Numa análise ao Acórdão do Tribunal Constitucional (TC) que anulou o congresso de 2019 da UNITA e, consequentemente, a eleição de Adalberto Costa Júnior para líder do principal partido da oposição em Angola, Rui Verde, habitual comentador de assuntos jurídicos do site Maka Angola, que entre outras coisas luta em defesa de um sistema judicial eficiente e imparcial para Angola, considera o acórdão n.º 700/21 “consistente” do “ponto de vista legal”.
“O Acórdão n.º 700/21 gerou desconforto e controvérsia na sociedade angolana e tal não pode ser escamoteado, contudo, do ponto de vista legal, o acórdão afigura-se consistente”, refere Rui Verde, numa análise enviada ao PÚBLICO. “Embora, obviamente, a decisão tenha vastas consequências políticas, a verdade é que do ponto de vista legal parece bastante sólida.”
Através do Despacho n.º 3/20 foram publicadas em Diário da República pelo TC as listas dos membros dos órgãos de direcção da UNITA e restantes documentos do Congresso. Não se deveria considerar isto uma validação prévia do congresso pelo TC que agora é revertida?
A resposta é negativa e explicada no Acórdão (p. 31 e ss). O TC encara esse acto como meramente notarial, uma espécie de anúncio, que ele não tinha que validar ou confirmar, apenas publicitar o depósito e registo. Na verdade, para o TC se pronunciar sobre a validade teria de ser interpelado judicialmente por alguma parte, Ministério Público ou membro da UNITA. Não tendo isso acontecido na altura, não lhe competia fazer qualquer verificação material antes da publicação, o que só faz neste acórdão.
O TC não foi além do pedido dos autores do processo ao declarar sem efeito o Congresso, quando estes apenas se referiam à eleição de Adalberto Costa Júnior?
Foi além do pedido dos autores, mas podia ir. Nos termos do artigo 286.º do Código Civil, as nulidades são de conhecimento oficioso do tribunal. Isto quer dizer que, em caso de nulidades, um tribunal pode ir além do pedido das partes e decidir de acordo com o que considera nulo.
Uma nulidade não tem de constar de uma lista da lei, e no caso concreto não existe tal previsão legal?
O TC considerou que o processo electivo que culminou no Congresso tinha violado uma lei material (Lei dos Partidos Políticos e Estatuto da UNITA). Uma violação de disposições legal de carácter imperativo constitui uma nulidade.
A nulidade não deveria ter sido já invocada? Não é tarde?
De acordo com o mesmo artigo do Código Civil (286.º), as nulidades são invocáveis a todo o tempo, portanto, não há prazo geral específico.