Escola no município de Viana recebeu carteiras escolares menos de uma semana depois dos alunos protestarem. Mas o professor que organizou o protesto está suspenso. “É um absurdo”, diz o sindicato dos professores à DW África.
As autoridades angolanas colocaram novas carteiras na escola 5108, no município de Viana, em Luanda, menos de uma semana depois do protesto de 300 alunos organizado pelo professor Diavava Bernardo.
O professor, que chegou a ser detido, foi, entretanto, suspenso e responde por um processo disciplinar. Para o Sindicato Nacional dos Professores (SINPROF), a suspensão é “ilegal e absurda”.
Em entrevista à DW África, Admar Jinguma, secretário-geral do SINPROF, afirma que o professor Bernardo merece todo o respeito e apoio, porque está a lutar por uma “causa nobre” e as suas ações já tiveram resultados positivos.
DW África: Qual a posição do SINPROF sobre a suspensão do professor Diavava Bernardo?
Admar Jinguma (AJ): É caricato. Pessoas próximas das autoridades atiram-se contra o professor e suspenderam-no. Ao mesmo tempo, as carteiras que faltavam na escola já chegaram à escola 5108, no município de Viana.
DW África: Ou seja, depois da manifestação, as autoridades responderam às exigências do professor e colocaram carteiras nas escolas…
Admar Jinguma (AJ): Nem sequer podemos falar de uma exigência do professor. É uma exigência dos alunos! Até porque o professor passa a maior parte do tempo em que está a dar aulas em pé. Quem precisa de se sentar são os alunos!
Mas a escola, de facto, já recebeu as carteiras. E são carteiras novas! Pergunto: onde andavam aquelas carteiras? Elas não foram compradas agora. Onde estavam aquelas carteiras que pertenciam àquela escola e a outras escolas de Luanda? Ainda bem que estamos a falar de um exemplo em Luanda, porque isto levanta a questão de como estará a situação noutras zonas do país. O certo é que há inúmeras escolas no país que estão a precisar de carteiras. Então, afirmo: É necessário um professor mobilizar 300 alunos para marcharem em direção à Administração Municipal de Viana para exigir carteiras. As carteiras deveriam estar lá, na escola, desde o início do ano letivo ou desde o momento em que a escola foi construída.
Portanto, estamos do lado do nosso colega, estamos a apoiá-lo. A sua suspensão é absurda!
DW África: A suspensão é por um período indeterminado? Ele não pode dar mais aulas?
Admar Jinguma (AJ): Não há razões para que o professor seja banido. Afinal, o professor não cometeu crime nenhum. Nós estamos a acompanhar de perto esta situação, para que o professor possa continuar a desenvolver o seu trabalho de forma normal. Essa suspensão é uma suspensão absurda. Não é uma suspensão decidida pela direção da escola. O professor, quando regressou à sua escola, foi recebido em apoteose, inclusive pelos seus alunos, que estão ao lado do seu professor. Há quem tente minimizar isso, pelo facto de serem crianças…
DW África: De quem é a suspensão, se não é da direção da escola?
Admar Jinguma (AJ): O que o professor nos disse é que ele foi chamado primeiro pelo subdiretor pedagógico e, depois, pelo próprio diretor da sua escola. Estes disseram-lhe que ele não podia regressar à sala de aulas sem antes responder à Inspeção de Educação nr. 5 de Viana. Isso não faz sentido. O professor está, neste momento, a responder a um processo disciplinar. Como é que se pode impor um processo disciplinar sobre alguém que está a lutar por uma causa nobre, que até beneficiou a escola, e quando a própria direção da escola está contente com o resultado dessa luta?
DW África: Há, no entanto, quem acuse o professor de usar as crianças para protestarem nas ruas de Angola, sem para isso ter obtido a autorização dos encarregados de educação…
Admar Jinguma (AJ): Nós temos um Estado que se diz de Direito democrático. Mas, na prática, as pessoas não têm esses direitos na cabeça, se calhar porque as escolas não ensinaram as pessoas a pensar pela própria cabeça. Uma das funções da escola é ensinar às crianças que elas têm direitos e que esses direitos devem ser usados, e que, sempre que as leis não estejam a ser cumpridas, as pessoas devem usar os mecanismos que a própria lei estabelece, para reivindicar. É o que aquelas crianças fizeram. Não há crime nenhum!
DW África: Mas não havia necessidade de pedir autorização aos pais?
Admar Jinguma (AJ): Eu não vejo essa necessidade. Quem são os principais beneficiários da ação de protesto? São as próprias crianças. As cadeiras chegaram à escola, porque as crianças fizeram ouvir a sua voz. As pessoas aqui neste país têm tanto medo do poder, que uma simples manifestação já é considerada uma ameaça ao poder. Eu não estou a ver que tipo de perigo aquelas crianças podem constituir para um sistema tão poderoso como o angolano, um sistema que demonstrou esse mesmo poder recentemente, aquando da tomada de posse do Presidente João Lourenço.