O parlamento guineense aprovou uma resolução na qual os deputados dão como “nulo e sem efeito” o acordo entre os Presidentes da Guiné-Bissau e o Senegal.
O Presidente da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, afirmou esta segunda-feira que o parlamento não tem competência para anular o acordo assinado com o Senegal no âmbito da Agência de Gestão e de Cooperação.
“Isso é teatro. O parlamento não tem essa competência, nem no regimento, nem na Constituição da República para já. Há mecanismos como as coisas andam. Não estamos a falar de um acordo de petróleo, mas sim da Agência de Gestão e de Cooperação com o Senegal”, afirmou o chefe de Estado quando questionado sobre o chumbo do acordo no parlamento.
O parlamento guineense aprovou, na terça-feira, uma resolução na qual os deputados deram como “nulo e sem efeito” este acordo entre os Presidentes da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, e do Senegal, Macky Sall, depois de o documento ter sido entregue pelo primeiro-ministro, Nuno Nabiam, aos deputados.
“Quando assinei esse acordo com o Presidente do Senegal entreguei o documento à ministra dos Negócios Estrangeiros que por sua vez entregou ao primeiro-ministro que tinha de o levar para o Conselho de Ministros onde o Governo toma as decisões. O primeiro-ministro não é o Governo, que é um todo”, afirmou aos jornalistas.
Segundo o chefe de Estado, após a discussão no Conselho de Ministros “o documento vai para o gabinete do ministro da Presidência do Conselho de Ministros que o manda para o Presidente ou para o parlamento para a ratificação”.
“A Assembleia Nacional Popular não tem competências para fazer o que fez“, disse Umaro Sissoco Embaló, que falava aos jornalistas na cerimónia de inauguração de uma fábrica de farinha, em Bissau.
No seu artigo 85.º, na alínea h), a Constituição da República refere que cabe ao parlamento “aprovar os tratados que envolvam a participação da Guiné-Bissau em organizações internacionais, os tratados de amizade, de paz, de defesa, de retificação de fronteiras e ainda quaisquer outros que o Governo entenda submeter-lhe”.
A Constituição refere também na alínea f) do seu artigo 100.º que no “exercício das suas funções compete ao Governo negociar e concluir acordos e convenções internacionais”.
Em relação às competências do Presidente nesta matéria, a Constituição da Guiné-Bissau refere na alínea e) do artigo 68.º que cabe ao chefe de Estado ratificar os tratados internacionais.
Nas declarações aos jornalistas, o Presidente guineense voltou a insistir que o que foi assinado com o seu homólogo senegalês “em nenhuma circunstância” se trata de “um acordo de petróleo”.
“Não temos petróleo. É verdade que há aqui uma má-fé que terá as suas consequências. Por inerência da Constituição da República eu sou uma instituição. Todos os outros são chefes de instituições, mas não são instituições“, afirmou.
O chefe de Estado referiu ainda que é preciso renunciar à “cultura do ódio”, salientando que a única forma de chegar ao poder na Guiné-Bissau é através do voto popular e manifestou a convicção de que nunca mais haverá um golpe de Estado na Guiné-Bissau.
“Isto é um Estado, não podemos banalizar o Estado. Tem de haver diálogo entre as pessoas, disse”, afirmando em seguida: “Eu não dou satisfações a ninguém só ao povo da Guiné-Bissau. Eu é que promulgo, veto, dissolvo, exonero, nomeio e dou a posse. É da Constituição da República, não da minha autoria”.
O Acordo de Gestão e Cooperação entre a Guiné-Bissau e o Senegal foi assinado em outubro de 1993 e incluiu a criação de uma zona de exploração conjunta de recursos, que comporta cerca de 25 mil quilómetros quadrados da plataforma continental.
A Guiné-Bissau dispensou 46% do seu território marítimo para constituir a ZEC e o Senegal 54%.
A zona é considerada rica em recursos haliêuticos, cuja exploração determina 50 por cento para cada um dos Estados, e ainda hidrocarbonetos (petróleo e gás), ficando os senegaleses com 85% de hidrocarbonetos e os guineenses com 15%.
A chamada “chave da partilha dos recursos da plataforma continental” ficou acordada na sequência de litígios judiciais em tribunais internacionais para os quais os dois países recorreram em decorrência de disputas fronteiriças herdadas do colonialismo.
O ex-Presidente guineense José Mário Vaz, por não concordar com aquele acordo de partilha, sobretudo na área dos hidrocarbonetos, denunciou formalmente o entendimento, em 29 de dezembro de 2014, propondo ao Senegal a reabertura de negociações para fixação de novas bases de partilha.
Desde aquela altura, Bissau e Dacar têm vindo a negociar a obtenção de um novo acordo.