Radicado em Portugal há mais de duas décadas interruptas, Betinho Feijó é dos mais referenciados guitarristas, arranjador e produtor musical que o país tem. Apesar da vivência e convivência na diáspora mantém vivo em si a matriz cultural angolana, também sedimenta no estilo musical Semba. Este artista, apreciador do Carnaval, fala nesta entrevista sobre o seu percurso e recorda com emoção o grupo “Tópicos do Ritmo” do município do Cazenga, com o qual se iniciou com apenas 11 anos de idade.
É dos mais cotados instrumentistas do país, cuja trajectória está assinalada com vários sucessos. Que balanço faz do seu percurso?
O balanço é positivo embora haja ainda muito por fazer. Desde a fase inicial de inserção social como imigrante em Portugal, tudo parecia fluir demasiado devagar relativamente ao alcance dos objectivos traçados e fui-me munindo de grandes esperanças mesmo experimentando um modelo de vida totalmente diferente do que tinha deixado na terra de origem.
Como devem calcular, imigrar não é fácil, pois quando sentisse saudades da família e dos amigos do peito, recorria aos contactos telefónicos para confortar-me. A “Xuxu Nan Gai”, vulgo Kininha Feijó, companheira, amiga e esposa desempenhou um papel importantíssimo ao longo do tempo que preparava condições para receber a família em Lisboa.
O meu saudoso amigo e colega Carlos Burity num gesto de extrema empatia tornou possível a minha vinda a Portugal em Novembro de 1993, enquadrando-me contra a vontade de alguns colegas numa banda musical para acompanhá-lo em alguns concertos em Lisboa.
Por que razão não o queriam na banda?
Alguns dos referidos colegas através de falatórios aperceberam-se que fazia parte dos meus planos fazer uma temporada na Europa em prol da minha carreira profissional, por isso, receavam que jamais desperdiçaria tal oportunidade, tanto contrariaram-no, mas felizmente o meu amigo e conselheiro Carlos Burity, visionário, num gesto solidário e com optimismo deu-me muita força para que a partir da Europa pudesse contribuir consideravelmente na divulgação da nossa cultura.
Foi uma oportuna decisão?
A pertinente decisão com objectivos multifacetados surgiu da necessidade de ampliar os conhecimentos musicais, formação técnica e a promoção da música angolana numa altura em que as escassas escolas de música, indústria discográfica, estúdios de gravação áudio e concertos musicais paralisaram no país. Depois dos shows do malogrado Carlos Burity em Novembro, a mesma equipa de músicos fez o suporte musical do primeiro trabalho discográfico do cantor Pedrito.
Como foram os primeiros anos de vida artística em Portugal?
Na sequência das actividades musicais já em Portugal, integrei os Mabucu, Afra Sound Star, Kussondulola, Bonga, Katiós 2000, Semba Sete e era muito solicitado para gravação de guitarra. Em 1998 a consagrada editora discográfica intitulada NovÁfrica – Audiovisual do ilustre compatriota Dias dos Santos solicitou-me a fazer a produção musical do CD denominado “Jogo Mágico” do músico e compositor “Zé Maria Boyoth” por opção do cantor em referência e esta incumbência marcou a minha primeira experiência como produtor musical em terras de Camões. Não tardou para ser abordado pela RMS para a produção musical do CD intitulado “Memórias” de Carlos Lamartine e daí nunca mais parei.
Sabe-se que como produtor experimentou outras sonoridades alheias à música angolana?
Como produtor musical tomei as mais ousadas iniciativas musicais com a inserção de novos e inimagináveis instrumentos na música angolana, sobretudo com maior predominância no Semba. Até à data que decidi residir na Europa em benefício da cultura angolana, em Angola o Semba era abordado com percussão e voz ou por guitarras, baixo, teclados, percussão e sopros.
Decidi trazer para este magnífico estilo musical uma abordagem com maior abertura de modo a abranger significativamente um grande número de amantes de boa música, dando corpo à um antigo sonho: o desejo de tocar violino.
É um instrumento que adequou ao Semba?
A história do estilo musical Semba é marcada por uma etapa de grande visibilidade com a introdução do violino na música “Maka Grande” do músico e compositor Ângelo Boss interpretado pelo Maya Cool.
Numa proposta de arranjos musicais na produção da música “Makamba”, interpretada por Carlos Burity, além do violino e o hungo sugeri a introdução de rap que ocasionalmente foi criado pelo compositor e intérprete Jeff Brown.
Chegou a ser muito ousado para aquele contexto?
