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Abel Chivukuvuku: “Portugal pode ser o advogado dos angolanos e não do Governo do MPLA”

O político da oposição angolana diz que os partidos políticos portugueses, com excepção do Bloco de Esquerda, foram “coniventes” em aceitar que Portugal se transformasse “na lavandaria” da “roubalheira” em Angola. Chegou a altura de Portugal usar a sua voz na Europa para “exigir que Angola tenha eleições justas”.
Em anteriores actos eleitorais a oposição em Angola denunciou a existência de fraude. Tem receio de que em 2022 se repita?

Durante décadas, particularmente a Europa, foi conivente, para não dizer instigadora, dos dramas de África, particularmente das questões eleitorais. É sabido que são empresas espanholas, a Indra e a Sinfic, que têm organizado as eleições em Angola, com deficiências de justeza, transparência e rigor. A própria justiça espanhola já intentou acções judiciais contra essas empresas. Também temos conhecimento que o Governo angolano já solicitou de novo a intervenção da Indra e da Sinfic, sem que o Governo espanhol se pronuncie, nem aja. O Parlamento Europeu está esquecido, nem quer saber. É um drama que a Europa não só cauciona, mas em certa medida instiga. Com Portugal, nós somos irmãos, temos história comum, língua comum, mas é preciso não esquecer que são as elites políticas portuguesas que durante muito tempo caucionaram o Governo em Angola. Portugal era chamado a lavandaria da roubalheira em Angola. E participaram juntos, todos juntos. E hoje estamos a ver que os dinheiros estão a ser presos aqui, tudo isso foi permitido e caucionado e até talvez encorajado. Grande parte das empresas portuguesas só vê Angola como mercado – mandar o chouriço, mandar os vinhos –, não olha para Angola como pessoas, seres humanos, seus irmãos, para os quais devem atenção e consideração. Em Portugal, tirando o Bloco de Esquerda, todos os partidos são coniventes nessa acção. Esse é o grande drama. Seria bom se percebessem que com um governo sério em Angola, com ambiente de negócios positivo, com sociedade que evolui e cresce socialmente, também as empresas portuguesas ganham, porque o mercado é maior, a capacidade de compra é maior, etc. Portugal só tem a ganhar não partilhando das trafulhices e encorajando, ajudando para que haja normalidade. Mas enfeuda-se com a elite do MPLA, aliena-se da maioria dos angolanos e o resultado é negativo.

Acha que Portugal deveria exercer pressão sobre o Governo angolano no sentido de garantir que o processo eleitoral seja realmente livre e justo?

Portugal pode ser o advogado dos angolanos e não do governo do MPLA. Transmitindo mensagens positivas para a Europa, no sentido desta exigir que Angola tenha eleições justas, sérias, que haja governação patriótica. Portugal até pode falar com os americanos, que também têm sido coniventes com algumas das trafulhices em Angola. Em termos de comunidade internacional, há percepção que Portugal, pelos 500 anos de interacção, conhece melhor Angola e os angolanos e a palavra de Portugal tem autoridade. Não precisa de fazê-lo de uma forma antagonista, mas pode falar a verdade, passar a mensagem positiva para a evolução. E Portugal deixa de ser a lavandaria que foi no passado e pára de caucionar os erros de governação do MPLA.

Acha que deveria haver observadores internacionais nas eleições do próximo ano?

Obviamente. Tem havido em todo o lado. Nas eleições de 2017, não houve porque Angola deliberadamente atrasou a autorização para a União Europeia. Só estiveram os observadores da SADC que não fazem nada. Embora, do meu ponto de vista, a justeza das eleições não se define no dia das eleições, tem a ver com o ambiente político nacional ao longo de dois, três anos, para haver competitividade igual para todos os actores. Se uns passam na televisão e outros não passam, não há competitividade. Depois, está a legislação, neste momento a legislação que está a ser discutida no Parlamento visa suprimir a contagem e o apuramento de votos aos níveis municipal e provincial e passar a ser tudo nacional. Isto significa que tecnicamente estão a legalizar e formalizar o que já faziam. E em terceiro, as instituições, nós não temos instituições independentes.

Quando diz que estão a legalizar aquilo que já faziam, o que quer dizer com isso?

Quero dizer que nas eleições de 2008, de 2012, de 2017, antes de contar-se os votos nas províncias, os resultados já saíam em Luanda. E em 2017, não sei se por distracção se por hábito, antes das províncias terem terminado a contagem, publicaram os resultados de 2012 como se fossem de 2017. Neste momento o que estão a fazer? A lei anterior estabelecia que tem de haver apuramento municipal, depois provincial e depois nacional. Agora estão a suprimir o apuramento municipal e provincial, para haver só apuramento nacional. Que é o que já faziam.

 

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