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Angola: Mãe trabalha como “lotadora de táxi” com um bebé ao colo e outro às costas

Conceição Domingas Bernardo, a jovem de 24 anos, trabalha como lotadora de táxi numa das paragens do Futungo para sustentar os dois filhos, de um e três anos, que carrega, um ao colo e outro às costas. É um trabalho tomado pelos homens, mas Conceição enfrenta o desprezo da sociedade e, principalmente, dos cobradores só para não ver os filhos passarem fome

De pano, blusa e lenço na cabeça, ligeiramente suja e chinelas feitas de pneus, quem a vê de dentro da viatura pensa que é mais uma cidadã que está com problemas psíquicos (ou vulgarmente chamada de maluca). Comentários sobre a forma como se apresenta não faltam, e mais ainda quando os taxistas param para levar mais passageiros. Chama a atenção o facto de ser mulher, trabalhar como lotadora de táxi (cidadão encarregue de convencer os passageiros a subirem num ou noutro táxi, por meio de chamada, em voz alta, da rota que faz o taxista), uma ocupação maioritariamente exercida por homens.

Como se não bastasse, ela lota os táxis carregando ao colo a sua filha de um ano e às costas o filho de três anos de idade. O cenário é de lamentar, principalmente para as mulheres que têm filhos e sabem o quão cansativo é transportar, o dia todo, um bebé ao colo ou às costas. Lamentam ainda o facto de estas crianças estarem expostas ao perigo, ao sol, ao frio, à poeira e dali apanharem alguma enfermidade. No dia que conversou com a equipa de reportagem do Jornal OPAÍS, a pequena Sandra, sua filha de um ano de idade, que carrega ao colo, estava com diarreia e a fazer febre.

Eram 13 horas e 45 minutos e Conceição Domingas Bernardo, a mãe, não tinha dinheiro suficiente para levar a filha a um centro médico próximo, a fim de ser atendida por um médico. Estava a trabalhar, como todos os outros dias, para garantir o seu sustento e dos dois filhos, na paragem da “Staff Baianos”. No local, quase todos os taxistas já a conhecem, porque a paragem é “praticamente dela”. Chama, de um lado para o outro, para depois receber 100 ou 50 Kz das mãos dos cobradores de táxi. Nem todos colaboram, alguns desprezam o seu trabalho, mas tem havido muitos que dão mesmo sem ela ter trabalhado o suficiente, em jeito de ajuda.

Ganha, em média, 3 a 4 mil Kz “Nos primeiros dias saía com 18 ou 17 mil Kz. Esse dinheiro não vinha todo das mãos dos cobradores, mas sim dos passageiros. Alguns dão mil ou 2 mil kwanzas, para comprar comida para as crianças, quando me vêem a chamar. Senão, a média diária de ganho são 3 a 4 mil Kz”, disse. Conceição, que não parece ter 24 anos, disse que esta é a única maneira que arranjou para garantir o sustento dos dois filhos que estão sob sua tutela. Trabalha como lotadora há mais de três meses, e escolheu fazer este trabalho na “placa da Staff Baianos”, no Futungo.

A placa (paragem) escolhida por Conceição, a que nos referimos anteriormente, fica no Futungo, ou seja, é a paragem de táxis a seguir, depois da passadeira da AngoMart, para quem vem do Benfica. São, como também é conhecida, vive no Desvio do Sequele e todos os dias toma um autocarro, às 7h, para trabalhar no Futungo, tudo porque os lotadores das paragens do seu município (Cacuaco) não a permitiram trabalhar “nas suas placas”. Preferiu escolher uma “placa” distante de casa.

A viagem é feita com os dois filhos porque não há ninguém em casa para ficar com os pequenos. Assim, todos os dias, Marcelo e Sandra acompanham a mãe que lota táxis numa das paragens do Futungo, até por volta das 16h – hora definida para abandonar o local e regressar a casa. Antes de decidir ser lotadora vendia “pão com fígado” e fazia biscates de lavar roupa, mas depois do nascimento da filha cassula teve de parar. Sem biscates e sem negócio, e com a fome a apertar, teve de escolher ser lotadora.

“O pai das crianças fica na outra mulher (a 1.ª) ”

Questionada pela nossa reportagem sobre onde anda o pai das crianças, Conceição respondeu que “está na outra casa, na 1.ª mulher. Eu sou a segunda”, respondeu, dando a conhecer que não queria falar muito sobre este assunto. Face à insistência da nossa reportagem, Conceição acabou por confessar que o pai dos seus três filhos trabalha como segurança privado, dá, quando tem, alguma coisa, mas ultimamente está sem receber o salário há muitos meses.

O segurança privado tem seis filhos com a primeira mulher e três com a segunda. Esta situação fez com que Conceição não cruzasse os braços e fosse à luta. Pediu a uma de suas irmãs para ficar com o primeiro filho, de seis anos, cuidar dele e colocá-lo na escola, enquanto cuida dos dois que carrega ao colo e às costas. “Muitos apareceram aqui com promessas de me ajudarem, inclusive já teve quem dissesse que me daria dinheiro para comprar negócio”, mas nunca aconteceu.

Tenho boca, tenho mãos, tenho pernas, meus filhos não podem morrer à fome”, lamenta. No dinheiro diário que faz, normalmente, compra um prato de comida de 300Kz, conhecido como “bandeco”, que almoça com os filhos. Quando conversou com a nossa equipa, ainda não tinham almoçado, pelo que a mãe estava preocupada em trabalhar e conseguir dinheiro para a assistência médica e medicamentosa de Sandra

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