Os temas “Minga” de Carlos Burity, Oh Kitadi Kyami de Voto Gonçalves também beneficiaram de rap, criados pelo talentoso músico Dr. Minguedy dos“Embaixadores” e interpretado pelas belíssimas vozes de Vânia Oliveira, Ineida Marta e Edzila. O talk in drums, vulgo dondon marcou a diferença em “1900 e Kabuza” de Dom Kikas.
As guitarras com distorção nos temas “Maka Grande”,“Baza” e “Minha Farra” da venerada Paty Faria e entre outras. Ainda neste trajecto às ousadas experiências de novas sonoridades no Semba como produtor e arranjador musical, o “Udo” executado sabiamente pelo respeitável multifacetado músico Dalú, em Poema do Semba, composição e interpretação de Paulo Flores e Carlos Burity marcou a diferença.
Trabalhou com muita gente nestas viagens do Semba?
Sim. Vénia ao malogrado Galissa pelo seu grande contributo, com assinaturas de qualidade refinada na execução de korá nos temas “Ngui difangana” de Rui Mingas com participação do saudoso André Mingas, “Nzaji” interpretado pela Paty Faria, instrumental “Choros Melódicos” do grande maestro, compositor, músico plurifacetado Belmiro Carlos. Scratch em “Minha Farra” de Patty Faria,“Sexta-feira Dia de Boda” de Belito Campos, “Love Lame” de Proletário, “Luanda Terra Linda” de Gijas.
Além do violino que outros instrumentos ocidentais experimentou no Semba?
A harpa, guitarra havaiana e muitos outros instrumentos ocidentais inseridos no Semba trouxeram ganhos notáveis e estrondosos no desenvolvimento da música angolana.
As experiências com os instrumentos tradicionais (batuque, marimba, hungo, kissanje, puíta, dikanza, surdo, bate-bate, etc.) não escaparam, visto que não era muito comum nas formações musicais contemporâneas a congregação dos instrumentos modernos e os tradicionais e era necessário incentivar a prática deste interessante conceito dando sequência às poucas iniciativas existentes.
Cito alguns dos poucos exemplos: A puíta, dikanza, surdo e caixa corneta em alguns temas do Bonga, kissanje no instrumental intitulado “Fumaça em DÓ” do exímio tocador de guitarra Brando, alguns temas do malogrado músico e compositor Dikembé, grande tocador de kissanje, mestre Kituxe e o mestre Kamosso.
Consegue quantificar as músicas que tiveram o seu toque?
Este valioso contributo enquanto produtor e arranjador musical é de mais de 100 músicas, deixa-me imensamente feliz por afectar substancialmente a cultura angolana com grande incidência nos jovens promissores que pautam as suas carreiras de sucesso com recorrências constantes ao cenário criado pela Xibidon Produções a partir da diáspora lusa.
Esta realidade histórica deve constituir um motivo de orgulho, por isso, devemos reconhecer o valor da criatividade, talento, empenho e a persistência no trabalho abnegado em prol da cultura nacional, visto que nada que adquirimos na vida cai do céu.
Como é que se relaciona com a crítica?
Uma advertência para alguns dos supostos críticos musicais e agentes de cultura que quando são abordados a fazer um balanço sobre a modernidade da música angolana por conveniência omitem-na e, infelizmente, estes revelam-se nos maiores promotores empobrecedores da gigantesca, linda, rica e verdadeira história da cultura angolana. Não se faz história cultural com inverdades.
O senhor tem o registo de ter começado muito novo. Aos 11 anos de idade. O que o influenciou a abraçar carreira musical?
O desejo intuitivo pela música desponta numa altura em que o som apelativo da maior atracção cultural, o carnaval, as matinées dançantes abrilhantadas por conjuntos musicais e os kutonocas enchiam-me gradativamente de paixão pela música nacional.
Os diversos grupos carnavalescos que desfilavam nas ruas de Luanda de forma diferenciada, no gingar dos seus personagens, nas composições e nos animados ritmos quentes e cheios de swing tinham sempre uma interessante mensagem.
Não resistiu à tentação destes sons carnavalescos?
Por não resistir à tentação das batucadas dos referidos grupos e por perdição às mesmas, passei a tocar também percussão com recurso às latas e aos baldes que tinha em casa. A música nacional era consumida regularmente devido à sua permanente divulgação através dos meios de difusão massiva, por isso, toda esta envolvência cultural estimulou o desejo de fazer opcionalmente uma carreira musical.
Logo, a guitarra não foi o primeiro instrumento com que se identificou?
