Críticas referem-se à forma como a imprensa estatal angolana tem noticiado os últimos acontecimentos políticos, incluindo incidentes em Cafunfo. Órgãos são acusados de manipular factos e servir aos interesses do MPLA.
Na sexta-feira (19.02), foram entregues as primeiras carteiras profissionais de jornalista na história de Angola. Ao todo, a Comissão da Carteira e Ética (CEE) de Angola procedeu à entrega de mais de 30 carteiras. Os veteranos na profissão foram os primeiros beneficiários.
Para o jornalista Salgueiro Vicente, abre-se um novo capítulo no país, com mais respeito pela ética profissional e menos promiscuidade no jornalismo.
“Depois da aquisição das carteiras, os jornalistas terão de separar o trigo do joio. O trigo é o exercício do jornalismo como tal, sem ferir a ética. O joio é o comportamento que não dignifica a classe, em que um indivíduo assessora uma instituição, e, volta e meia, leva o mesmo material para o órgão de comunicação em que trabalha. Há aqui uma promiscuidade muito grande,” avalia.
Cobertura dos incidentes em Cafunfo
A entrega das primeiras carteiras profissionais de jornalista em Angola acontece numa altura em que a imprensa pública tem estado debaixo de críticas pela forma como reportou sobre os acontecimentos na vila de Cafunfo, na província da Lunda Norte, a 30 de janeiro.
A oposição angolana queixa-se, por exemplo, que só a versão do partido no poder, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), sobre as mortes em Cafunfo mereceu destaque. O facto de uma delegação de deputados da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) ter sido impedida de entrar na vila para investigar o que aconteceu também passou ao lado.
Em suma, o comportamento dos órgãos públicos é uma vergonha, refere o porta-voz da UNITA, Marchal Dachala, que diz que a imprensa pública foi transformada em “veículos de propaganda enganosa do partido no poder, direcionando-a contra os seus potenciais concorrentes, numa flagrante violação da Constituição, das leis aplicáveis e da ética republicana.”
As críticas são direcionadas aos tradicionais meios de comunicação social estatais, como a Televisão Pública de Angola (TPA), mas também aos recentemente tutelados pelo Estado – como o jornal O País ou a emissora privada TV Zimbo.
Pluralidade necessária
Para William Tonet, diretor do jornal Folha 8, há um recuo nos ganhos conquistados pela imprensa pública. O jornalista lamenta que os órgãos de comunicação social continuem a ser “cúmplices dos atos negativos que ocorrem em Angola”.
“Tivemos a sua participação em 27 de maio de 1977. Tivemos a sua participação de omissão e instigação na sexta-feira sangrenta. Agora, no Monte Sumi, em Cafunfo, na morte do médico Sílvio Dala e do jovem Inocêncio Matos. Portanto, é um conjunto de mal servir,” considera.
E isso ainda é mais perigoso em vésperas de eleições gerais em Angola, marcadas para o próximo ano, defendem os críticos. Muitos angolanos não acreditam que haverá pluralidade na informação por parte dos órgãos estatais. Um deles é o ativista João dos Santos Mwanangola. Ainda assim, ele tem esperança.
“Estamos num ano pré-eleitoral. Aqui, o papel da imprensa será muito importante para a difusão da informação, principalmente lá naquelas áreas do país onde há ausência da imprensa,” conclui.