O juiz Agostinho Santos, que se queixa de “irregularidades” no concurso curricular para provimento do cargo de presidente da CNE, em que foi derrotado, pediu hoje a intervenção do Presidente angolano no caso, alertando para “instabilidade pós-eleitoral”.
O juiz conselheiro do Tribunal Supremo (TS) angolano e jubilado pelo Tribunal Constitucional (TC) tem vindo a intentar várias ações judiciais junto das autoridades competentes desde 2020, na sequência do concurso para a Comissão Nacional Eleitoral (CNE) e queixa-se de “denegação da justiça”.
Hoje, em conferência de imprensa, o magistrado judicial pediu a restituição dos 47 pontos que lhe terão sido “ilegalmente retirados” pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ) angolano, nas vestes de entidade organizadora do concurso curricular.
O candidato Manuel Pereira da Silva “Manico” foi designado, em 2020, como vencedor deste concurso e é atualmente o presidente da CNE, um concurso que para Agostinho Santos esteve eivado de “vários vícios”.
O juiz conselheiro do TS e candidato ao concurso apelou à intervenção do Presidente angolano, João Lourenço, na qualidade de mais alto magistrado da nação, “para que se faça justiça, restituindo ao recorrente os 47 pontos que lhe foram ilegalmente retirados”.
“Apelamos igualmente ao Presidente da República que faça uso da influência da sua magistratura, enquanto guardião da Constituição e da lei, para que se cumpram com os princípios, normas e valores plasmados na Constituição da nossa República”, afirmou.
“Não permitindo que um órgão tão importante como a CNE seja dirigido por alguém que não tenha vencido o referido concurso curricular, no caso em apreço, o senhor Manuel Pereira da Silva”, frisou.
Agostinho Santos disse também acreditar na justiça angolana, descartou recurso a órgãos internacionais, e aguarda por um pronunciamento do CSMJ sobre os pontos que lhe foram subtraídos no âmbito do concurso.
Para o juiz recorrente, a julgar pelo histórico das eleições angolanas, desde 1992 a esta parte, “seria socialmente prudente e politicamente recomendável, porque defensável, que as eleições gerais previstas para agosto próximo, o primeiro a ser organizado na égide de João Lourenço, eleito em 2017, reúna os pressupostos de lisura, imparcialidade e transparência”.
“De modo a evitar que os seus resultados sirvam de fundamento de instabilidade social, política e, consequentemente, de isolamento internacional do Estado angolano”, salientou.
O concurso curricular para provimento do cargo de presidente da CNE, promovido pelo CSMJ, em 2019, foi homologado em 25 de janeiro de 2020.
O juiz Manuel Pereira da Silva foi empossado, pelo parlamento angolano, como presidente da CNE, em 19 de fevereiro de 2020, no meio de muitos protestos da oposição e da sociedade civil que o acusam de “falta de idoneidade moral e legal” para o cargo.
No entender de Agostinho Santos, estando Angola num processo de transição política visando a construção de um Estado democrático e de direito, “cuja alma se reflete nos processos eleitorais que devem ser realizados com transparência e verdade eleitoral”, Manuel Pereira da Silva, “presidente putativo da CNE, não deve continuar ilegítima e ilegalmente à frente dos destinos deste órgão”.
Porque, justificou, “além de não ter legalmente ganho o concurso curricular, também não preenche os critérios de probidade pública, idoneidade cívica e moral, previstos na lei competente, a julgar pela prática de atos ocorridos durante a sua passagem pela comissão provincial eleitoral de Luanda”.
Segundo Agostinho Santos, o presidente do TS e do CSMJ, Joel Leonardo, “mentiu” à Assembleia Nacional e ao Presidente angolano ao ter remetido uma carta de homologação do concurso quando este já havia recorrido dos resultados.
O juiz jubilado do TC angolano reafirmou que a CNE “é uma instituição nobre” e que a “paz, a estabilidade política, económica, social dependem substancialmente dos resultados eleitorais”, referindo que as eleições “são a alma do Estado democrático e de direito e não podem ser falseadas”.
Para não serem falseadas, argumentou, as pessoas à frente do processo “têm de ser idóneas, porque é com pessoas idóneas que os processos são credibilizados, tem de ser credível o processo eleitoral”.
“E não parece razoável que alguém pense que com o currículo do atual presidente putativo da CNE não desconfiara dos resultados, porque o ‘Manico’ é uma pessoa que nem sequer devia ser admitido do concurso”, rematou o juiz Agostinho Santos.
Na sequência das suas ações judiciais sobre o caso, Agostinho Santos esteve suspenso da sua atividade durante 180 dias, com perda total da remuneração, e “proibido” de aceder às instalações do TS e do CSMJ, em Luanda.