Devido ao tenro contacto com os sons da cândida tradição, os contágios das percussões induziram-me às experiências iniciais com os batuques. Na fluidez das emoções causadas pelas envolvências com os aspectos musicais mais modernos através das entranhas das músicas da época afeiçoei-me pela guitarra.
A música africana foi a principal influência?
Naquela altura os guitarristas nos conjuntos musicais desempenhavam um papel de relevo nas várias abordagens discográficas e em shows tinham uma expressiva visibilidade. Belas e gigantescas recordações dos guitarristas africanos que integrados em formações musicais num espírito de harmonia e coesão colectiva brindavam-nos carinhosamente com digníssimas obras de arte. Graças à Deus fui uma vítima destes feitos.
Que memórias tem da sua meninice sobretudo dos “Tópicos do Ritmo” e do município do Cazenga em particular?
Tive uma meninice feliz e de tanta saudade que aprisiono pela mesma, sempre que me recordo acabo por emocionar-me. Vivi esta fase ditosa da vida humana no bairro Rangel. A família era um grande motivo de orgulho e nesta altura já comportava o bichinho pela música. Fui tendo algum contacto com os grupos carnavalescos que passavam pelas ruas e assistia o “kutonoka” no bairro da Precol.
Quais são essas emoções?
No quintal da minha casa vivia um casal de primos que gostava-me imenso e de vez em quando levavam-me às matinés infantis, onde haviam também atractivos abrilhantados pelos conjuntos musicais. O man Domingo e a mana Chica, como carinhosamente os tratávamos, enchiam-me de mimos. Anos depois, mudamo-nos para o município do Cazenga – bairro Tala Hady onde o afecto pela música crescia gradualmente. Partilhava experiências musicais com alguns familiares e vizinhos sempre que fosse oportuno. Das partilhas com os vizinhos nasceram os “Tópicos do Ritmo”. Os membros mais regulares eram o Touré – percussão e voz, Paizinho Kambumbu – percussão, Zé Dialamikua – baixo, Tiguerra voz e percussão e o Pinto – percussão.
Tudo nasce a partir do meio familiar?
Em alguns convívios familiares com a guitarra de lata acompanhava temas do Elias Diá Kimuezo interpretados pelo Tony Feijó, temas do Sofia Rosa eram interpretados pelo Carlitos Feijó enquanto o Lopito Feijó declamava poemas e fazia coros. Este espírito de convivência salutar arrastou-se até à altura que o nosso MPLA criou o comité de acção. Integrados na OPA, dávamos corpo aos convívios culturais em companhia do cantor e animador do grupo cultural, o Maninho Plácido. Éramos todos estudantes e dedicados às actividades partidárias. Como patriotas munidos de um espírito revolucionário em prol dos ideais do partido, construímos armas de pau em defesa da nossa integridade física devido aos movimentos armados que em certa altura aterrorizavam a nossa tranquilidade espiritual.
Tudo a acontecer a partir já do Tala Hady?
Foi a partir do bairro Tala – Hady que sentida a necessidade de contribuir de forma mais assumida a defesa pela nossa independência, aceitei o convite do Adriano e fomos ao CIR Mussenga. Partilhamos a mesma caserna em companhia do camarada Tira Dente e o Tires. Depois de algum tempo comecei a sentir imensas saudades da minha kambanza (viola) e como a ausência do referido instrumento criava-me imenso desconforto não tive outra solução, regressei a Luanda, reintegrei-me na OPA e, posteriormente, ingressei na JMPLA e com a graça do Senhor às kambanzadas continuam até hoje a fazer furor em prol da cultura angolana.
É apreciador de Carnaval segundo constou-nos, entretanto reside fora do país há já alguns anos como é que vive essa festa popular distante das origens?
Embora procure munir-me de forças para me conformar, não tem sido uma experiência fácil. Apesar de residir em Portugal há mais de 20 anos, tenho o cordão umbilical ligadíssimo à terra onde nasci, motivo pelo qual, nas minhas execuções como guitarrista e produtor de música angolana cintilam com propriedade a originalidade dos nossos géneros musicais.
O carnaval está na alma de quem o ama e sempre que se avizinha a época da sua realização, o inexequível desejo de desfrutar presencialmente na terra do Kabocomeu, União Kiela, etc., cria um considerável desequilíbrio no meu estado emocional. Inconformado com a distância, não perco a oportunidade de acompanhá-lo pela nossa TPA.
Do que mais sente falta no Carnaval de Luanda?
