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Angola/Cafunfo: Rei Muatchissengue Wa Tembo pede que os “diamantes brilhem para todos”

O rei Muatchissengue Wa Tembo, autoridade máxima tradicional das Lundas, apelou hoje para que a riqueza dos diamantes desta região do leste de Angola “brilhem para todos”, criticando a ausência de esforços das empresas em prol das comunidades.

“Estamos aqui para garantir que os diamantes também brilhem para nós”, disse Wa Tembo, durante as jornadas sobre cidadania e segurança que decorrem hoje e quarta-feira em Cafunfo, vila mineira da Lunda Norte, onde em 30 de janeiro várias pessoas morreram em incidentes com a polícia.

O rei, que apelou a que esta riqueza seja construída também através do diálogo, acentuou o orgulho de “ser angolano”, mas questionou os benefícios dos diamantes para as populações.

“Um destes dias encontraram um diamante de mais de cem quilates na mina do Lulo [no complexo mineiro do Lucapa, conhecido pelos seus diamantes raros e de alta qualidade]. Qual é o benefício que estas descobertas trazem para a população? Uma população que vive na miséria e da miséria”, questionou.

Muatchissengue Wa Tembo falava perante a plateia reunida no salão 04 de abril para discutir soluções para a violência, que contou com a presença da sociedade civil, autoridades locais e eclesiásticas, sobas e regedores, responsáveis da polícia e defensores dos direitos humanos.

Na conclusão do rei das Lundas, a indústria dos diamantes não tem resultado em benefícios, mas sim na destruição das lavras, desvio de rios, destruição e punição permanentes.

“O lucro é deles, o sofrimento é nosso”, vincou.

Contudo, disse não ser favorável a “uma mudança à bruta”, mas através do diálogo “para que a riqueza esteja acessível a toda a população”, apelando a um novo modelo para o desenvolvimento local assente na educação e na auscultação das comunidades locais.

Wa Tembo apelou, por isso, à criação de um conselho de desenvolvimento sustentável para as Lundas com participação das autoridades do Estado e tradicionais, bem como empresas ligadas aos diamantes.

Apresentou ainda várias propostas, incluindo a reabilitação e construção de estradas, a angolanização de quadros nas companhias mineiras “onde os trabalhadores estão submetidos a pessoas estranhas” à cultura local, e que as empresas mineiras concretizem as suas promessas de responsabilidade social.

“Neste momento, no Cuango [onde opera a Sociedade Mineira do Cuango], não existe nada em prol das comunidades”, lamentou.

Representantes da Endiama e da Fundação Brilhante, o braço social da diamantífera estatal angolana estiveram também presentes no encontro, afirmando o seu empenho na responsabilidade social e no desenvolvimento local.

No entanto, apesar do anúncio de um acordo de cooperação entre a Sociedade Mineira do Cuango (SMC) e a Fundação Brilhante para um programa de desenvolvimento sustentável das zonas mineiras, bem como a reafirmação da promessa de transferir a sede da Fundação Brilhante de Luanda para o Dundo, na Lunda Norte, “para ficar mais próxima da população e seus problemas”, não conseguiram convencer os presentes.

Pelo contrário, além de alguns apupos aos intervenientes, a sociedade civil e autoridades locais mostraram a sua insatisfação com o incumprimento de promessas.

O regedor de Ngonga Ngola acusou a SMC de não se entender com os sobas e estragar as lagoas que abastecem a população, queixando-se de que os acordos estipulados com as autoridades tradicionais não estão a ser cumpridos.

“Queremos que o Governo resolva os nossos problemas sem cair nas mentiras da empresa da mina Cuango, que não conseguiu cumprir com as suas promessas. Caso continue com a sua arrogância, nós, como povo, vamos agir à nossa maneira porque esgotou a nossa paciência”, avisou.

Um jovem lamentou que a SMC interdite a passagem na “estrada dos generais”, que atravessa a concessão mineira e não ofereça alternativas à população.

“Para onde é que vai a área social da mina Cuango?”, questionou, recebendo respostas negativas por parte da plateia que assistia ao debate.

As jornadas sobre Cidadania e Segurança Pública, organizadas pela Ufolo – Centro de Estudos para a Boa Governação, em parceria com o Comando Geral da Província Nacional, prosseguem na quarta-feira com um painel onde serão ouvidos depoimentos de líderes religiosos locais, participantes e testemunhas da ocorrência e familiares das vítimas.

Em 30 de janeiro, segundo a polícia angolana, cerca de 300 pessoas ligadas ao Movimento do Protetorado Português Lunda Tchokwe (MPPLT), que há anos defende a autonomia daquela região, tentaram invadir uma esquadra policial, obrigando as forças de ordem a defender-se, provocando seis mortes.

A versão policial é contrariada pelos dirigentes do MPPLT, partidos políticos na oposição e sociedade civil local, que falam em mais de 20 mortos e alegam que se tratou de uma tentativa de manifestação, previamente comunicada às autoridades, e que os manifestantes estavam desarmados.

O MPPLT luta pela autonomia da região das Lundas, no Leste-Norte de Angola.

A autonomia da região das Lundas (Lunda Norte e Lunda Sul, no leste angolano), rica em diamantes, é reivindicada por este movimento que se baseia num Acordo de Protetorado celebrado entre nativos Lunda-Tchokwe e Portugal nos anos 1885 e 1894, que daria ao território um estatuto internacionalmente reconhecido.

Portugal teria ignorado a condição do reino quando negociou a independência de Angola entre 1974/1975 apenas com os movimentos de libertação, segundo o movimento.

 

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