A Presidente do Tribunal Constitucional, Laurinda Cardoso, disse, ontem, que a instituição “deve, na sua função primária, autolimitar-se às decisões jurisdicionais e negar a justiçabilidade das questões políticas de modo a evitar que, através do controlo constitucional, se faça política”.
Ao discursar na cerimónia de apresentação da revista científica “A Guardiã”, propriedade da instituição jurisdicional, Laurinda Cardoso justificou as declarações, com base no princípio da autolimitação judicial, tendo assinalado que o facto não descura a responsabilidade social do Tribunal Constitucional (TC).
Na presença do ministro de Estado e chefe da Casa Civil do Presidente da República, Adão de Almeida, Laurinda Cardoso acentuou que o TC tem se afirmado cada vez mais como um Tribunal de Direitos Fundamentais, não pretendendo ser um mero actor passivo, fechado sobre o “castelo” e aguardando pelos conflitos sociais para ser chamado a dar resposta aos mesmos.
O Tribunal Constitucional, sem violar o papel de árbitro e em estrito cumprimento do princípio da separação de poderes, deve ser cada vez mais um activo, no que diz respeito à responsabilidade social de difusor dos valores e fundamentos da Constituição. Laurinda Cardoso considerou a Constituição uma gramática que contém linguagem e códigos linguísticos próprios e, para isso, a facilitação do diálogo entre o Tribunal Constitucional e a sociedade passa, também, por partilhar as regras da comunicação, através de obras no âmbito da investigação científica e não apenas de acórdãos.
A “Quanto maior for a cultura jurídica dos cidadãos, mais exigentes estes se tornam, e quanto mais exigentes se tornam, os Tribunais tornam-se cada vez mais funcionais”, realçou a presidente do Tribunal Constitucional.
Defendeu que a Administração da Justiça, em matéria jurídico-constitucional, nos termos da Constituição e da Lei, não se corporiza, apenas, na prática de actos de natureza judicial, isto é, de acórdãos, proferidos no quadro da apreciação dos processos submetidos ao Tribunal Constitucional.
Nos Estados modernos, prosseguiu, as jurisdições constitucionais devem cumprir o objecto e missão institucionais, no que diz respeito à tutela dos direitos, liberdades e garantias fundamentais, não apenas no âmbito do exercício da função judicial, mas de outras a ela conexas, visando o reforço do Estado Democrático e de Direito, bem como da realização efectiva dos valores basilares das Constituições.
“Não se pretende, com isso, cimentar a teoria do activismo judiciário. Isto é, a intervenção excessiva do Poder Judicial em matérias que, nos termos da Constituição, são da exclusiva responsabilidade do Poder Executivo, o que, na prática, se traduziria numa violação do princípio da separação de poderes e interdependência de funções”, explicou.
Literacia Constitucional
A Juiza Laurinda Cardoso considerou imperativa a elevação da literacia constitucional, para facilitar a compreensão da jurisprudência constitucional: “O Tribunal conhece o Direito, mas tem o dever institucional de levar este direito aos destinatários das suas decisões. Isto é, a sociedade em geral”.
“Todos os dias é dia de aprender; de reaprender e de reforçar os valores da simplicidade e da humildade intelectual. Sim, humildade intelectual, pois reconhecemos que a grandeza e experiência dos autores que escreveram para esta primeira edição os coloca no patamar de publicações de elevado nível científico e consagrado”, reavaliou.
Na obra científica, sublinhou Laurinda Cardoso, é possível constatar a elevação didáctica e cuidado pedagógico dos diversos autores, o que permite alargar “A Guardiã” ao público estudantil, ao mesmo tempo que atende as necessidades de profissionais de outras áreas que buscam compreender melhor os conceitos do mundo jurídico.
As diferenças e as divisões existentes no TC baseiam-se na discussão de ideias e dos processos no plenário. Fora disso, o TC é verdadeiramente uma família, sublinhou Rui Ferreira, antes de concluir com a “firme convicção de que este Tribunal, tal como colectivo de magistrados que tem quadros e colaboradores, está no bom caminho e em boas mãos”.
“A Guardiã” foi escrita pelo juiz conselheiro Armindo Jelembi, Benja Satula, Carlos Feijó, Carlos Teixeira, Emmanuela Vunge, Evandra Martins, Leandro Ferreira, Lúcia Ribeiro, Luzia Sebastião, Márcia Nigiolela, Mário Monte, Mauro Alexandre, Onofre dos Santos e Raul Araújo.