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Angola: “Os desafios da governação de João Lourenço”

Quando assumiu o poder, a 26 de Setembro de 2017, o Presidente da República, João Lourenço, estava ciente dos grandes desafios que teria pela frente para relançar a economia, credibilizar o país e melhorar a condição de vida dos angolanos.

O Chefe de Estado angolano, terceiro no cargo desde a conquista da independência nacional, assumiu as funções num dos momentos mais difíceis de Angola em termos sociais e económicos, que iniciou em 2014 com a crise do mercado petrolífero.

Na época, João Lourenço tinha diante de si uma imensidão de problemas urgentes para solucionar, principalmente a escassez de receitas públicas e de divisas suficientes para manter o Estado nos “carris” e dar corpo ao seu desafiante plano de governação.

A chegada do Presidente ao cargo marcou o começo de um novo paradigma, assente, fundamentalmente, na diversificação da economia e no combate a práticas que se enraizaram na sociedade, entre as quais a corrupção, o nepotismo e a impunidade.

Foi nesses sectores, que o Titular do Poder Executivo focou a sua acção, inicialmente, para tentar construir uma nova Angola, onde impera a justiça, a igualdade de oportunidades, o espírito de reconciliação, a pluralidade de ideias e a liberdade de expressão.

Desde 26 de Setembro de 2017, têm sido estas algumas das principais batalhas de João Lourenço, que acaba de iniciar o seu último ano de mandato, marcado por duros desafios económicos e por reformas profundas na administração do Estado e da Justiça.

Diante de um cenário de crise mundial, devido à pandemia da Covid-19, o Chefe de Estado angolano confrontou-se, nos últimos 12 meses, com problemas de fundo e de resolução urgente, fundamentalmente a alta dos preços dos produtos da cesta básica.

À semelhança de 2017, 2018, 2019 e 2020, João Lourenço teve de confrontar-se com o desafio de aumentar as receitas não petrolíferas, fundamentais para desenvolver o país e honrar os compromissos da dívida externa, volvidos sete anos consecutivos de recessão.

Além desses domínios, confrontou-se com a premente necessidade de melhorar a política monetária, para assegurar a estabilidade da taxa de câmbio, bem como de reaquecer o mercado do emprego, bastante afectado pela pandemia da Covid-19.

Apesar dos enormes desafios, o quarto ano de mandato do Presidente da República ficou marcado por importantes realizações nos domínios político, económico, diplomático e social, numa altura em que o país se prepara para ir a eleições em 2022.

Em concreto, constitui destaque do quarto ano de mandato de João Lourenço a aprovação do Projecto de Lei de Revisão da Constituição da República de Angola (CRA).

De iniciativa presidencial, o texto de revisão pontual veio ajudar a clarificar matérias até então consideradas fracturantes, que deixaram o Executivo e os partidos da oposição, durante vários anos, em extremos opostos.

Apesar do aval do Parlamento, o Projecto de Revisão ordinária da Lei Magna teve de passar por duas deliberações do hemiciclo, na sequência do Acórdão do Tribunal Constitucional (TC), órgão encarregue da fiscalização preventiva da CRA.

No entanto, a aprovação deste Projecto de Lei foi apenas parte de um pacote mais amplo que tem a ver com a reforma do Estado e inclui o já conhecido combate à corrupção, a redução de ministérios, de 28 para 21, o redimensionamento dos institutos públicos e a nova Alteração da Divisão Político-Administrativa do país.

Quanto ao último ponto, a iniciativa do Presidente, institucionalizada pelo Decreto nº 104/21, de 08 de Julho, prevê a auscultação pública com sessões nas cinco províncias alvo, designadamente Uíge, Malanje, Cuando Cubango, Moxico e Lunda Norte.

Corrupção

Outro facto assinalável, ao longo dos quatro anos de mandato, é o compromisso assumido com o combate à corrupção, uma promessa de campanha que João Lourenço deixou bem vincada no seu discurso de investidura, a 26 de Setembro de 2017.

No discurso, disse tratar-se de “uma das mais importantes frentes de luta dos próximos anos”, sublinhando ser um mal que “grassa nas instituições do Estado”.

Em Junho de 2017, ainda durante a campanha eleitoral, o então candidato do MPLA prometeu, na província do Zaire, norte de Angola, “colocar sal na gasosa”, termo utilizado pelos angolanos para se referirem à corrupção que se regista, sobretudo, na relação entre o agente da polícia e o cidadão.

Em concreto, João Lourenço assumia, publicamente, a sua firme determinação de combater duramente a corrupção, cunha e o amiguismo na função pública.

A esse respeito, nos últimos quatro anos ficaram bons sinais sobre o fim da impunidade, dando corpo a sua célebre frase de que “ninguém é suficientemente rico que não possa ser punido, nem pobre demais que não possa ser protegido”.

O estatuto social das pessoas levadas a tribunal, no quadro deste combate à corrupção e à impunidade, demonstrou que qualquer pessoa, tenha o cargo que tiver, pode ir parar às barras do tribunal, embora se reconheça existir ainda muito trabalho pela frente.

O desafio, agora, é fazer da luta contra a corrupção uma causa nacional, em que, além da acção da Procuradoria-geral da República (PGR), haja também o envolvimento dos partidos políticos e a fiscalização da sociedade civil.

É certo que os resultados do combate desses fenómenos não serão, certamente, atingidos na totalidade em pouco tempo, sendo, por isso, utópico pensar que a corrupção venha a ser vencida num “abrir e fechar de olhos”, com alguma varinha mágica.

