Justiça portuguesa autoriza investigação a Daniel Proença de Carvalho por fraude fiscal e branqueamento de capitais. Advogado é visto como principal agente de José Eduardo dos Santos e da filha Isabel em vários negócios.
As autoridades portuguesas investigam o advogado Daniel Proença de Carvalho por suspeita de crimes de corrupção em dois processos, além de fraude e branqueamento de capitais. A ele estará ligado o banqueiro luso-angolano Carlos Silva.
Segundo o Ministério Público, o banqueiro terá agido a mando de Proença de Carvalho para corromper Orlando Figueira, magistrado condenado, em 2018, no âmbito da “Operação Fizz”, que envolvia o nome do antigo vice-presidente de Angola, Manuel Vicente.
Na opinião de Paulo de Morais, líder da Frente Cívica anticorrupção, “a investigação a Proença de Carvalho, ao banqueiro Carlos Silva e ao Banco Privado Atlântico irá, certamente, ficar esquecida na gaveta de um qualquer procurador português”.
“Todos os casos em que este banco esteve envolvido são graves, mas ficarão certamente impunes. Porque o advogado Daniel Proença de Carvalho dirige uma sociedade que se tem especializado em Portugal em defender os maiores corruptos. É influente a defender corruptos em Portugal, mas é certo que também noutras paragens”, opina.
Também no Luanda Leaks
O Banco Atlântico foi presidido por Manuel Vicente e Carlos Silva e administrado pela filha de Daniel Proença de Carvalho. “As suas práticas são bem conhecidas”, refere o ativista fundador da Transparência e Integridade – Associação Cívica (TIAC).
“Foi este o banco que canalizou centenas de milhares de euros para o procurador Orlando Figueira para que este arquivasse um processo em que Manuel Vicente seria acusado por branqueamento de capitais. O que veio efetivamente a acontecer”, concretiza em declarações à DW África.
O escritório de Proença de Carvalho sempre defendeu a empresária Isabel dos Santos e é um dos visados no escândalo “Luanda Leaks”. “Não será, pois, nem incomodado pela Procuradoria. O seu processo vai se arrastar por anos e sem quaisquer consequências”, Paulo de Morais admite:
A ex-eurodeputada portuguesa Ana Gomes sempre apontou o dedo ao leque de advogados que “conheciam bem os meandros do império de Isabel dos Santos”, durante o mandato do seu pai, José Eduardo dos Santos. Além de Proença de Carvalho – considerado o principal agente do ex-Presidente de Angola e da filha Isabel em vários negócios – a política portuguesa fala de outros colegas seus portugueses que estiveram envolvidos em esquemas a favor do que chama “cleptocracia” angolana.
“Outros trabalharam para os esquemas criminosos. Não me admira que estejam aí todos os nostálgicos do tempo em que ganhavam milhões à conta de Isabel dos Santos e, naturalmente, muito apreensivos com o que poderá ainda vir aí. Porque ainda há muita informação que não veio [a público]. O que temos aí é uma pontinha do iceberg”, disse.
“Cidadania russa”
A filha primogénita de Eduardo dos Santos, também sob a alçada da justiça portuguesa, é alvo de processos judiciais em Angola, através dos quais o Estado pretende recuperar o equivalente a 4,5 mil milhões de euros, alegadamente dinheiro do erário público usado ilegalmente pela empresária quando estava à frente da administração da petrolífera Sonangol.
Há cerca de uma semana, em entrevista à televisão privada portuguesa SIC, Sérgio Raimundo, outro dos advogados de Isabel dos Santos, garantiu que o Estado angolano nunca vai conseguir prender a empresária, porque esta tem cidadania russa. E que, neste caso, “ninguém na posse das suas faculdades mentais se vai meter na jaula do leão”. Já antes destas declarações, Ana Gomes lembra que tinha lançado o alerta:
“Bela lição”
A propósito dos crimes que teriam sido cometidos por Isabel dos Santos, investigada também em Portugal, Ana Gomes recorda as pistas que forneceu à Procuradoria-Geral da República sobre os negócios duvidosos da empresária e como foi conduzido o “Caso Manuel Vicente”.
“O procurador angolano veio a Lisboa constituir arguido vários portugueses capatazes de Isabel dos Santos e disse que os quer julgar lá [em Angola]. Isto é uma bela lição para Portugal, que já devia saber que não vale a pena ajoelhar-se. Se se ajoelha ninguém o respeita. E não servir o interesse português, do meu ponto de vista, não julgar aqui Manuel Vicente pelos crimes de que ele estava acusado aqui, que eram gravíssimos, designadamente a corrupção de um magistrado”, recorda.
Ana Gomes pensa que, se o Estado angolano alega que Isabel dos Santos deve mais de mil milhões de dólares a Angola, poderia pedir o congelamento de bens em Portugal que cheguem ao montante já identificado. “E as autoridades portuguesas só têm de cumprir. Além das autoridades judiciais, as autoridades políticas deviam pronunciar-se sobre isto claramente e não vejo isso”, opina.