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Angola: O “bloco fula” e o golpe na Guiné-conacri – José Gama

Para compreender os últimos eventos (eleições e Golpe de Estado), que aconteceram na Guiné-Conacri, requer também entender o que se tem registado na vizinha Guiné-Bissau. Os dois países partilham as mesmas etnias e os seus presidentes (Sissoco Embaló e Alpha Condé) estão desde há algum tempo de costas viradas devido a um novo fenómeno, que está a levar ao poder naqueles países da África Ocidental um grupo de presidentes mulçumanos de etnia fula.

Nas eleições de 2019, na Guiné-Bissau, o então candidato presidencial, Sissoco Embaló, foi acusado de usar a etnia e a religião para mobilizar apoios e criar divisões na sociedade guineense.

“Eu penso que as pessoas mais democratas são os fulas. Eu sou de etnia fula, por parte do meu pai e os fulas se fossem como os balantas e as outras etnias, ey ganhava logo na primeira volta”, afirmou, quando questionado sobre se a questão étnica era importante para a sua eleição.

“Os fulas não votaram a 100% em mim, votaram em Domingos Simões Pereira, que é antifula e antimuçulmano”, dizia Sissoco.

Em Fevereiro de 2020, Domingos Simões Pereira (DPS), o líder do PAIGC, foi a Luanda e, ao comentar sobre as eleições presidenciais do seu país, denunciou “a existência de uma agenda estranha da Guiné, movida por questões religiosas, étnicas e tribais”.

Seis meses depois, a partir do exterior do país, Domingos Pereira Simões gravou um vídeo em que voltou a chamar atenção sobre a existência de uma agenda nacional de inundar o poder com elementos da etnia fula. Simões entendia que o poder estava nas mãos de uma ala radical da etnia fula.

A nível da Guine Bissau, este alerta começou a ser acolhido com preocupação, porque estava a ser notado que numa fase inicial sempre que o novo Presidente fazia mexidas ou movimentações de embaixadores, dava como preferência a personalidades da etnia fula e depois, para baralhar, coloca um outro que não é fula.

Os fulas são uma etnia nómada que compreende as várias populações da África Ocidental, mas também na África Central e no Norte de África sudanesa; partilham a mesma língua, mesma religião (islamismo). É um dos maiores grupos desta região (25 milhões de populares). A nível daquela região, há um bloco inédito de países como Gâmbia, Senegal, Serra Leoa , Nigéria, Níger e Mali, que elegeram presidentes membros da etnia fula (ou fulani). Estes, por sua vez, apoiam Sissoco Embaló. Os presidentes não fula deste bloco são apenas os da Guiné-Conacry (“mandinga”), Togo (“euê”) e Costa do Marfim.

Dentre os seis países com os quais a Guiné-Conacri partilha fronteira, quatro deles têm presidentes de etnia fula, nomeadamente: Guiné-Bissau (noroeste), Senegal (norte), Mali (norte e nordeste) e Serra Leoa (sul). Os vizinhos não fula são Costa do Marfim (sudeste), Libéria e Serra Leoa (sul). Em Outubro de 2020, Alpha Condé encerrou as fronteiras com os vizinhos “fula” da Guiné Bissau e com Senegal.

Sissoco Embaló (fula) e Alpha Condé (etnia mandiga constituída por 11 milhões naquela região) têm divergências. Condé é acusado de ter apoiado o candidato do PAIGC nas últimas eleições da Guine Bissau. Nas eleições presidenciais de Dezembro de 2020 da Guine Conakry, o vizinho Sissoco Embaló irritou Alpha Condé, apoiando o líder da oposição, Cellou Dalein Diallo, que é membro da etnia fula.

Durante a campanha eleitoral, o Presidente Alpha Condé, apelou aos elementos da sua etnia para se unirem em torno da sua candidatura controversa a um terceiro mandato, qualificando aquelas eleições como uma “guerra” entre o Governo e a oposição.

Dizia que votar num candidato mandinga que não seja do RPG [União do Povo da Guiné (Rassemblement du Peuple de Guiné) partido no poder] é o mesmo que votar em Cellou Dalein Diallo, referindo-se ao seu principal opositor da etnia fula.

Nestas eleições, a ONU alertou contra o “discurso de ódio étnico” que estava a marcar a campanha entre os dois principais candidatos à Presidência da República. Na Guiné Conacri os fulas (33,4%) e os mandingas (29,4%) constituem a maioria dos 13 milhões de habitantes. O sentido de voto foi claramente étnico. O Presidente Alpha Condé foi acusado de praticar irregularidades para voltar a fazer-se eleger para um terceiro mandato, depois de ter alterado a Constituição. Ganhou com 59, 49% dos votos.

Neste domingo (5), o Presidente Alpha Condé foi derrubado pelo coronel Mamady Doumbouya. Até agora, está todo mundo a querer saber de que grupo étnico pertence este jovem militar das forças especiais, que se alega ser mandinga. No espaço de debate do site “Nairaland.com”, um internauta deste país, identificado por Babanah, diz que prefere aguardar para ver se “os conspiradores do Golpe não sejam fula, que são o maior grupo étnico na Guiné, mas que nunca tiveram oportunidade para governar”.

Um outro internauta alega que “a razão para o Golpe na Guiné é porque a maioria dos fula estava descontente com o presidente eleito, que veio de uma tribo minoritária e que as nomeações que andou a fazer eram todas “desequilibradas”.

Se para uns, o Golpe de Estado, na Guine-Conacri, é uma oportunidade para em breve trazer ao poder Presidente “fula”; para os vizinhos da Guine Bissau, ligados ao PAIGC, o que está acontecer neste país não será se não a chamada “agenda estranha” a que Domingos Pereira Simões tem chamado atenção nos últimos dois anos. A agenda de expansionismo da ala “radical islâmica de origem fula” em tomar o poder na África ocidental.

 

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