A defesa do empresário luso-angolano Carlos de São Vicente, detido em Luanda desde 22 de setembro de 2020, apelou hoje à sua “libertação imediata”, por excesso de prisão preventiva.
Em comunicado, datado de Genebra e Paris, a que a agência Lusa teve acesso, a defesa de Carlos São Vicente – acusado pela justiça angolana de vários crimes, entre os quais de fraude fiscal continuada durante cinco anos, com valores superiores a mil milhões de euros – apela ainda ao respeito pelos direitos fundamentais do seu constituinte por parte da justiça angolana.
Os advogados chamam também a atenção “para as práticas inadmissíveis e ilegais das autoridades angolanas, já denunciadas junto do Grupo de Trabalho da ONU sobre a Detenção Arbitrária e da Comissão Africana dos Direitos do Homem e das Populações”.
No comunicado, a defesa refere que Carlos de São Vicente está em prisão preventiva há mais de um ano, sendo “vítima de violações graves e repetidas dos seus direitos mais fundamentais, cometidas pelas autoridades judiciais angolanas”.
De acordo com a defesa, desde há vários meses a esta parte o empresário luso-angolano “é vítima de diversas violações da presunção de inocência, do direito a um processo justo ou ainda do direito a uma defesa efetiva”.
“A isto juntam-se condições de detenção contrárias a qualquer ideia de dignidade, que colocam a sua vida concretamente em perigo”, denunciam ainda os advogados, reiterando que a prisão preventiva de Carlos de São Vicente é “ilegal e arbitrária desde o início do processo, por ser utilizada como um meio de pressão movido por considerações políticas”, alertando que a mesma “chegou hoje ao fim”.
“Com efeito, o direito angolano prevê que uma prisão preventiva não pode exceder os 12 meses sem condenação em primeira instância, podendo este período ser excecionalmente alargado até aos 14 meses caso estejamos perante um processo particularmente complexo”, sublinham.
Caso as autoridades angolanas tenham efetivamente alargado a detenção até aos 14 meses, realça a defesa no comunicado, no caso do seu constituinte, este período terminou a 22 de novembro de 2021, “sem que tenha havido qualquer condenação em primeira instância e sem que qualquer outro prolongamento da detenção lhe tenha sido validamente notificado”.
Os advogados argumentam ainda que, em conformidade com o direito processual angolano, o empresário luso-angolano deveria, por conseguinte, “ter sido imediatamente libertado a 23 de novembro de 2021”.
“Ora, as autoridades angolanas recusam proceder à sua libertação e persistem em mantê-lo detido, numa flagrante violação do direito. Não se dignaram, inclusivamente, responder aos pedidos de libertação urgentes que lhes foram endereçados pela equipa de defesa”, queixa-se ainda a defesa.
Para os seus advogados, “ninguém está acima da lei, nem o senhor de São Vicente mais do que qualquer outra pessoa, mas cada pessoa deve esperar que um Estado respeite as suas próprias leis e a dignidade humana”.
“O senhor de São Vicente, que sempre afirmou a sua inocência e colaborou com as autoridades de processo penal, pede que seja tratado pelas autoridades angolanas como qualquer outro cidadão”, salienta o comunicado.
“Os advogados do senhor de São Vicente esperam que a justiça angolana tenha a coragem de constatar a ilegalidade destas práticas e de reconhecer a sua inocência durante o processo que irá decorrer nas próximas semanas em Luanda”, frisa a defesa.
Além do crime de fraude fiscal, o empresário é ainda acusado de peculato e de crime de branqueamento de capitais de forma continuada.
De acordo com a acusação, o empresário, que durante quase duas décadas teve o monopólio dos seguros e resseguros da petrolífera estatal angolana Sonangol, terá montado um esquema triangular, com empresas em Angola, Londres e Bermudas, que gerou perdas para o tesouro angolano, em termos fiscais, num montante acima dos 1,2 mil milhões de dólares (mais de mil milhões de euros).
As autoridades judiciais angolanas ordenaram a apreensão de bens e contas bancárias pertencentes ao empresário Carlos de São Vicente, tendo a Procuradoria-Geral da República de Angola pedido também o congelamento de contas bancárias e apreensão de bens de Irene Neto, filha do primeiro presidente angolano, Agostinho Neto, e mulher do empresário.