spot_imgspot_imgspot_imgspot_img

Eleições Gerais 2022: “A sociedade civil pode impugnar as eleições gerais em Angola”?

Ativistas angolanos ameaçaram impugnar as eleições gerais, alegando irregularidades. Mas coordenador do Observatório Eleitoral Angolano (OBEA), Luís Jimbo, explica que este é um processo complexo.

A campanha eleitoral começou há poucos dias, mas vários ativistas angolanos querem já impugnar as eleições gerais marcadas para 24 de agosto.

Os ativistas alegam várias irregularidades no processo. Contestam os “vícios da atual Lei Orgânica das Eleições, que anula o escrutínio municipal e a não fixação das atas síntese nas assembleias de voto”, citam a existência de falecidos nos cadernos eleitorais e apontam para o tratamento desigual dos partidos pelos órgãos de comunicação social públicos.

Em entrevista à DW África, o coordenador do Observatório Eleitoral Angolano e diretor-executivo do Instituto Angolano de Sistemas Eleitorais e Democracia, Luís Jimbo, explica que impugnar as eleições é um processo complexo – e só alguns órgãos têm poder para o fazer.

Jimbo aproveita, no entanto, para deixar um alerta: Muitos angolanos estão insatisfeitos com o processo eleitoral e a “linguagem de ataque e contra-ataque” dos principais líderes, João Lourenço e Adalberto Costa Júnior, nos debates, pode conduzir a agitação social.

DW África: A sociedade civil pode impugnar eleições?

Luís Jimbo (LJ): A impugnação tem que ser sobre uma questão em concreto. O processo tem várias questões que, de acordo a lei, não estão a ser rigorosamente observadas – por exemplo, o tratamento igualitário dos candidatos nos órgãos de comunicação social. Nesta altura da campanha, estamos também a assistir a uma guerra de destruição de cartazes, principalmente entre a UNITA [União Nacional para a Independência Total de Angola, o maior partido da oposição] e o MPLA [Movimento Popular de Libertação de Angola, no poder]. Estamos igualmente a assistir aos principais candidatos, João Lourenço e Alberto Costa Júnior, a responderem um ao outro nos discursos de campanha política, utilizando talvez uma linguagem que incita à violência.

De facto, há irregularidades no processo, mas é preciso analisar cada caso para depois demandar quem tem o direito [de de expor esses casos].

DW África: Mas esses casos que citou há pouco podem servir de mote para uma eventual impugnação?

LJ: Este é o grande desafio quando se fala de impugnação no nosso sistema eleitoral: Quem tem direito de impugnar? Porque só determinados órgãos – os candidatos, os partidos políticos – têm este direito de [pedir] a impugnação. Os cidadãos e as organizações não-governamentais precisam de fazer uma equação jurídica de forma a encontrar uma solução adequada para que possam interpor.

Por outro lado, há muitas constatações que violam a lei, mas quando chegam ao Tribunal Constitucional, nas vestes de Tribunal Eleitoral, não há apreciação dos casos devido aos problemas da lei que temos.

DW África: Perante esta situação, como é que eles podem fazer? Não bastará só denunciar nos meios de comunicação social – e sabendo também que o tribunal não deverá julgar o caso – qual é a solução para corrigir as irregularidades no processo já em curso?

LJ: Para o acesso à justiça eleitoral, o quadro legal angolano é um grande desafio, porque é preciso fazer muitas equações jurídicas: quem [pode agir], qual o tipo de processo, quais os prazos, a competência do órgão judicial, a intervenção da PGR, a intervenção do Tribunal Supremo, a intervenção do Tribunal Constitucional nas vestes de Tribunal Eleitoral, o tipo de matéria de litigação. Nós temos essa deficiência, e esse é que deve ser o debate.

DW África: A lei deve ser reformada também…

LJ: Sim, absolutamente. Isso tem sido um debate constante, a configuração do Tribunal Constitucional nas vestes de Tribunal Eleitoral.

DW África: Sendo assim, como podemos enquadrar a decisão do Governo Provincial de Luanda, que proibiu uma manifestação da oposição prevista para amanhã, para reclamar igualdade no processo eleitoral?

LJ: Esta é uma questão oportuna e concreta para analisar a aplicação da lei eleitoral. De acordo com a lei eleitoral, os candidatos dos partidos políticos têm a liberdade plena e absoluta de realizar manifestações, independentemente do seu caráter – quer sejam manifestações de apelo ao voto, manifestações de apoio aos candidatos, manifestações para repudiar um tratamento desigual.

Os candidatos não precisam de pedir autorização à administração pública, têm é de comunicar à administração pública o seu trajeto. Mesmo não comunicando, a lei dá-lhes a possibilidade de se auto-organizarem.

DW África: Mas havendo o risco de comprometerem a segurança da ordem pública?…

LJ: A lei assegura que, em campanha eleitoral, os próprios promotores – os candidatos – ao realizarem as suas atividades, têm que ter em consideração os direitos de terceiros, a não perturbação da ordem pública e a auto-segurança.

É por isso que, nesta altura, se assiste aos candidatos a fazerem as suas marchas políticas com uma estrutura de protocolo, de segurança. Inclusive, é permitida a contratação de empresas especializadas nesta área. Mas é preciso também que os candidatos prejudicados apresentem e peçam ao Tribunal Constitucional que tome uma decisão sobre essa questão.

DW África: Devido a essa situação, na sua opinião, há o risco de haver alguma agitação social durante esta campanha eleitoral, já nos próximos tempos?

LJ: Sim, há um risco de convulsão, de agitação. E esse risco está a aumentar. Se compararmos os últimos discursos de João Lourenço e de Adalberto Costa Júnior, percebemos que os líderes estão a responder um ao outro na primeira pessoa, ao invés animar o eleitorado com as suas promessas e falar do país.

Estes líderes estão a utilizar uma linguagem de ataque e contra-ataque, e é com este cenário que os outros grupos sociais e políticos começam a fazer este tipo de demonstração, por via de manifestação.

Com a ausência de julgamentos, até com a falta de pronunciamento da Comissão Nacional Eleitoral sobre a violação destes direitos consagrados, com os indicadores de ocupação permanente de espaços públicos controlados para fazer campanha e a destruição de materiais de propaganda, principalmente entre a UNITA e MPLA, além da agitação dos líderes que estão a galvanizar muitos jovens que os seguem, tudo isso pode vir a ser prejudicial para a juventude que está animada em participar, podendo transformar-se facilmente em violência.

 

 

spot_imgspot_imgspot_imgspot_img
spot_imgspot_imgspot_imgspot_img

Destaque

Artigos relacionados