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Angola: “Que país é este quase 50 anos depois da sua independência”? – Alves da Rocha

A componente social do sistema nacional de vida está um caos, quase a completarem-se 50 anos depois do histórico 11 de Novembro de 1975. Como a economia está verdadeiramente encravada, o social ressente-se, explode com a pobreza e rebenta com a miséria. Que país é este que ao fim de quase 50 anos de independência e 23 anos de cessação da guerra civil, tem para mostrar uma taxa de pobreza monetária de 45% da população total e de pobreza multidimensional de 52%?

Que país é este em que, sem a ajuda do sector informal (que se pretende a todo o custo liminarmente destruir, sem a construção de alternativas credíveis e sustentáveis), a taxa de desemprego pode rondar 86,5% (e a de emprego 13,5%)? Ainda segundo Precioso Domingos, ocorreu, entre 2018/1019 e I Trimestre de 2021, uma destruição de 400 mil postos de trabalho no sector formal da economia, ocorrendo questionar que país é este, afinal, onde, aparentemente, os programas de incentivo não produzem resultados positivos e se gastam somas impressionantes de dinheiro?

Que país é este que se encontra entre as 10 economias mais miseráveis do mundo, de acordo com o índice de miséria de Arthur Okun? Apreciem-se os resultados mais recentes para o nosso país, calculados usando a metodologia do seu autor:

 A tendência é para uma pioria deste índice, entre 2019 e 2020, numa perspectiva trimestral (a Venezuela e o Zimbabwe, com, respectivamente, 3827,6 e 547, são os piores países do mundo).

“Que país é este onde inflação e desemprego não se conseguem descolar, a despeito do programa de ajustamento estrutural e de consolidação orçamental em curso? Taxas de desemprego formal não corrigidas pelo peso e influência do informal de 30% são tremendamente elevadas, não menos o sendo as taxas de inflação de 25% ao ano. Onde e como a população se pode refugiar”?

A construção de um verdadeiro Estado Social como uma parte importante de um acordo de regime para se salvarem vidas, dar esperança às que persistirem em lutar e melhorar radicalmente as condições de vida, não da maioria da população, mas de cada um de nós, de per se, é o grande desafio para o futuro. Um Estado Social é um direito constitucional que nos assiste. É um direito universal em qualquer país, devendo os eleitos para a governação e administração da coisa pública ter apenas este fim em vista, não se esquecendo que ministros, secretários de estado e presidente da república são meros servidores públicos, responsabilizados por manter a coesão nacional, preservar o capital natural e o capital social da nação e garantir as condições de uma reprodução alargada da produção e das forças produtivas. O Estado Social não poderá ser palco de disputas políticas e eleitorais. Define-se, acerta-se, aplica-se e defende-se, a todo o custo, a sua existência e a introdução de melhorias e refinamentos sempre que tal se mostrar necessário. O Estado Social é o único suporte de uma economia social de mercado que fez dos países nórdicos e de outros autênticas potências sociais mundiais.

A burocracia dificilmente se combaterá com programas (quantos programas tem o país? Surge um problema e a forma de o resolver é através da elaboração de um programa, à custa do qual se cozinham mais uns arranjinhos para escoamento de partes substanciais dos dinheiros públicos). Combater a burocracia começa nas nossas cabeças, com doses de educação, cidadania e noções elementares de economia do bem comum (aprender com Jean Tirol, Nobel de Economia de 2014, justamente no seu livro intitulado “Economia do Bem Comum”, editado em português, bastando para o encontrar ir à Google). Combater a burocracia passa pela prática de salários compatíveis com competência e necessidades sociais (Marx definia o salário como a quantidade de trabalho socialmente necessário para prover o bem-estar). Quando ministros, secretários de estado e outros membros da nomenclatura governativa passarem a ser eles-próprios a tratar dos seus documentos nas repartições públicas, então compreender-se-á a verdadeira dimensão da burocracia, o seu custo para os utentes e suas incidências sobre a economia, o social e a mente das pessoas. A burocracia não está a diminuir, provavelmente até tem aumentado, a despeito de todos os simplexs em uso, que acabam mais por ser complexs. Quanto tempo demora a tratar-se de um passaporte, um elemento complementar da identificação dos cidadãos? A entrega dos documentos necessários num qualquer SIAC (tido pelo Governo como a cereja no topo do bolo da facilitação de negócios) demora entre 3 e 4 horas (contabilizadas por mim ontem). A obtenção do documento que me permite viajar pelo mundo vai demorar 90 dias no mínimo. O que afinal se passa?

Bastariam “Construção do Estado Social” e “Erradicação da Burocracia” para se constituir um Pacto de Regime sustentável e credível, com projecção futura sobre a estabilidade política e o bem-estar dos cidadãos. O resto – combate à corrupção, erradicação da pobreza e crescimento económico – aconteceriam na sua sequência.

Que país é este, quase no final do segundo decénio do século XXI, onde muito pouca coisa funciona em benefício de nós-próprios?

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