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Angola: O Comité Provincial do MPLA é a “Vanguarda da Corrupção” em Cabinda – Raúl Tati

A corrupção em Cabinda é promovida e tutelada de forma cavilosa e ardilosa pelo Comité Provincial do MPLA, órgão que avocou a si a ´´competência´´ política de interferir directamente na administração pública do Estado. Longe de estar alinhado com o PR João Lourenço no programa de combate contra a corrupção e a impunidade, esse órgão é um antro onde se acoitam as figuras mais corruptas da Província. Esta é a razão pela qual o combate contra a corrupção e a impunidade não têm pernas para andar em Cabinda.

Esta premissa até podia ser uma verdade de ´´La Palisse´´ ou seja um truísmo gratuito, porque dizer que o MPLA é a grande máquina da corrupção na Província não é uma novidade para a opinião pública. Todavia, a pertinência desse juízo decorre do facto de esse mote ter sido colocado no epicentro do plano governativo do Presidente João Lourenço cujo mandato está em fase crepuscular. Daí que é preciso começar a reflectir e analisar os factores de estrangulamento que emperram em Cabinda as demandas da cruzada lourencista.

Já é momento de apresentarem resultados desse combate, talvez mesmo com estatísticas demonstrativas daquilo que já foi feito em Cabinda. De 26 a 30 de Abril vai decorrer mais uma semana da legalidade sob a égide da PGR. É uma boa oportunidade para trazer o assunto à liça. Está lançado o repto!

Cá para mim não há dúvidas de que o MPLA é o maior inimigo do combate contra a corrupção e a impunidade em Cabinda. É a partir do seu Comité Provincial que se encontram os freios sofisticados que bloqueiam qualquer acção nesta perspectiva. Nos seus discursos, o combate contra a corrupção aparece como uma litania sagrada, uma causa ´´divina´´ à qual os ´´gloriosos´´ estão dispostos a dar a vida. Na prática, tudo zero. Quanto mais falam, menos fazem. Aliás fazem exactamente o contrário, promovendo práticas danosas contra os interesses do Estado. A maior parte dos gestores públicos nomeados na Província passa pelo crivo do Comité Provincial. Por quê mantêm essa praxe numa república constitucional e não partidocrática? Não se trata de um exercício para a aferição das competências dos candidatos, mas para estabelecer, desde logo, as regras de jogo da ´´captatio benevolentiae´´ que colocam esses cidadãos numa espécie de dívida moral diante desse órgão partidário.

Tendo em conta o seu ímpeto incontrolável por vantagens materiais e enriquecimento rápido, alguns desses gestores nomeados com a aprovação partidária passam a ser avatares dos ´´patrões´´ domiciliados lá na ´´Casa Grande´´, o nosso kremlin em miniatura. Sem o aval do Comité Provincial do MPLA, onde pontifica o todo-poderoso segundo secretário do partido, não há cargo para ninguém. A lealdade partidária hoje deixou de ser logomarca porque a ideologia foi varrida pela barriga. Conta mesmo muito hoje é aquilo que René Dumont designou por ´´la politique du ventre´´. Ficou consagrado o diletantismo político. Muitos acabaram por lá estar não por convicções politico-ideológicas, mas por fingimento – o importante não é ser mas parecer – apenas para garantir um cargozinho no governo ou no aparelho do Estado. Um cargo é, nesta lógica, uma oportunidade para mudar o estatuto social e ganhar vantagens materiais. Mas isso só pode ser expressão de uma grande miséria moral que grassa nesta sociedade com a perversão da hierarquia de valores. Por esta razão, a decadência do MPLA é antes de tudo uma decadência moral. O resto virá por acréscimo!

Nessas condições, o Estado fica impotente em cumprir com o fim último da sua existência: proporcionar o bem-estar e felicidade a todos cidadãos. O Estado anda sequestrado e subalternizado pela máquina partidária que comanda e manda em tudo. Como é que uma máquina que promove o cabritismo, o nepotismo, a incompetência, a mediocridade, o peculato e dá guarida a uma extirpe mais perigosa que o coronavírus pode ajudar o Estado a proporcionar o bem-estar ao tal ´´Povo heroico e generoso´´? A cáfila partidária tem uma ascendência indiscutível sobre o Estado. Em certa medida o MPLA continua a confundir-se com o Estado. É só ver os símbolos nacionais e as datas comemorativas.