Para se atingir esse desiderato, há que continuar a trabalhar com determinação e espírito patriótico, denunciando e punindo, sem tréguas, todos quantos tentarem estar acima da Justiça, prejudicando o erário e os cidadãos angolanos com práticas ilícitas.

É importante que, nessa etapa da luta, não haja protegidos nem se faça “vista grossa” a actos de branqueamento de capital, corrupção activa e passiva, nepotismo e outros males, sob pena de se manchar um trabalho que tem produzido resultados palpáveis.

A hora é de credibilizar as instituições da Justiça e demonstrar, de uma vez por todas, que ninguém é suficientemente forte que não venha a ser punido, num combate abrangente a todos os angolanos, sem olhar para a origem e condição dos implicados.

Este é um dos grandes desafios que o Presidente João Lourenço precisa de vencer, para acabar, de uma vez por todas, com a retórica crescente, em alguns círculos da sociedade, de que o combate à corrupção tem sido selectivo, sendo as vítimas “escolhidas a dedo”.

Diplomacia económica

Noutro domínio, a acção do Presidente João Lourenço mudou para melhor a imagem do país além fronteiras, com uma nova dinâmica na política externa, assente, fundamentalmente, numa diplomacia com impacto real na economia (captação de mais investimento estrangeiro para o país) e numa Angola comprometida com a abertura democrática, liberdade de expressão/imprensa e independência dos órgãos de justiça.

Aliás, na sua tomada de posse como Mais Alto Magistrado da Nação, João Lourenço definiu, exactamente, a necessidade dessa nova era na diplomacia angolana, que já o levou a países de África, da Ásia, Europa e América do Norte.

Uma das linhas marcantes do dinamismo na política externa de Angola tem sido a cooperação económica e comercial, o relacionamento bilateral, regional e multilateral.

Entre os vários parceiros, a China foi o primeiro a dar sinal de envolvimento, com uma linha de crédito de USD dois mil milhões do Banco de Desenvolvimento daquele país.

O financiamento, de Outubro de 2018, resultou de um acordo assinado entre os dois Estados, em Beijing, capital da China.

Angola é o segundo maior parceiro comercial dos chineses no continente africano.

Fomento do auto-emprego

Entretanto, no mar de tantas dificuldades, o desafio maior para o Presidente talvez seja, por esta altura, o fomento do auto-emprego para a construção de um tecido económico à base de micro e pequenas empresas, incluindo a criação de medidas de simplificação e desburocratização para a formalização de alguns sectores informais.

Há grande expectativa em relação aos resultados mais concretos dos principais programas económicos na vida dos cidadãos, sobretudo a implementação do Plano Integrado de Intervenção nos Municípios (PIIM) e do Programa de Apoio ao Empresariado Nacional.

Entre outras missões, o Presidente João Lourenço tem o da instituição das autarquias locais no país, um “desafio central” da actual legislatura, que decorre até 2022, como afirmou, no Parlamento, na abertura da primeira sessão legislativa da IV Legislatura.

“Um dos desafios centrais que assumimos para esta legislatura é passar as autarquias locais do texto constitucional para a realidade dos factos. É importante assegurar que o Estado esteja mais próximo dos cidadãos”, disse João Lourenço na época.

Na verdade, diversificar a economia, lutar contra a corrupção e concluir a aprovação do pacote legislativo autárquico são alguns dos grandes desafios para Angola até 2022, apesar do contexto de pandemia do novo coronavírus que assola o mundo.

Outro grande desafio, no actual contexto do país, é baixar os preços dos bens e serviços.

Discurso à Nação

Em linhas gerais, até o final deste mandato, o Presidente tem desafios enormes, que passam pela consolidação da estabilidade da economia, através do aumento da produção interna nos sectores da agricultura, indústria transformadora, pescas, serviços, entre outros, além de melhorar a oferta de emprego e devolver o poder de compra às famílias.

Os desafios que acabamos de elencar vão servir, certamente, de suporte da comunicação que João Lourenço fará ao país, nesta sexta-feira, na já habitual Mensagem Sobre o Estado da Nação, ponto mais alto da cerimónia de abertura do novo Ano Parlamentar.

Diante do actual contexto político, social e económico, espera-se que o Presidente da República vá à “casa das leis” para deixar uma mensagem de esperança aos angolanos, com respostas concretas e claras sobre como o Executivo pensa reaquecer a economia e devolver, fundamentalmente, a capacidade do poder de compra dos cidadãos.

Entre os cidadãos reina, certamente, a expectativa de escutar as linhas de força de João Lourenço para contrapor, com maior eficácia, a Covid-19, sem comprometer ainda mais a já fragilizada economia nacional, e como pretende melhorar os serviços básicos, mormente nos domínios da saúde, da educação e da habitação.

Espera-se, também, que João Lourenço volte a falar sobre a questão das Eleições Gerais de 2022 e da implementação das autarquias em Angola, assim como a melhoria do ambiente de negócios, o aumento da liberdade de imprensa e de expressão e, num outro contexto, sobre a situação política do país e do reforço do papel da Justiça.

Não restam dúvidas de que, tal como em 2017, na sua primeira ida ao Parlamento, o Discurso sobre o Estado da Nação será, este ano, um dos mais difíceis do consulado de João Lourenço, tendo em conta as repercussões dos altos índices de desemprego e da subida dos produtos da cesta básica, as maiores consequências da crise económica.

Se, por um lado, se conhecem as razões de fundo que levaram à estagnação da economia nacional e do mercado de emprego e de habitação, torna-se, por outro lado, imperioso que o Presidente da República conforte os angolanos com um discurso convincente e animador, capaz de devolver a esperança aos cidadãos.

Por Adolfo Luemba

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