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Angola: Organizações Não-Governamentais (ONG’s) mantêm “voz única” contra proposta de lei do seu estatuto

O Receio das organizações da sociedade civil é que, por ser uma proposta de lei da iniciativa do Executivo possa ser aprovada sem alterações, sobretudo nos pontos fraturantes.

A proposta de Lei das Organizações da Sociedade que define um novo estatuto continua a ser alvo de críticas de organizações não governamentais e dos partidos da oposição.

Ao coro de protestos juntaram-se recentemente três relatores da ONU que, em carta enviada ao Presidente da República de Angola, João Lourenço, alertaram para “violações de direitos humanos”.

“Se o projeto de lei for aprovado na forma atual, impõe regulamentação excessivamente rígida e concede controle governamental injustificado sobre operações das organizações não-governamentais (ONG)”, referem aqueles relatores.

Uma das principais preocupações, segundo Leonela Massokolo, assessora do Mosaico – Instituto para cidadania, é o fato da nova proposta de lei interferir na autonomia e o trabalho das organizações da sociedade civil e pôr em risco o surgimento de outras.

Relatores da ONU apontam violação dos direitos humanos e obrigações de Angola

“É uma interferência clara ao trabalho que se tem feito que coloca em risco todas as organizações da sociedade civil e não só, até ao próprio espaço cívico e a questão de participação em Angola”, refere Massakolo.

Na carta, os relatores da ONU alertam que “a proposta de lei contraria os direitos humanos e obrigações internacionais de Angola, incluindo o direito à liberdade de associação, o direito à liberdade de opinião e expressão e o direito à não discriminação”.

A carta enviada ao Chefe de Estado angolano “é apenas um lembrete de que para além da lei ser antidemocrática e inconstitucional, ela também viola acordos internacionais que o Governo angolano assinou há décadas tanto com as Nações Unidas como com a União Africana e uma delas é o respeito pela liberdade de reunião e direitos humanos”, refere o diretor executivo da Friends of Angola (FoA).

“O Presidente da República certamente estaria a dar um sinal negativo às organizações internacionais tal como às Nações Unidas e a União Africana se não respeitar estes direitos constitucionais e internacional. É crucial que o Presidente Lourenço respeite os direitos de liberdade de reunião, de manifestação e liberdade das pessoas poderem constituir organizações a nível local ou nacional para as pessoas poderem resolver os seus problemas”, alerta Florindo Chivucute.

A Assembleia Nacional angolana aprovou na generalidade, a 25 de maio, a proposta de lei do Estatuto das Organizações Não-Governamentais, mas foi remetida para a Comissão de Especialidade para análise.

Deputados com leituras diferentes

O receio das organizações da sociedade civil é que, por ser uma proposta de lei da iniciativa do Executivo e, conjugado com o fato do seu partido, o MPLA, ter a maioria parlamenta, possa ser aprovada sem alterações, sobretudo nos pontos fraturantes.

Florindo Chivucute entende que se a lei for aprovada contra a vontade das organizações e da comunidade internacional, “Angola estará numa situação muito delicada” dando sinais de falta de vontade política para consolidação da democracia no país e, “caminhando para um regime autoritário”.

Entretanto, deputados do MPLA e da UNITA contatados pela Voz da América em Luanda não aceitaram gravar entrevista, mas afirmaram categoricamente que a referida não proposta de lei jamais voltará à mesa da casa das leis nos termos em que foi apresentada pelo Executivo.

“Duvido que a proposta de lei seja debatida novamente no Parlamento tal como o Executivo a apresentou”, garanta um deputado do grupo parlamentar da UNITA e membro da 1ª Comissão dos Assuntos Constitucionais e Jurídicos quando questionado se mantém a tese inicial de rejeição da proposta de lei.

“Os deputados recursaram a proposta de lei [das organizações da sociedade civil] por ser fascista”, refere outro parlamentar da bancada da UNITA, igualmente sem gravar entrevista e sob anonimato.

Fontes da bancada parlamentar do MPLA asseguram que “nenhuma proposta de lei ou projeto de lei no Parlamento é aprovada tal como é remetida, seja da iniciativa do titular do poder Executivo ou da própria Assembleia Nacional”.

Sem gravar entrevista, o mesmo parlamentar que pediu o anonimato afirmou que as informações sobre a não alteração da proposta depois de ouvidas as contribuições das organizações da sociedade civil, “não passam de falsas informações e carregadas de um forte sentido de populismo, promovido pelo partido UNITA”.

“A proposta de lei ainda não tem data de discussão final agendada e, nunca teve desde que foi remetida para Comissão de especialidade. É falsa a informação segundo a qual o documento seria aprovado no passado mês de Outubro”, acrescenta o parlamentar da bancada do MPLA.

A respeito do conteúdo da lei e dos riscos de violação do direito de liberdade reunião, de manifestação e de participação cívica na vida do país, por meio da terceira via, aquele deputado igualmente membro da 1ª Comissão dos Assuntos Constitucionais e Jurídicos, da Assembleia Nacional afirma que algumas propostas sugeridas pelas forças políticas nãa oposição “não tinham cabimento”.

“Repare que a oposição estava a impor que a referida lei devesse constar os direitos e deveres das forças da ordem. Ora, a polícia e demais forças da ordem são reguladas por leis próprias e, ademais tudo aquilo que contraria a lei é crime e, por ventura a corporação agir contrariamente a lei não precisa ser a lei das organizações da sociedade civil para a condenar, temos a lei suprema do país, a Constituição da República e de mais leis ordinárias que já fazem isto”, garanta o mesmo deputado, acrescentando que esta pretensão da oposição, particularmente manifestada pela UNITA, poderá provocar uma contradição de leis.

“Ora que a proposta de lei incorporasse os deveres e os direitos dos órgãos de seguranças poderia nos colocar numa situação de antinomia jurídica ou seja em contradição entre duas ou mais normas jurídicas”, afirma.

“Ainda não consta da agenda o debate, mas é certo que nós ouvimos e acolhemos as sugestões da sociedade civil, inclusivamente recebemos em tempos uma comitiva composta por representantes de três organizações da sociedade civil membros do Grupo de Trabalhos de Monitoria de Direitos Humanos e prestamos todo esclarecimento a respeito a respeito e ouvimos deles também importantes contribuições que certamente serão acolhidas”, conclui.

A proposta prevê a criação de um órgão de supervisão das organizações não governamentais, que terá o poder de fiscalizar as suas atividades e de dissolver aquelas que não cumprirem as normas estabelecidas.

A lei Igualmente prevê uma série de restrições às atividades das associações, como a proibição de realizar atividades políticas ou de receber financiamento de países estrangeiros.

As organizações da sociedade civil criticam essa previsão, argumentando que ela representa uma violação da autonomia das organizações e da liberdade de associação que limitam o papel da sociedade civil na promoção dos direitos humanos.

Florindo Chivucute pede maturidade aos deputados no que respeita à aprovação da proposta de lei, pelo que apela a realização de um estudo independente para se averiguar a dimensão da lavagem de dinheiro e corrupção em Angola e, a partir daí criar-se uma lei específica.

“Quando se trata da questão de transparência e lavagem de dinheiro não poder aplicada apenas a um grupo de organizações sem fins lucrativos, porque se não se torna discriminatória”, sustenta Chivucute.

Leonela Massokolo, por seu lado, reitera que a proposta é claramente inconstitucional, na medida em que viola a Constituição, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Pacto de Internacional sobre dos direitos civis e políticos e diferentes outros dispositivos legais.

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