Dezenas de jornalistas angolanos marcharam hoje, em Luanda, “exigindo o fim” de intimidações, agressões e mortes dos profissionais no exercício da atividade, considerando a situação como “grave e assustadora”, e exortaram as autoridades a protegerem a vida dos jornalistas.
“Não à manipulação ao jornalismo”, “ser jornalista não é crime”, “liberdade de pensamento” e “jornalismo livre, cidadão bem informado” eram algumas frases inscritas nos cartazes que os manifestantes empunhavam durante a marcha.
Trajados de preto, com o lema da marcha “Quem Tem Medo da Liberdade” estampada na parte frontal nas camisolas e “artigo 44º da CRA” (Constituição da República de Angola), que estabelece a liberdade de imprensa, os jornalistas repudiaram todos os “ataques” à liberdade de imprensa.
“Abaixo a censura, abaixo aos assaltos e mortes, somos jornalistas e não criminosos” eram as palavras de ordem desta marcha, que contou também com membros da sociedade civil, entre ativistas e associações e sindicais, e deputados da oposição.
A marcha, promovida pelo Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA), partiu do largo do Soweto, bairro Vila Alice, distrito urbano do Rangel, percorreu parte da Avenida Ho Chi Minh, parte da avenida Deolinda Rodrigues, passou pela rua Senado da Câmara e terminou no Largo da Liberdade, sob proteção da polícia.
Teixeira Cândido, secretário-geral do SJA, disse, na leitura do manifesto da marcha, que os jornalistas decidiram sair hoje à rua por se “sentirem ameaçados no exercício da sua atividade, em menos de um ano três jornalistas viram as suas residências assaltadas e os respetivos computadores roubados”.
“(A sede do SJA) foi assaltada por três vezes em menos de um mês, última das quais na madrugada desta sexta-feira e de lá roubaram o principal computador, a sede provincial do sindicato na Lunda Norte foi igualmente assaltada e roubaram também um computador”, recordou.
Em todas as essas ocasiões, sublinhou, “não se conhece o autor (dos assaltos)” e o SJA “não tem quaisquer dúvidas de que se trata de um ataque à liberdade de imprensa”, que qualifica como “grave e assustador para um Estado que se quer democrático”.
“Não há memória igual na história do jornalismo angolano e é uma ameaça à liberdade e à integridade física dos jornalistas”, afirmou Teixeira Cândido, nesta marcha que juntou jornalistas de órgãos públicos e privados e profissionais da antiga e nova geração.
A liberdade de imprensa “é um pressuposto da existência do jornalismo e dos jornalistas, sem liberdade não existe jornalismo, pode existir propaganda, ou relações-públicas, mas não há jornalismo, o jornalismo só existe num contexto de liberdade e independência”, realçou.
O líder sindical recordou, na sua intervenção, que o órgão que dirige tem dialogado permanentemente com as instituições do Estado, inclusive apresentando sugestões legislativas, porque “idealizamos uma democracia a altura dos melhores exemplos”.
“Não nos identificamos como um grupo de pressão, cientes de que a nossa função é exigir, mas também sugerir, é essa a nossa identidade, hoje e amanhã, por isso investirmos no medo não nos fará recuar um palmo”, assegurou.
Teixeira Cândido acrescentou: “Pode fazer recuar um, dois, três jornalistas, ou mesmo uma redação, jamais, porém, todos, ainda que o preço dessa luta possa significar pagar com a própria vida, a luta pela liberdade não vai parar”.
O jornalista Romão de Jesus, da rádio MFM, contou, na ocasião, que se sente atualmente “desprotegido” após receber ameaças ao telefone, há três semanas enquanto trabalhava, e na sequência ter sido assalto com arma branca, por cidadãos “estranhos”.
Carlos Rosado de Carvalho, conhecido jornalista e economista angolano, também participou da manifestação, desejando que o Governo angolano e as autoridades que “regulam ou desregulam” a comunicação social “percebam a mensagem”.
“No sentido do cumprimento da Constituição e da lei, como está claro no artigo 44 da CRA, que consagra a liberdade de expressão e de imprensa, mas o que nós temos assistido é exatamente o contrário”, disse em declarações à Lusa.
O veterano jornalista angolano William Tonet lamentou o encerramento de vários órgãos de comunicação em Angola, que levou jornalistas no desemprego, e a “tanta falta de liberdade e de contraditório e, inclusive, colegas que se propõem a combater outros colegas”, observou.
Ismael Mateus, jornalista e conselheiro do Presidente angolano, João Lourenço, enalteceu, no fim da marcha, a iniciativa do SJA, sobretudo pelo sinal de contestação que passou para a sociedade devido à intimidação de jornalistas.
“E nós estamos a dizer a quem está a fazer isso (ameaças e assaltos) que nós não aceitamos e não nos vergamos”, referiu.