Em 2019, durante a semana da legalidade promovida anualmente pela PGR, o então Sub-Procurador Geral da República Titular em Cabinda, o Dr. Luís Ferreira Benza Zanga, anunciou aos microfones da Rádio-Cabinda (grupo RNA), no âmbito do combate contra a corrupção e a impunidade, que vários crimes económico-financeiros imputados a gestores públicos da Província já tinham sido investigados e estavam na fase da acusação para o respectivo trânsito em julgado. O Magistrado do Ministério Público não disse nomes dessas entidades ou gestores, mas apontou os sectores do governo da Província que estavam atolados nesses crimes. De lá para cá não se sabe se esses processos foram arquivados ou prescreveram com o Novo Código Penal. Entretanto, os gestores então indiciados foram premiados com novos cargos e estão muito bem acoitados no Comité Provincial do MPLA em Cabinda. Afinal há o princípio da presunção de inocência e os inocentes não devem ser molestados! Mas até que a justiça prove o contrário.

Em 2020, a PGR em Cabinda moveu uma acção contra alguns gestores públicos indiciados com os crimes de peculato. Foi emitido o competente mandado que resultou na detenção dos mesmos. Essa acção provocou uma reacção inesperada do MPLA em Cabinda. Por ordens superiores foram postos em liberdade e o Procurador ´´azarado´´ que ordenou a detenção ficou em maus lençóis e por um fio teve a carreira comprometida. Desde então o nosso ´´partisan´´ da luta contra a corrupção anda quedo e mudo, reduzido a um estatuto de eminência parda. Caso para se dizer que «Quando a política penetra no recinto dos Tribunais, a justiça se retira por alguma porta». (François Guillaume Guizot)

Para além desses casos emblemáticos, tenho conhecimento de casos investigados cujos agentes, depois de concluírem o seu trabalho com o apuramento de provas ou evidências de gestão danosa no aparelho governativo, quando foram submeter o relatório aos superiores hierárquicos, tudo encalhou aí definitivamente. Se não quisermos perder o fio à meada, isso significa ´´tout cour´´ que existe um circuito fechado de cumplicidade entre malfeitores instalados no aparelho do Estado. Basta uma conversa de cavalheiros para tudo estar em pratos limpos, prejudicando deliberadamente o Estado.

Enquanto se distrai a população com o empolamento episódico na comunicação social de uma justiça selectiva e do dantesco fim da era da impunidade, os rombos nos cofres do Estado somam e seguem com novos banquetes a serem servidos com arrotos à porfia. A ideia que está sendo passada é que enquanto o Presidente João Lourenço está engajado numa inusitada lawfare (uso indevido de vias judiciais visando actos persecutórios) contra os conjurados do clã eduardista, os gestores actuais persistem tranquilamente com as suas práticas de corrupção cada vez mais sofisticados. Em suma, ´´combate-se´´ a corrupção da era eduardista. A era Lourencista, esta, ainda tem de esperar pela sua vez.

Um dos grandes reflexos dessa gigantesca teia de corrupção em Cabinda é o subdesenvolvimento, a precariedade social, a pobreza multidimensional que atinge grande maioria da população. Todos os projectos sociais, económicos ou produtivos que envolvem dinheiros atraem imediatamente a ganância e a cupidez de quem tem na mão a chave para a solução dos problemas da população. A contratação pública é um dos instrumentos menos transparentes e mais manipulados onde na maior parte das vezes o árbitro é também um exímio jogador. Quando não se esconde por detrás de um ´´testa de ferro´´, fazendo negócio consigo próprio, exigirá os inevitáveis 10%, uma prática bem instalada em Cabinda. Entretanto, os 10% das receitas fiscais mensais da exportação do crude que eram alocados ao governo da Província de Cabinda sumiram ´´por uso indevido´´, segundo a Secretária de Estado do Orçamento e Investimentos Públicos, Aia-Eza Nacília Gomes da Silva, quando respondia ao meu questionamento sobre o destino que fora dado a essa dotação financeira em sede da discussão do OGE na Assembleia Nacional. Assim, estamos em pleno fim da era do petróleo e Cabinda não ganhou um cavaco em mais de cinquenta anos de exploração. Danação!…

Há um aforisma filosófico usado por Leibniz (natura non facit saltus) e também usado sete vezes por Darwin (nature makes no leap ou nature does not make jumps) e que significa que a natureza não dá saltos. Ora se a corrupção está arreigada na natureza do MPLA, pois trata-se de um fenómeno sistémico e não atomizado, como pode ele combatê-la? No mínimo seria uma autodestruição. O que se passa em Cabinda é praticamente a tradução desse dilema numa escala menor. Não há lei que ponha fim nisto. Com sobeja razão dizia Sir Thomas Jefferson: «Quando os homens são éticos, as leis são desnecessárias; quando os homens são corruptos, as leis são inúteis». Não hajam ilusões: somos governados por corruptos!

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