Manda-me a honestidade intelectual começar este editorial com a definição de “paz”, obedecendo ao dicionário. A origem etimológica é “pax”, do latim, que é definida, geralmente, como um estado de calma ou tranquilidade, uma ausência de perturbações e agitação.
Ela, assim sendo, é desejada por cada pessoa para si mesma e, eventualmente, para os outros, ao ponto de se ter tornado uma frequente saudação (que a paz esteja contigo) e um objectivo de vida.
Por outro lado, para algumas pessoas significa garantia de moradia, comida, roupa, educação, saúde, amor, compreensão, ou seja, uma vida com qualidade. Infelizmente, porém, a maioria do povo angolano não a tem.
Em Angola, 18 anos depois do alcance da paz, com o MPLA ao leme, só se faz sentir, lamentavelmente, o calar das armas e a livre circulação, mas com buracos que recebem o nome de estrada. O bem-estar da população ainda é uma miragem.
Como prova, se é que se impõe, o Relatório de Pobreza Para Angola 2020, lançado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), aponta que o índice de pobreza em Angola atinge 41% dos cidadãos, o que significa que 41 em cada 100 angolanos têm um nível de consumo abaixo da linha da pobreza (12.181 Kz/ mês).
O informe indica ainda que 56% do total da população pobre reside nas áreas rurais, 44% na zona urbana, sendo que o índice da pobreza é de 10%, isto é, o défice médio do consumo por pessoa abaixo da linha da pobreza.
O referido relatório demonstra que, por província, destacam-se cinco com o índice de incidência inferior à média nacional, nomeadamente: Luanda, Lunda Norte, Cabinda, Cuando Cubango e Zaire.
O documento destaca ainda que a pobreza é maior nas províncias do Cuanza Sul, Lunda Sul, Huíla, Huambo, Uíge, Bié, Cunene e Moxico, onde mais da metade da população vive no limiar da pobreza e chega a comer farelo para enganar a fome.
Lançados estes elementos, dizemos que o banquete realizado pelo Presidente da República, João Lourenço, com alguns líderes políticos, em alusão ao dia da Paz, assinada no dia 4 de Abril de 2002, soa a insulto ao povo angolano, o povo que padece de tudo e mais alguma coisa.
É o mesmo povo que, seguramente, viu renovada a esperança, após o Memorando de Entendimento de Luena, rubricado a 30 de Março daquele ano, fruto de um acordo entre a UNITA e o Governo.
Enquanto o povo reclama por falta de comida, o PR reúne-se com um grupo de políticos abastardos para comemorar algo de que só eles beneficiam. Fizeram-no, como se não bastasse, com uma mesa farta do que mais falta faz à mesa da maioria do povo, isto é, pão e leite. É insulto.
Mesmo pensando num almoço de confraternização com figuras históricas da Luta de Libertação Nacional, de reconciliação entre os angolanos “e bla,bla,bla” não cola esta lógica, porque ao “coar “ Adalberto Costa Júnior, que é tão-somente o líder do partido com o qual se celebrou a Paz, o Presidente João Lourenço mostra claramente que é um rancoroso, não reina em si harmonia e espírito de pacificação.
Definitivamente, Lourenço fica, a cada dia, associado a um presidente que não pensa pela própria cabeça.
Talvez, e tendo em conta o rótulo de reformista, comecemos a pensar que é um homem rendido aos que chamou de marimbondos, de quem precisará para garantir um segundo mandato. São os sinais dos tempos, são indicadores, mas o mesmo tempo tratará de dar resposta a tudo.