De acordo com as minhas constatações e análises feitas como telespectador, concluí que tenho tido algumas limitações, o que não permite ter um horizonte mais abrangente da realidade do mesmo de modo a formular uma opinião sólida sobre os aspectos em falta. Deleito-me com o que vejo e considero exuberante.
Enquanto “carnavalesco” há aspectos que não lhe passam à vista?
Há um pormenor técnico que desde algum tempo não tem passado despercebido apesar das expectáveis restrições, devido ao visível impacto diminuto que causa nas músicas carnavalescas. Desde algum tempo a esta parte, os percussionistas dos grupos pouco brilham nas músicas carnavalescas gravadas em estúdio para posterior apresentação no dia reservado ao desfile oficial.
Como assim?
Devido ao método na captação dos instrumentos musicais nos estúdios de gravação a criatividade dos executantes é grandemente penalizada. O estúdio de gravação além de proporcionar uma boa sonoridade também nos retira alguma espontaneidade emocional na execução dos instrumentos musicais por querermos fazer sempre bem, evitando supostos erros e, por conta disso, às vezes nos inibimos e nos revelamos pouco criativos. Este contagiante estado de espírito quase generalizado reflecte-se na ambiência musical com fortes indicadores de fraca emotividade.
Era preferível que fosse som ao vivo?
Existe uma clara diferença entre os grupos que apresentam-se ao público com as suas quentes e estimulantes batucadas em relação aos grupos que fazem-na como som previamente gravado. A emoção que a percussão nos desperta, leva-nos à perdição total e tudo flui com muito mais alma. Em benefício do fomento generalizado da emotividade e da estimulação espiritual e valorização da nossa tradição num apelo à reposição dos percussionistas nas apresentações oficiais ao vivo, sou apologista que sejam criadas condições técnicas para o efeito.
Quando olha para sua geração, comparando com o que se faz actualmente em termos de criação musical. Há muitas diferenças a assinalar? O que mais o preocupa?
Sou do tempo que os valores morais e éticos eram respeitados. Com o tempo, lamentavelmente estes valores vão se esgotando. Actualmente, a degeneração vai-se instalando de forma assustadora em desabono da vivência e convivência salutar. As sociedades tornaram-se consumistas, vulneráveis e desproporcionais para os seres sociais acostumados às práticas dignas. Este triste cenário tem potenciado a legalidade de comportamentos desastrosos que obstaculizam o progresso sucessivo da cultura angolana.
Na governação anterior, infelizmente um número avultado de jovens empobrecidos de espírito revelava ao longo das suas experiências laborais comportamentos propensos à estagnação e mutilação cultural devido à subserviência.
Quer explicar-se melhor?
Graças a Deus estamos na era de uma Angola abençoada onde o apego às práticas dignas em uníssono nos remeterá ao resgate dos valores morais e éticos perdidos para o subsequente desenvolvimento de Angola. Peço desculpa, mas não me confortava reagir à pergunta formulada sem fazer uma narrativa de extrema importância que afectava substancialmente o futuro da cultura nacional. Na esperança de uma Angola próspera que trilha em prol do desenvolvimento e da valorização do nosso acervo cultural proporcionar-se-ão as políticas culturais ajustadas à nossa realidade, para incentivar os músicos jovens a assumirem com garra a cessante herdade.
Hoje estamos numa era moderna em que as criações são mescladas com outros instrumentos sobretudo ocidentais ou clássicos se quisermos. Temos com isso, conseguido manter as raízes da matriz musical angolana?
Sim é possível. O produtor musical e arranjador Betinho Feijó, em 2001, na sua primeira experiência com recursos aos instrumentos ocidentais marca uma nova etapa na história da modernidade do Semba. Solicitado pela editor discográfica RMS para a produção da música que dá o título ao CD cuja composição e música é de Ângelo Boss e interpretação de Maya Cool. Com muita convicção, sugeri ousadas propostas de arranjos e orquestração fora do que era habitual, com a introdução de violino, guitarra distorção, udo e timbales. Este estrondoso rebento que fez furor devido à sua inovação estética também despertou nos jovens o desejo de fazerem Semba.
Existem outros registos do Betinho Feijó nesse cruzamento com a modernidade?
Ainda na senda da modernidade, como timoneiro deste conceito tem os maiores exemplos de ousadia da modernidade musical do Semba. Seguem alguns exemplos de instrumentos ocidentais e sonoridades diversas e expressões de realce usadas nas suas produções e arranjos musicais: violino, viola, violoncelo, harpa, tuba, trombone grave, fluguel, trompete, saxofones, flauta, guitarra havaiana, guitarra laude, udo, timbales, guitarra distorção, baixo electrónico, scratch,rapper, kora, daburka, etc.
