Angolanos entendem que é preciso que se aposte na governação de proximidade para que os políticos entendam melhor os problemas da população. O passeio do Presidente português pelas ruas de Luanda fez acender o debate.
A reação dos angolanos surge na sequência do recente passeio feito pelo Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, pelas ruas da capital angolana onde foi acompanhado por uma multidão de gente, na semana passada.
Foi a segunda vez que o Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa foi acompanhado por uma multidão nas ruas de Luanda. Também foi assim em 2019, quando “Ti Celito”, como é tratado em Angola, deslocou-se a Benguela.
O passeio descontraído, à margem da Cimeira da Comunidade dos Países de Língua Portugusa (CPLP), e uma foto tirada num quiosque enquanto Marcelo Rebelo de Sousa engraxava os seus sapatos geraram um debate sobre governação de proximidade no país.
“Acho que desconfiam do povo”
José Sulusaia, residente em Luanda, entende que o banho de multidão dado ao Presidente português é resultado da falta de proximidade entre governantes e governados.
“Eu com 51 nunca estive a nem um metro do Presidente da República [de Angola]. O que muitas vezes me admira é ver o Presidente de Portugal estar no meio do povo. Porque os nossos (não ficam), ninguém sabe”, conta.
Mas José Sulusaia desconfia que a má governação possa estar por detrás do receio que os administradores municipais, governadores provinciais, Presidente e outros titulares de cargos públicos em Angola sentem.
“Por detrás disso, acho que desconfiam do povo. Os seus a fazeres fazem com que não se sintam livres”, opina Sulusaia.
“Sobretudo sentir na carne aquilo que o povo está a passar”
Alberto João é outro residente da capital angolana. É vendedor ambulante nas ruas de Luanda. Com o seu pequeno negócio nas mãos diz que já viu de perto o antigo Presidente José Eduardo dos Santos, que governou Angola por quase 40 anos. Ainda assim, entende que não há governação de proximidade no país.
“Tinha que estar mais próximo para resolver o problema do cidadão ou do povo”, defende.
José Sulusaia, concorda e é de opinião que devem, “sobretudo, sentir na carne aquilo que o povo está a passar” e acrecenta: “Creio eu que governação de proximidade é exatamente isso. Sentir com a comunidade o que é que o povo precisa, acho que devia ser assim”.
Mas não é assim em Angola e as consequências são cada vez mais visíveis no seio da população, conclui José Sulusaia.
“Cada vez mais os que têm vão tendo mais e os pobres vão se tornando cada vez mais pobres. Eu não sei até quando isso vai continuar assim”, lamenta.
“Governo finge demência face aos problemas da comunidade”
Para Fernando Sacuaiela, do movimento Jovens Pelas Autarquias, há muito que os problemas da população são conhecidos.
“O Governo finge demência face aos problemas da comunidade. Nós temos mais de 40 anos de independência, de 1975 até ao presente momento. Afinal quais são os problemas que o Governo conseguiu diagnosticar?”
O coordenador do projeto Agir – uma iniciativa que trabalha com as comunidades – afirma que a governação centralizada em Luanda não vai resolver os problemas das populações e volta a defender autarquias.
“Sem as autarquias locais, o Estado está incompleto. É necessário que se perceba de que os problemas das comunidades não são resolvidos pelo Governo. Eles são resolvidas pela participação dos cidadãos e essa participação faz-se através das autarquias locais.”