Cidadãos portadores de deficiência queixam-se de dificuldades e discriminação na procura de emprego na província de Cabinda. A Associação dos Deficientes condena o silêncio do Governo angolano.
Dificuldades no acesso a instituições de ensino e na busca de emprego, falta de rampas e conteúdos para pessoas com deficiências auditivas e visuais são apenas alguns dos obstáculos apontados por cidadãos ouvidos pela DW África em Cabinda.
A isto soma-se a discriminação, explica Estevão Maria Levante, portador de deficiência física de 58 anos: “Várias vezes somos discriminados a partir da escola, na função pública, quando vamos à procura de um emprego e nunca somos aceites”.
“Apontam-nos o dedo com um olhar de desdém, mas nós estamos cientes que ser deficiente não é uma profissão, não é um castigo nem tão pouco um prémio do Senhor. Somos afilhados do Governo, mas este, por sua vez, só nós presta atenção por intermédio de papéis. Fui fazer um pedido para que me dessem materiais de costura, mas nunca foi aceite”, lamenta Levante.
Sonhos adiados
Também Georgina da Graça Malonda, de 19 anos, viu o seu sonho adiado e sofre diariamente com a discriminação. É portadora de duas deficiências – física e visual. “Não estou a estudar devido a doença. As pessoas costumam gemer, falar-me mal e riem-se de mim também. Eu fazia sempre negócios nas bancadas e vendia cerveja”, recorda.
Encontrar emprego também está a ser difícil para António Augusto Miguel Paulo, deficiente visual há 30 anos. Dedicado ao ensino da Língua Portuguesa, doutorado em Ciências da Educação, diz que foi injustiçado pelo Instituto Superior de Ciências da Educação. Candidatou-se a uma vaga para professor auxiliar na instituição, mas foi reprovado.
“Não fiquei satisfeito com os resultados e de imediato recorri à direção da instituição, mas nem fui tido nem achado. Recorri para a presidência do júri vinculada à Universidade 11 de Novembro para que interpusesse um recurso à ministra. A ministra atendeu prontamente, tendo remetido o mesmo processo aos recursos humanos, em 2020, mas de lá para cá o documento deixou de andar”, conta.
António Paulo fala em discriminação por causa da sua deficiência, mas lembra que foi capaz de superar as adversidades: “A visão e audição é a porta da entrada de 90% de tudo quanto temos na memória, e tendo esses órgãos deficientes, compromete automaticamente a aprendizagem e o desenvolvimento da pessoa, mas eu quebrei as algemas todas psicológicas”, sublinha.
Críticas ao silêncio do Governo
Na província de Cabinda há pelo menos sete associações distintas que representam os cidadãos portadores de deficiência, estimados em 6.870. Abel Fuca, presidente da Associação dos Deficientes em Cabinda, está preocupado com o silêncio do Governo face às dificuldades que os portadores de deficiência enfrentam.
“Preocupa-nos a situação de acesso ao Bilhete de Identidade (BI). Essa é a identidade como elemento da sociedade civil, com direito a ser auscultado, opinar, eleger e sermos eleitos, para ter acesso ao emprego e habitação”, afirma.
Um projeto governamental de reinserção social de famílias carenciadas em Cabinda previa a entrega de habitações condignas para mais de 30 famílias com deficiência, que antes viviam num armazém. No entanto, foram só disponibilizadas 11 casas. Em cada casa – pensada para cinco pessoas – vivem até três famílias.
Apesar das queixas, numa recente intervenção no Centro Cultural Chiloango, num encontro com as associações, o administrador adjunto para o Setor Político-Social, Manuel Guilherme, negou a existência de exclusão: “Em tempos de inclusão social, não devemos excluir o ser humano, com alguma deficiência. Sada um tem a sua peculiaridade”.
Até ao fecho desta reportagem, a DW África tentou o contacto com a Secretaria Provincial da Assistência e Reinserção Social, mas não foi bem sucedido. A Secretaria alegou que precisava de autorização prévia das autoridades superiores para prestar qualquer declaração.