Os luandenses enfrentam hoje as consequências das oito horas de intensa chuva que caiu na segunda-feira, deixando um rasto de destruição, com mortes, casas submersas, ruas alagadas e amontoados de lixo na icónica baía da capital angolana
No interior dos bairros periféricos de Luanda, a paisagem transformou-se em intermináveis lagoas, dificultando a mobilidade de viaturas e cidadãos. Crianças e adultos não têm, por vezes, outra alternativa senão atravessá-las.
Ouvidos pela Lusa, munícipes da capital angolana clamam por “resposta urgente” das autoridades para se verem livres das águas que circundam as suas residências e temem que o pior ainda não tenha acabado, face às previsões de chuva neste mês.
A precipitação intensa arrastou enormes amontoados de lixo, ainda visíveis em várias circunscrições da capital angolana, e na baía de Luanda, ameçando a biodiversidade marinha com milhares de garrafas e sacos de plástico entre os resíduos.
À semelhança de dezenas de bairros de Luanda, no bairro Mota, distrito urbano do Sambizanga, são incalculáveis os danos das chuvas, com ruas alagadas e casas submersas e moradores a lamentarem as consequências da elevada carga chuvosa.
“O Sambizanga aqui está péssimo, porque em minha casa mesmo entrou muita água, estragou quase tudo. Façam alguma coisa, por parte do Governo para que nos possa desaguar aqui essa água, porque temos aqui uma bacia de retenção”, disse à Lusa Emília Domingos Pireza, 57 anos.
Natural do Sambizanga e moradora da conhecida zona do “Giló”, circula de botas de borracha, vulgarmente chamadas em Luanda como ‘mata cobra’, o único meio que garante a mobilidade para outros pontos do ‘Sambila’, cujo cartão-de-visita são as lagoas.
“Aqui para circular é apenas de “mata cobra”, senão ou pisa na água para comprar algo para comer. A situação está complicada e ainda vai chover e não sei como vou fazer”, lamentou.
António Moreira dos Santos, no Sambizanga há 20 anos, contou que o cenário de ruas intransitáveis e casas submersas naquela circunscrição de Luanda se “repete ano após ano” e pede “urgência na resolução das águas que continuam a invadir as residências”.
Queixou-se também da “letargia” da administração distrital, defendendo que a situação deveria ser solucionada com as verbas do PIIM (Plano Integrado de Intervenção dos Municípios), aprovado em 2020 pelo Presidente angolano para a construção de infraestruturas locais.
“Porque aqui a comissão já tentou solucionar isso [retirar a água], porque mesmo com o dinheiro do PIIM, que a administração recebe, acho que já deveriam pensar nesta situação, mas nada se vê”, atirou.
As consequências das chuvas também foram descritas por Anacleta de Oliveira Cláudio, moradora da rua da Lama, no Sambizanga, que referiu que muitos vizinhos tiveram de abandonar as suas residências como medida para salvaguardar a vida.
“[A água nas ruas] ultrapassa o joelho e sem botas temos mesmo que pisar na água. E estamos mal porque ainda estão previstas muitas chuvas e tememos pelo pior se voltar a chover com aquela intensidade”, lamentou.
Já a anciã Maria Emília, 73 anos, natural do Sambizanga, que viu a sua casa transformada num pantanal, disse à Lusa que as chuvas, que entraram igualmente pelo teto danificado do seu pequeno quarto, não pouparam os seus eletrodomésticos.
“Estou aqui num sofrimento, sempre que a chuva cai, a chuva foi demais, chorei porque não aguentei mais, a água toda da rua invadiu a casa toda e o quintal e não estou mais a aguentar esta situação”, desabafou, pedindo ajuda a pessoas de boa vontade.
O balanço provisório apresentado, na segunda-feira, pelo Serviço de Proteção Civil e Bombeiros angolano apontava para 14 mortos, centenas de casas inundadas e outras parcialmente desabadas, em consequência das chuvas.