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Angola: “Não havendo investigação, não se pode manter as pessoas penduradas”

Jurista Rui Verde diz que juiz Ivo Rosa mandou desbloquear conta de Tchizé dos Santos em Portugal, porque não houve avanços no processo judicial. “Isto descredibiliza as investigações aos casos de corrupção”, adverte.

O Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) de Portugal desbloqueou uma conta bancária de Tchizé dos Santos, filha do ex-Presidente angolano José Eduardo dos Santos. Para o juiz Ivo Rosa, conhecido pelos chamados “mega-processos” na Justiça portuguesa, o levantamento da medida deve-se à ultrapassagem dos prazos de inquérito e à ausência de provas que fundamentem as suspeitas quanto à origem ilícita dos fundos.

A conta tinha sido bloqueada em agosto de 2020 por suspeita de que Tchizé dos Santos estaria a usar o sistema português para camuflar uma eventual origem ilícita de verbas, tendo em conta a proveniência da transferência, uma conta na Suíça, e o desconhecimento da fonte prévia dos fundos.

Em entrevista à DW África, o jurista português Rui Verde, comentador do portal angolano Maka Angola, aponta que a decisão do juiz de desbloquear a conta bancária da filha do antigo Presidente de Angola está tecnicamente fundamentada na lei portuguesa.

DW África: O que acha desta decisão do juiz Ivo Rosa?

Rui Verde (RV): As decisões do juiz Ivo Rosa, na minha opinião, são sempre bastante rigorosas em termos de Direito. Ele é um juiz que olha com atenção para os processos e pondera as coisas. Neste caso concreto, ele entendeu que o Ministério Público (MP), durante o tempo em que teve a conta de Tchizé dos Santos congelada, não trouxe nada de novo para o processo e como tal ele tinha de desbloquear as contas. Em termos técnicos, parece-me uma decisão acertada.

DW África: O juiz sustenta que as suspeitas iniciais sobre a origem ilícita dos montantes em causa “radicam no facto de a visada ser filha do ex-Presidente de Angola, na opacidade do sistema financeiro suíço e no desconhecimento da origem dos fundos”. Mas salienta que “nenhuma investigação foi levada a cabo, junto das autoridades de Angola ou junto da visada, com vista a recolher elementos relativos à origem dos fundos movimentados da Suíça para Portugal”. Como se justifica esta ausência de investigação?

RV: Não tem sentido congelar-se contas e depois não haver resultados nem positivos, nem negativos, de uma investigação ou, aparentemente, não haver investigação. Isto acaba por descredibilizar as investigações aos casos de corrupção e branqueamento de capitais. Houve aqui, talvez, uma falha do MP português, mas não conheço os detalhes. Esta decisão nem absolve, nem inocenta Tchizé dos Santos. É uma decisão técnica e está correta. Não havendo investigação, não se pode manter as pessoas penduradas.

DW África: Vê aqui um sinal de “arrefecimento” desta parceria entre as autoridades angolanas e portuguesas na ofensiva contra a corrupção?

RV: De maneira nenhuma. Não se pode ler como um arrefecimento. Há muitas investigações em curso e como tal algumas avançam mais depressa, como acredito que seja aquela relativa a Isabel dos Santos. Outras foram ficando para trás, como esta de Tchizé dos Santos. Não dou interpretações políticas a esta decisão. Como temos visto noutros processos, o juiz Ivo Rosa não é muito político, portanto não me parece que se possa fazer essa ilação.

DW África: Ficarão por aqui as investigações a Tchizé dos Santos?

RV: Creio que não. Acredito que estas investigações à família de José Eduardo dos Santos são em espiral, ou seja, vão e vêm e vão-se aprofundado. É possível que ela surja noutro caso qualquer. Isto é obviamente um sinal vermelho do juiz ao MP e talvez obrigue o MP português a agir. Isto é um ato que visa espicaçar o MP.

DW África: Vários comentários na nossa página do Facebook apontam para um “efeito José Eduardo dos Santos em Angola”, referindo-se ao regresso do pai de Tchizé, em setembro, e a um alegado “trabalho em silêncio” do ex-Presidente. Há aqui alguma ligação ou é apenas uma teoria da conspiração?

RV: As teorias da conspiração em Angola neste momento são o principal tema. Não me parece que José Eduardo dos Santos tenha neste momento qualquer influência sobre a Justiça portuguesa, sobretudo em Ivo Rosa. Não, não acho que haja qualquer ligação.

 

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