O analista da consultora NKC African Economics que segue a economia de Angola considerou que uma queda dos preços do petróleo ou uma falha nas receitas não petrolíferas pode obrigar o país a reestruturar a dívida.
“Angola continua com risco elevado de ter uma dívida problemática [‘debt distress’, no original em inglês], uma situação em que um país tem dificuldades em servir a dívida e necessita, ou está à beira de requerer, uma reestruturação da dívida”, disse Gerrit van Rooyen, numa nota enviada à Lusa.
“A dívida pública total está atualmente em mais de 120% do PIB, e os maiores riscos que precisariam de uma reestruturação dos empréstimos comerciais são outra queda dos preços do petróleo ou uma geração inadequada de receitas não petrolíferas, sendo que ambas podem acontecer se a pandemia de covid-19 e a recessão global não melhorarem significativamente este ano”, acrescentou o analista.
Comentando a quarta revisão do programa de assistência financeira do Fundo Monetário Internacional (FMI), aprovada esta semana e que permitiu o desembolso de mais 487,5 milhões de dólares, mais de 400 milhões de euros, o analista desta filial africana da Oxford Economics vincou que apesar das dificuldades, “o apoio continuado do FMI e as alterações ao perfil da dívida ao abrigo da Iniciativa para a Suspensão do Serviço da Dívida (DSSI) ajudaram a cobrir o substancial défice de financiamento que emergiu devido ao choque da covid-19”.
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Fazendo eco dos elogios do FMI ao empenho das autoridades no cumprimento do programa e na aplicação das reformas estruturais, a NKC African Economics notou que as recentes reformas nas áreas orçamental, monetária, política e fiscal justificam o apoio dos credores, mas alertou que a situação financeira continua dependente da evolução de vários fatores na economia mundial.
“Estas reformas justificam o recente apoio que os credores deram às autoridades, desde que estes esforços se mantenham e que os fatores externos não se deteriorem materialmente”, concluiu Gerrit van Rooyen.
A forte queda dos preços do petróleo e o aumento dos custos decorrentes da pandemia de covid-19 obrigaram Angola a procurar alívio da dívida junto de três credores chineses, impedindo um incumprimento financeiro por parte de uma das economias africanas mais endividadas.
Além dos 6,2 mil milhões de dólares, cerca de 5 mil milhões de euros, que Angola conseguiu adiar junto dos credores chineses, o Governo de João Lourenço optou por aderir à DSSI, o que adiou o pagamento de 1,8 mil milhões de dólares, o equivalente a quase 1,5 mil milhões de euros, em dívida aos países do G20.
Na segunda-feira, o FMI anunciou o desembolso de mais uma verba ao abrigo do programa de ajustamento em vigor no país desde 2018, elevando para quase 3 mil milhões de dólares o total já desembolsado até agora, de um programa que foi aumentado para cerca de 4,5 mil milhões de dólares no ano passado.
No comunicado que anuncia a quarta revisão, o FMI salientou que “a natureza multifacetada do choque da covid-19 continua a ter um impacto negativo na economia e na população de Angola” e que “a produção e os preços do petróleo continuam fracos”.
Contudo, a instituição sediada em Washington, Estados Unidos da América, sublinhou que as autoridades angolanas “conseguiram um ajustamento fiscal prudente em 2020 que incluiu ganhos de receitas não petrolíferas e contenção nas despesas não essenciais, preservando ao mesmo tempo as despesas essenciais em redes de saúde e segurança social”, e que a “aprovação do orçamento de 2021 em dezembro consolida estes ganhos”.
Por outro lado, nesta quarta revisão também se apontou que “as autoridades também permitiram que a taxa de câmbio atuasse como um amortecedor de choques e começaram a implementar uma mudança gradual no sentido de um aperto monetário para fazer face ao aumento das pressões sobre os preços”.