Deputados da oposição queriam investigar os acontecimentos de sábado, descritos como um “massacre”. Mas as forças de segurança impediram-nos de passar, alegando ordens superiores. Deputados dizem estar sem acesso a água.
Em declarações à DW África, Joaquim Nafoia, do grupo parlamentar da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), disse que ele e outros quatro deputados do partido foram retidos no meio de uma mata, sem direito a água e alimentação, estando impedidos de entrar em Cafunfo.
No sábado (30.01), a região foi palco de incidentes classificados pelas autoridades como um ato de rebelião. A polícia disse que cerca de 300 pessoas ligadas ao Movimento do Protetorado Português Lunda Tchokwe (MPPLT) tentaram invadir uma esquadra policial, tendo atingido mortalmente seis pessoas. No entanto, esta versão é contestada por vários setores da sociedade, que falam num “massacre” de mais de uma dezena de angolanos.
O ministro do Interior, Eugénio Laborinho, criticou esta quarta-feira (03.02) os deputados da oposição que já se dirigiram à região, alegadamente para “tentar escamotear a situação e criar uma situação fora do normal”. Contudo, em entrevista à DW África, o parlamentar Joaquim Nafoia considera que não está a fazer mais do que o seu trabalho, sendo a sua detenção uma “violação grosseira” da Constituição. “O Governo está com medo”, afirma.
DW África: Confirma que estão proibidos de entrar em Cafunfo?
Joaquim Nafoia (JN): Estamos proibidos de entrar em Cafunfo e estamos detidos, sem direito a água para beber e alimentação. Eu sou daqui, a minha irmã trouxe-me alimentação, mas foi escorraçada pela polícia que está aqui para nos controlar.
DW África: Onde se encontra neste momento?
JN: Estamos a quatro quilómetros de Cafunfo. Recebemos ordens expressas. Se andarmos um metro, vamos dormir na cela, segundo eles. Disseram que temos de voltar. Mas não estamos em condições de regressar, porque estamos muito cansados. Andámos durante toda a noite de ontem, a estrada não está boa, pedimos inclusive que nos deixassem pelo menos dormir num hotel ou numa hospedaria, e regressaríamos amanhã. Mas eles disseram que não, que têm ordens expressas de Luanda para não darmos um único passo.
DW África: Qual é a justificação dada?
JN: Eles dizem que são ordens superiores e que o grupo parlamentar da UNITA não pode fazer nada. E não é verdade a informação que eles agora querem forjar de que nós não temos testes de Covid. É falso, todos os deputados que cá estão fizeram testes. São mesmo ordens superiores, dizem que não podemos entrar. É uma clara violação à Constituição, uma violação grosseira, que nem sequer temos como qualificar. É uma idiotice – um deputado, que sai para vir trabalhar com o povo, é barrrado sem nenhuma justificação? O que se está a esconder?
DW África: Mas diz-se que era preciso uma autorização formal da Assembleia…
JN: O regimento não diz isso. O deputado não precisa de ser autorizado por ninguém. Quem deve autorizar o deputado é o povo, que nos elegeu. Querem aproveitar alguma ignorância que paira ali para mentir às pessoas. Não, a Assembleia Nacional tem as suas formas de trabalho. Nós viemos em missão de serviço do grupo parlamentar, logo não precisamos da autorização de ninguém. Mas nós tivemos cautela – o grupo parlamentar escreveu ao gabinete do presidente da Assembleia Nacional. Mas, mesmo que não o tivesse feito, não há razões para barrar a circulação de um deputado. Porque não estamos em estado de emergência, e muito menos em estado de sítio. É uma estupidez. Nós fomos interpelados no meio da mata por forças fortemente armadas. Não pode ser. Nós viemos aqui para constatar in loco o que aconteceu no dia 30 de janeiro. Algumas pessoas dizem que houve um massacre e o grupo parlamentar da UNITA quer constatar o que aconteceu, mas o Governo não deixa. Porquê? Porque tem medo. Nós queremos falar com o povo, queremos falar com as vítimas, e temos esse direito. É mesmo uma violação.