A polícia angolana impediu hoje e deteve seis ativistas de Cabinda, que tentaram realizar uma manifestação em frente à embaixada portuguesa em Luanda, para exigir a Portugal o cumprimento do acordo que permitia a independência do enclave
Segundo o presidente da Associação para o Desenvolvimento da Cultura dos Direitos Humanos (ACDH) de Cabinda, Alexandre Kuanga, os organizadores desta manifestação fazem parte do núcleo de Luanda.
Cerca das 11:00 de hoje, os manifestantes tentaram concentrar-se em frente à embaixada de Portugal, mas foram impedidos pela polícia, que já se encontrava no local em grande número.
A avenida de Portugal, onde se localiza a embaixada de Portugal, estava esta manhã sob forte aparato policial e a Lusa constatou no local que, pelo menos uma pessoa, que apelou à libertação de Cabinda e gritou “assassinos”, foi colocada numa carrinha prisional.
O ativista dos direitos humanos disse que foram detidos seis das dezenas de manifestantes que se dirigiram ao local, tendo sido conduzidos, numa viatura da polícia, em direção à província do Bengo.
“Informaram-nos que já ultrapassaram o quilómetro 30, em direção ao Bengo, das 11:30 até cá não se sabe para onde estão a ser levados. Foram detidos Henrique do Rosário Macosso Sita, Simão Tadila, MC Life, Hamilton, Meslei Zinga e Emerson. São esses seis que estão detidos e a ser levados em direção ao Bengo. Esta é a informação que tenho até ao momento como presidente da ACDH em Cabinda”, referiu.
De acordo com o presidente da ACDH, quando os organizadores chegaram ao local começaram a ser avisado pela polícia que não podiam estar ali, alegando que se trata de um dia de trabalho normal e que estão proibidos os ajuntamentos nas ruas, como determina o estado de calamidade pública, devido à covi-19.
A manifestação, cuja autorização foi negada pelo Governo da Província de Luanda, foi marcada para hoje, data em que foi assinado o Tratado de Simulambuco, que selou a criação de um protetorado português, no qual se Portugal se comprometeu a manter a integridade dos territórios.
“Para os ativistas esta data é que tornou o desastre do povo de Cabinda quanto aos problemas que se passam aqui, pilhagem de recursos e a falta de desenvolvimento económico e social de Cabinda, porque Portugal não respeitou esse tratado e, por conseguinte, anexou Cabinda a Angola”, referiu.
Os independentistas de Cabinda defendem que o território era uma colónia independente de Portugal e deveria ter sido tratada enquanto tal no processo de independência de Angola.
Em contrapartida, Cabinda, o território de onde é extraído a maior parte do petróleo de Angola, tornou-se numa província angolana e tem sido palco de confrontos por parte elementos armados que exigem a sua independência.
Alexandre Kuanga frisou que até agora “há guerra, conflito armado em Cabinda”, uma situação que se “deve a esse tratado”.
Os manifestantes “foram para a embaixada portuguesa, para que Portugal possa intervir, para que haja paz em Cabinda e parem com o conflito que existe em Cabinda, como consequência do acordo de Alvor (em 1975, que estabeleceu o processo de independência de Angola) em violação do Tratado de Simulambuco”, frisou.
O ativista salientou que estão a acompanhar, a partir de Cabinda, a situação dos seus colegas, tendo já contactado a Associação Mãos Livres, para acompanhar e dar assistência judiciária aos detidos.
“Nós cá em Cabinda, caso eles permaneçam 48 horas, vamos ativar uma manifestação para pressionar a sua libertação”, disse.
Questionado se foi igualmente organizada em Cabinda alguma manifestação em alusão à data, Alexandre Kuanga disse que o governo provincial impediu a ação e “encheu de polícias as ruas”.
“Aqui na minha casa chegaram às 06:00, uma viatura Land Cruiser e duas motorizadas, a seguir qualquer passo que pudesse marcar. Todas as artérias por onde passamos quando organizamos uma manifestação encheram de polícias. A única coisa que fizemos foi ir à rádio Ecclesia manifestar a nossa insatisfação”, acrescentou.
Também em declarações à Lusa, o advogado Arão Tempo, apelou às organizações de defesa dos direitos humanos nacionais para defenderem os direitos dos detidos bem como o “direito inalienável do povo de Cabinda”.
“Essas organizações sedeadas em Luanda, que nunca prestaram muita atenção ao território de Cabinda, que se coloquem no seu verdadeiro sentido de defesa dos direitos humanos, bem como as organizações internacionais, para encontrarem um modelo para acudir o povo de Cabinda, não havendo representações diplomáticas em Cabinda”, disse.
A Lusa tentou contactar a polícia para mais informações, mas sem sucesso.
A província angolana de Cabinda, onde se encontram a maior parte das reservas petrolíferas do país, não é contígua com o resto do território e desde há muitos anos, que líderes locais defendem a independência, alegando uma história colonial autónoma de Luanda.