Em Angola, deputados são acusados de ter largas mordomias quando no país a população vive na extrema pobreza. O Parlamento continua em silêncio quanto à polémica do bónus natalício e os deputados não querem falar.
Os grupos parlamentares consideram falso o valor do referido prémio. Contudo, está tudo publicado no Diário da República, depois de ter sido aprovado pelos deputados numa sessão sem cobertura da imprensa.
A revelação feita pelo semanário angolano Novo Jornal não surpreende o ativista Nuno Dala, pois acredita que o bônus de “contorno pornográfico” é real, a avaliar o silêncio da direção da Assembleia Nacional.
Nuno Dala defende a suspensão do prémio de natal, de 4 milhões de Kwanzas (o equivalente a cerca de 5 mil euros), a ser atribuído aos deputados, por ser um insulto a maior parte de angolanos que não poderão festejar o natal devido à dificuldades financeiras.
“Quem tem competência para isso que desfaça. É um insulto aos milhões de angolanos que em 2020 entraram numa situação pior que a do ano passado. Muito dos quais, não sabem o que vão comer logo ou amanhã”, defendeu o ativista.
Deputados estão no Parlamento para se servir?
O também investigador disse que ao aceitarem o alegado prémio a imagem dos deputados ficaria manchada:
“O deputado não está ali numa perspetiva de trabalhar como se fosse emprego. É um servidor público. Tudo aquilo que concorre para uma espécie de enriquecimento ou vida de luxo, é contra o nosso consenso, segundo o qual eles estão aí para servirem e não para se servirem, como também não é bom para o contesto que estamos a viver. Um contesto marcado para muito desemprego”.
A DW contactou a secretaria-geral da Assembleia Nacional, mas esta não reagiu. Nos últimos dias, depois do desmentido de alguns deputados nas redes sociais, os grupos parlamentares dos dois principais partidos angolanos, MPLA e UNITA, desvalorizaram o fato. Contudo, nenhum deles revelou o valor real do bônus de natal.
O chefe da bancada do MPLA, Américo Cuononoca, considerou falsa a informação e entende que houve má interpretação da Resolução 43/20 de 3 de dezembro” que “circulam nas redes sociais”.
Segundo o dirigente dos camaradas, em nenhum momento a resolução da Assembleia Nacional “faz referência ao aumento de valores que os textos apontam e os deputados já recebem um subsídio de Natal que não estava previsto na Resolução de 2017”.
UNITA promete repartir salário com caranciados
Por seu turno, a UNITA, que por um lado espera pela explicação da Assembleia Nacional, diz em nota de imprensa enviada à DW África que existe “uma intenção velada de exposição da Assembleia Nacional e dos deputados, para desviar o debate de questões essenciais como o combate à corrupção, a fome e as autarquias”.
O grupo de deputado liderado por Liberty Chiyaka garante que, tal como fez no período de estado de emergência no âmbito da Covid-19, vai voltar repartir o salário com as famílias carenciadas.
Mas para o jovem Kidi Manuel, que esteve na manifestação contra o desemprego em Luanda, os deputados muitas des vezes defendem apenas os seus interesses.
“Esses deputados não defendem nada. Eles defendem apenas os seus interesses. Os deputados são na realidade marionete. Sabemos que os deputados é que têm que resolver os problemas do povo mas infelizmente, não fazem nada. Essa prenda de natal serve para fazer lavagem cerebral aos deputados”.
Entretanto, para o político Teka Ntu, coordenador da comissão instaladora do Ação pelo Reforço da Democratização em Angola (ARDA), partido que aguarda pela legalização, os deputados deviam recusar tal oferta, tendo em conta o momento crítico que o país atravessa.
“Os deputados deviam estar mais solidários com o povo. Por isso, aconselho os deputados a analisarem esta situação. Não é bom momento para os deputados receberem este valor e deixarem a sua população morrer de fome”, sublinhou Teka Ntu.