Quais são essas músicas a que faz referência?
“Minga”, Paty Faria – “Minha Farra”,“Pacheco”, “Baza”, “Zanga” ”Kalunga”, “Kibela”, “Caroço Quente”, “Nzaji”,Irmãos Almeidas – “Ngapa, Guilhermina”, “Proletário” – “Love Lame”, “Lemba”, Don Kikas – “1900 e Kabuza”, Ângelo Boss – “Big Boss”, Embaixadores – “Manico”,Rui Mingas e André Mingas – Nguidifangana, Xiame, Armanda Cunha
– Kibela,Margareth do Rosário Meu Marido, Lamartine – “Memorias”, Carlos Burity -“Vizinha”, “Chiquito”, – “Tonakaxi”, – “Makamba”, Santocas – “Bairro Indígena”etc.
Havia revelado há alguns anos que tinha o sonho de vir a instalar um estúdio de gravação áudio em Angola e abertura de uma escola de formação em música. Este sonho já foi materializado? Como está esse processo?
Infelizmente não, porque há mais de 13 anos que solicito o apoio dos órgãos competentes e nada prosperou. Por exemplo, há 8 anos aproximadamente, tive o feed-back de um pedido formulado à Presidência da República para obtenção de bolsas de estudo, eu e a minha esposa como beneficiários enviamos a documentação necessária e pediram-nos que aguardássemos, mas, nada prosperou.
No pretérito ano 2019 pela quinta vez solicitei à Presidência da República apoios através de uma carta com recepção acusada para a edificação de um estúdio de gravação áudio e uma escola de música e até hoje não obtive qualquer retorno.
A formação é um item que o preocupa bastante para a execução prática dos nossos músicos? Sim, sem dúvida alguma. Por natureza nós africanos somos munidos de muito feeling musical e com grande capacidade criativa, mas precisamos, necessariamente, de conhecimentos técnicos e científicos para ripostarmos sem gaguejo aos múltiplos desafios que ocorrem ao longo da carreira profissional. A formação amplia os horizontes e nos remete ao exercício de abordagens com conhecimento de causa. É dever comum rejeitar o empirismo, buscando permanentemente munições científicas para gerar sabedoria.
Como é que caracteriza a música angolana feita hoje?
Há males que vêm para desvendar o bem. As restrições impostas pelos rigorosos cuidados de prevenção para protecção da maldita Covid–19, a nossa rotina cultural e social foi afectada com relevantes alterações. Submetidos ao estado de quarentena surgiram diversas formas de natureza cultural para a manutenção da estabilidade emocional e psíquica dos seres sociais com particular destaque às lives musicais.
Estas têm sido uma das atracções máximas que de uma forma voluntária, carinhosa, solidária e pedagógica invadem as nossas casas com positividade remetendo-nos a profunda reflexão e fé para a posteridade.
E os nossos instrumentistas como os avalia?
Estou extremamente agradecido e feliz por ser produto musical de um privilegiado leque de mestres. Com a soma gradual dos mesmos em função do tempo a presente conjuntura revela a aparição de habilidosos instrumentistas que despertam muito orgulho à classe artística. A globalização tornou o mundo mais estreito e disponível a busca do vasto conhecimento através de meios técnicos e das redes sociais.
Os referidos entes, constituem um alvo preferencial dos autodidactas que pela vontade insaciável de desenvolverem excelentes técnicas para uso colectivo não arredam o pé. É notável, respeitável, contributivo e contagiante o progresso alcançado por alguns jovens instrumentistas. Os instrumentistas devem ser mais respeitados porque sem os mesmos, não seria possível dar-se corpo aos instrumentais dignos de respeito.
O que lhe falta ainda fazer tendo em conta o contributo dado à música angolana?
Com o passar do tempo pude aperceber-me que o valioso contributo prestado à cultura angolana até aos dias de hoje, faz parte de uma relevante trajectória como produtor musical, arranjador e guitarrista. De acordo com o balanço feito, actualmente com mais maturidade emocional, visão alargada e uma inesgotável energia vejo que falta ainda muito por fazer em prol do nosso património cultural. Aguardemos pelas surpresas.
É com certeza difícil perspectivar o“amanhã”, ainda assim o pergunto: que projectos tem em curso?
Não gostaria de adiantar informações sobre possíveis projectos. Prefiro surpreender-vos pela positiva.
Texto do “OPAIS”