O ativista angolano Luaty Beirão recebeu esta quarta-feira ordem de detenção pela polícia quando transmitida em direto a caminhada para uma das manifestações em Luanda, no dia em que se assinalam os 45 anos da independência do país.
Nos segundos finais do vídeo que estava a ser transmitido em direto pelo Facebook, dois polícias aproximam-se do ativista, que tem também nacionalidade portuguesa, e, depois de Luaty dizer que não vale a pena tirarem o telefone porque está a ser transmitido pela internet, pedem-lhe para os acompanhar à esquadra, ao que o ativista pergunta se está a ser detido e um dos polícias responde: “Está detido”.
Nos segundos a seguir, o ativista vira-se para trás, tentando falar aos que o acompanhavam, mas a transmissão é interrompida, ouvindo-se a voz de Luaty a dizer que o polícia está a tirar-lhe a câmara. O vídeo, que dura menos de 15 minutos, retrata a viagem que o ativista, juntamente com outros presumíveis manifestantes, estava a fazer até à manifestação, e durante a caminhada Luaty Beirão vai interagindo com os companheiros e com quem lhe recomenda que não se manifeste.
“Não faça isso? Ó senhora, deixe as pessoas reclamarem, queremos que os filhos cresçam num país melhor, neste país a culpa é da vítima, sempre”, respondeu o ativista, que inicia o vídeo relatando um suposto roubo de uma câmara GoPro por parte das forças policiais.
Mostrando uma atenção frequente ao distanciamento social, pedindo várias vezes aos companheiros para se afastarem, Luaty lembrou que o Presidente angolano, “João Lourenço, inaugurou um hotel, mas aí já não é ajuntamento, só há ajuntamentos é na rua”.
Numa caminhada em que várias vezes apareceram polícias por perto, mas sem interagirem, Luaty vai conversando com a câmara e criticando a atuação policial em Luanda.
“O país não tem dono, as ruas não têm dono, a gente quis acreditar que havia alguns espaços a serem dados, e há alguns espaços a serem dados, não pode é haver aceitação que esses espaços sejam retirados, esses recuos é que não podem ser tolerados, porque se recuas um passo, eles vão querer que recues 10, e depois quando te meterem o pé na garganta, podes-te queixar que ‘I can’t breathe’, o resultado é George Floyd”, disse, numa referência ao afro-americano que morreu nos Estados Unidos quando foi violentamente detido pela polícia na rua.
“O que já se conquistou não se retira, senhor Presidente, senhor Procurador-Geral da República, senhor comandante, Angola não é vossa, não é minha nem das pessoas que aqui estão comigo, é de todos”, acrescentou.
Durante a caminhada, várias pessoas juntam-se a Luaty e durante um dos diálogos, um dos participantes na marcha relata que a polícia usou balas reais para dispersar os manifestantes e garante que houve um jovem que morreu, algo que Luaty diz que “é preciso confirmar urgentemente”.
Angola assinala esta qarta-feira 45 anos da independência do país, sendo um dia de feriado nacional, em que estava prevista a realização de uma manifestação, organizada por um grupo de jovens ativistas, para exigir melhores condições de vida e a marcação de uma data para as primeiras eleições autárquicas.
O Governo da Província de Luanda proibiu a realização desta manifestação, evocando diversos motivos, um dos quais o não cumprimento do Decreto Presidencial sobre o estado de calamidade pública, que impede ajuntamentos de mais de cinco pessoas nas ruas, como medida de prevenção e combate à propagação da Covid-19. A polícia impediu a tentativa de manifestação, tendo recorrido ao uso de força e de gás lacrimogéneo para dispersar os manifestantes, havendo o relato de feridos e algumas detenções.