O presidente do Movimento do Protetorado Português da Lunda Tchokwe, José Mateus Zecamutchima, foi detido esta terça-feira em Luanda. Em entrevista à DW, o advogado Salvador Freire considera que a detenção é ilegal.
José Mateus Zecamutchima, líder do movimento responsável pela manifestação de 30 de janeiro, em Cafunfo, província angolana da Lunda Norte, e que terminou de forma violenta, é acusado dos crimes de rebelião e associação de malfeitores.
O dirigente do Movimento do Protetorado Português Lunda Tchokwe (MPPLT), que luta pela autonomia da região das Lundas, ficou detido no Serviço de Investigação Criminal (SIC) de Luanda, anunciou o seu advogado, Salvador Freire.
DW: África: O mandado de detenção apanhou Zecamutchima de surpresa?
Salvador Freire (SF): Sim, nós recebemos um telefonema do Serviço de Investigação Criminal (SIC) de Luanda em que pediam a presença do Zecamutchima para alguns esclarecimentos, segundo eles. Nós não concordámos com a posição do SIC e pedimos para que formalizassem. A princípio não queriam passar a notificação. Já no SIC, na presença do instrutor, começámos a verificar uma movimentação e um aparato. De repente foi-nos mostrado um mandado de detenção passado pelo Serviço de Investigação Criminal de Lunda Norte.
DW África: O que refere a acusação?
SF: Que ele é acusado de suspeitas de envolvimento na prática dos crimes de rebelião e associação de malfeitores. Nós achamos a detenção ilegal. Utilizaram a nossa presença para deter o Zecamutchima. Zecamutchima não esteve presente nessa suposta manifestação, que também nem se realizou. Não compreendemos quais os critérios que eles encontraram.
DW África: O mandado de detenção provém da Lunda Norte. Receia que a qualquer momento Zecamutchima possa ser transferido para a província?
SF: Há essa indicação. O instrutor do processo disse-nos claramente que Zecamutchima será transferido para a província da Lunda Norte, onde está a decorrer o processo. Isso preocupa-nos. O Zecamutchima nunca saiu de Luanda, nunca esteve em nenhuma manifestação realizada na província, quer da Lunda Norte quer da Lunda Sul. Ele, de facto, é dirigente, é o presidente do Protetorado Português da Lunda Tchokwe, mas nunca esteve presente em qualquer manifestação.
DW África: O que está então a dizer é que, apesar da manifestação de 30 de janeiro ter sido organizada pelo Movimento do Protetorado, o líder nada teve a ver com os incidentes? Não esteve sequer presente?
SF: Efetivamente. Zeca tem falado com os seus correligionários por telefone e mais, em todas as manifestações que foram realizadas eles sempre comunicaram às autoridades a realização das manifestações. Não estamos a compreender como é que “rebeldes” [a designação usada pelas autoridades angolanas para descrever os manifestantes em Cafunfo] comunicam às autoridades que nós no dia tal, às “X” horas, vamos realizar uma rebelião. É um paradoxo.
DW África: Logo a seguir aos incidentes em Cafunfo alegou-se que Zecamutchima estaria foragido. Antes deste mandado de detenção, alguma vez foi notificado para prestar declarações ou apresentar-se às autoridades?
SF: Nunca foi contactado quer pela Polícia Nacional, quer pelo Serviço de Investigação Criminal, quer pela Procuradoria-Geral da República. Ele nunca esteve foragido, esteve sempre em Luanda.
DW África: Uma vez que diz que não percebe a acusação, acredita que os argumentos baseados nos últimos acontecimentos são apenas um pretexto para um “ajuste de contas” com Zecamutchima?
SF: Temos a certeza que esse ardil foi feito em função do que aconteceu na Lunda Norte. Não há outro argumento que nos possa convencer a nós, os advogados, ou à sociedade de que essa forma maquiavélica é apenas para deter o nosso constituinte. É para abafar o Movimento Protetorado, porque o Governo já declarou publicamente que não quer o diálogo, mas achamos que o diálogo seria fundamental para diminuir todos esses conflitos.
O processo não é um processo jurídico. Temos aqui uma questão política. Há muita ilegalidade, não houve uma investigação apurada e isenta das acusações que foram feitas. Vai ser difícil e temos a certeza que as nossas instituições, infelizmente, ainda agem de forma errónea.