Imigrantes congoleses em Angola estão divididos quanto à reeleição de Félix Tshisekedi como Presidente da República Democrática do Congo, com uns a considerarem que foi reconduzido por “vontade popular”, enquanto outros o acusam de “incapacidade” para governar.
Perto de cinco milhões de congoleses da República Democrática do Congo (RDCongo) vivem em Angola, segundo estimativas dos líderes da comunidade, maioritariamente dedicados ao comércio a retalho de produtos diversos, sobretudo no mercado informal.
Grande parte da comunidade congolesa em Angola reside há décadas no distrito urbano do Palanca, município do Kilamba Kiaxi, em Luanda, e aí mesmo procuram o seu ganha-pão, que vai desde a venda de refeições diversas e bebidas em bares na berma das estradas, bem como de roupa usada, material elétrico, de construção e outros.
A situação sociopolítica da RDCongo é, por isso, vivida intensamente no Palanca, onde congoleses residentes realizam diariamente, ao princípio da noite, um debate de rua para analisar a realidade do país, que reelegeu Félix Tshisekedi para o segundo mandato.
“Acompanhei bem as eleições na RDCongo, desde o início até ao momento, e de maneira que vi as coisas correram e estão a correr bem”, disse à Lusa o médico Nzuzi Mabela, originário do Baixo Congo e que vive em Angola há 25 anos.
Para este congolês, que fez a formação superior em Angola e é atualmente proprietário de um centro de saúde no Palanca, a reeleição de Tshisekedi decorreu em clima de “transparência e liberdade”.
Nzuzi Mabela entende que o Presidente voltou a colocar o país na arena internacional, contrariamente aos governos anteriores, e que a nível interno há “mudanças assinaláveis”, como a construção de infraestruturas em benefício do povo, minimizando as críticas da oposição.
O médico disse ainda que, quando pode, visita o seu país, mas jamais pensou regressar definitivamente à RDCongo.
“Porque grande parte da minha vida fiz aqui, os meus filhos [estão aqui], mas viver lá não acredito”, disse.
Félix Tshisekedi foi reconduzido no cargo de Presidente da RDCongo para um segundo mandato de cinco anos, na sequência das últimas eleições presidenciais, legislativas e municipais no país africano, em 20 de dezembro, com intensas críticas da oposição sobre alegada fraude.
João Pedro dos Santos, congolês da província do Kasai Central, negou as acusações de fraude e corrupção nas eleições e afirmou que Tshisekedi foi reeleito por devolver o amor à pátria, pela proximidade e diálogo para solucionar as reclamações do povo.
Este líder comunitário de 60 anos, 32 dos quais vividos em Angola, refere que a RDCongo era “dirigida por ditadores” e, apesar de não pensar em regressar ao país, acredita que neste segundo mandato o Presidente “deve conseguir organizar bem o país” e combater a pobreza.
“Em qualquer sítio do mundo há pobreza, mas não é do ‘pé para a mão’ que iria mudar de uma vez a situação, porque ele encontrou uma grande pobreza, mas hoje em dia ele está a lutar, sobretudo para fazer estradas”, frisou.
Mudança de regime era o que desejava o comerciante Tuzolana Mvungudi, 46 anos, que lamenta a degradação social e económica da RDCongo e acusa o Presidente reeleito de ser “incumpridor” quanto às promessas de melhorias do país e de “incapacidade de governar”.
“A vida no Congo de momento está muito difícil, antigamente na época do Presidente Kabila era mais ou menos, agora o Presidente no poder piorou de novo as coisas e todo o povo do Congo está a chorar”, disse à Lusa.
Tuzolana, natural do Congo Central e em Angola há 14 anos, considerou que Moise Katumbi, um dos concorrentes da oposição, seria a pessoa ideal para dirigir o país e referiu que Tshisekedi venceu com resultados fraudulentos.
É à porta de casa, numa das ruas mais movimentadas do Palanca, que este cidadão congolês vende produtos diversos, batalhando pelo seu ganha-pão, que também partilha com os familiares na RDCongo, país vizinho para onde não pensa regressar.
“Para mim, de momento, não [penso em regressar], porque a situação aí está a piorar sempre, então se conseguir pão aqui é melhor, para enviar lá, mas para ir viver, de momento não”, disse.
José Félix Wuandja, 42 anos, é secretário-geral da comunidade da RDCongo em Angola e aplaudiu a vitória eleitoral de Tshisekedi, referindo que este trabalhou, levando o povo a renovar a confiança em si.
Em Angola desde 2006, o cidadão do Kasai Oriental desvaloriza as críticas da oposição sobre alegada fraude eleitoral: “Essas reclamações são só para distrair a opinião pública”, disse.
Acredita ainda que o Presidente, neste novo mandato de mais cinco anos, deve acudir às reclamações dos congoleses, no domínio da saúde, infraestruturas rodoviárias e outras.
“O problema é que a RDCongo não é um país para melhorar todas as condições de uma única vez, porque passaram-se muitos anos de complicações, desde o regime de Mobutu, são anos que o povo ficou a sofrer muito tempo (…). Temos confiança de que, em mais cinco anos, ele pode mudar pelo menos 60% ou 70% daquilo que o povo reclama”, rematou.
Wuandja disse ainda que os cidadãos da RDCongo estão espalhados pelas 18 províncias angolanas e que a direção da organização comunitária prepara um recenseamento também para ajudar as autoridades angolanas no controlo da mobilidade dos imigrantes.