir – são daqueles mesmo que reagiram, tão adversamente, à minha proposta de saida do universo de 15 anos de Eduardismo, pós-guerra civil, através de um modelo de perdão geral, para iniciarmos uma nova vida em Angola, menos amarrada aos equívocos e situações mesmo muito graves do passado.
A minha ideia é que, independentemente das responsabilidades que tenhamos tido (eu próprio, por exemplo) em relação a esses erros do passado, até 2017, a História de Angola poderia nos absolver, se tivermos em conta a complexidade da situação com que partimos, em 1975. Eu, por exemplo, era apenas um rapaz de 22 anos de idade e só queria saber da independência, com o meu MPLA no comando, sem avaliar os modelos e as transições necessárias. Era o tempo das estratégias de exclusão.
“Não é questão de me sentir iluminado, mas penso que muita gente, dentro e fora da MPLA, me fará justiça, reconhecendo que há muitos anos, e com algumas consequências gravosas para a minha vida pessoal, me referi à necessidade de encontrarmos uma solução global para Angola, sem exclusões”. Daí, provavelmente, o meu entusiasmo (não fui o único) com os discursos e algumas práticas, infelizmente efêmeras, da liderança inicial do Presidente João Lourenço. É que se tinha ido tão longe que era difícil imaginar que continuássemos na mesma.
Mas o que mais me exaspera é que do tempo das estratégias de exclusões definitivas ou com alguma estabilidade temporária, entramos na era das estratégias reactivas. O pior de tudo é que de muitas dessas reações não sabemos contra o quê. Já me perguntei uma vez porque é que se mudam governadores de Luanda, quase de um em um ano, sem sabermos as razões e ficamos espantados, que em algumas alturas, as moscas se esvoacem alegremente pelas nossas casas adentro ou não se possa programar nada contra as saídas de águas das chuvas nos bairros, o que parecia, por exemplo, estar a fazer o jovem governador falecido Luther Rescova, quando inopinadamente, e sem qualquer explicação, foi transferido para o Uíge. Antes, o mesmo acontecera com o governador Adriano Mendes de Carvalho, este despachado para Cuanza Norte, sem mais nem quê. Por falta de espaço, aliás porque já levei uma reacção por isso, não vou mais falar aqui do que se faz com a oposição. Também falaria aqui do que se faz com os jornalistas e jornais, programas radiofónicos e televisivos, de forma tão escancaradamente visível e notória que dá pena vermos as pessoas submetidas a tantos vexames.
Termino repetindo que é minha convicção que só encontrando uma solução global, estaremos a resolver o problema de Angola, que para além evitar vermos um ex-presidente que passou pacificamente o poder, a passar o que passa – e isso não dignifica o actual Presidente e seus acompanhantes – impedirá, sobretudo, que a vida dos angolanos continue assim, quase insustentável. E não é resolver só o problema interno do MPLA, para depois se partir desalmadamente contra os “demónios” da oposição, ganhar as eleições a todo custo e continuar tudo na mesma. Temos mesmo é que resolver o problema institucional global de Angola, que isso chega para todos.