Os advogados do empresário Carlos São Vicente, preso por suspeitas de peculato, tráfico de influências e branqueamento de capitais, lamentaram hoje terem sabido pela imprensa da abertura da fase judicial do processo e criticaram a “paródia de justiça” angolana.
“Foi através da imprensa que soubemos que o empresário Carlos São Vicente foi trazido ao Tribunal da Comarca de Luanda para a abertura da fase judicial do seu processo na quarta-feira, 10 de março de 2021. Carlos São Vicente não tem acesso ao processo e, mais uma vez, os direitos da defesa são violados de forma inaceitável”, denunciaram os advogados da sociedade Zimeray & Finelle.
Numa nota enviada à Lusa, os advogados consideraram que o empresário luso-angolano está a ser “vítima de um julgamento político” e que a presunção de inocência está a ser violada, já que o Ministério Público angolano “nega-lhe uma defesa eficaz, essencial para um julgamento justo”.
“Advogados de Carlos São Vicente souberam de abertura da fase judicial do processo pela imprensa”
“Denunciamos veementemente esta paródia de justiça, a qual mascara uma tentativa de espoliação do património de Carlos São Vicente, num contexto de caos social”, acusaram.
O empresário foi detido em 22 de setembro e ficou em prisão preventiva, por suspeita de crimes de peculato e branqueamento de capitais, entre outros.
Em 10 de março, os advogados do economista luso-angolano apresentaram uma queixa junto de um organismo do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos exigindo a sua libertação imediata.
Os advogados François Zimeray e Jessica Finelle alertaram, no documento, para as múltiplas violações das regras de julgamento justo e as condições de detenção “contrárias a qualquer ideia de justiça e dignidade”.
O despacho que determinou a prisão preventiva de Carlos São Vicente refere que este levou a cabo “um esquema ilegal” que lesou a petrolífera estatal Sonangol em mais de 900 milhões de dólares (763,6 milhões de euros).
De acordo com o despacho, o empresário angolano, que entre 2000 e 2016 desempenhou, em simultâneo, as funções de diretor de gestão de riscos da Sonangol e de presidente do conselho de administração da companhia AAA Seguros, sociedade em que a petrolífera angolana era inicialmente única acionista, terá levado a cabo naquele período “um esquema de apropriação ilegal de participações sociais” da seguradora e de “rendimento e lucros produzidos pelo sistema” de seguros e resseguros no setor petrolífero em Angola, graças ao monopólio da companhia.
Desta forma, Carlos São Vicente passou a ser o “detentor maioritário das participações nas AAA Seguros, com 89,89%, em detrimento da Sonangol, que viu as suas participações sociais drasticamente reduzidas em 10%, num prejuízo estimado em mais de USD 900.000.000,00 [763,6 milhões de euros ao câmbio atual]”, não tendo a petrolífera “recebido qualquer benefício”, em contrapartida, lê-se no documento.
Segundo o despacho, o arguido terá referido que as cedências de participação foram feitas “com base num acordo informal” entre ele, enquanto representante da AAA Seguros, e o então presidente do conselho de administração da Sonangol, e mais tarde vice-presidente de Angola, Manuel Vicente.
O AAA, liderado por Carlos São Vicente, é um dos maiores grupos empresariais angolanos, operando na área de seguros e da hotelaria.
Carlos São Vicente está também a ser investigado na Suíça por suspeita de branqueamento de capitais.