Um obscuro major das Forças Armadas Angolanas, Paulo Lussaty, foi preso em Luanda, há poucos dias, quando tentava abandonar o país carregando em várias malas mais de 10 milhões de dólares e quatro milhões de euros.
O referido oficial, ligado à Casa de Segurança do Presidente da República, terá conseguido transferir para o exterior mais de um bilhão de dólares.
Sempre que leio notícias como esta penso naqueles filmes ou séries, ao estilo “Casa de Papel”, nos quais um grupo de malfeitores se junta para montar um grande golpe. Estes bandidos são quase sempre gênios da informática. Passaram também muitos anos praticando equitação, esgrima, mergulho, e estudando filosofia, física nuclear e mecânica quântica. Se tiverem sorte, chegam ao final do filme com um milhão de dólares — a distribuir por todos. Quase nunca têm sorte.
“Os malfeitores angolanos, esses, roubam um bilhão de dólares sem correrias nem sustos. Não se servem da inteligência e menos ainda da imaginação. Não investem anos a estudar. Não cansam o corpo a treinar artes marciais. Bastam-lhes dois gramas de ousadia e uma alegre e natural falta de escrúpulos”.
Bandidos ao estilo da “Casa de Papel” suscitam inevitável simpatia. Admiramos neles a coragem com que enfrentam o tédio de um quotidiano que nos amarra a todos, e a inteligência com que ludibriam as regras do sistema. Ronald Biggs, que fugiu para o Brasil em 1970, após participar no assalto a um trem postal, na Inglaterra, levou no Rio uma existência feliz e festiva. Chegou até a tentar carreira como cantor.
Em Portugal, o criminoso mais amado e respeitado da história atende pelo nome de Alves dos Reis. O português começou a sua carreira de vigarista aos 20 anos, falsificando um diploma de engenheiro que lhe permitiu trabalhar em Angola, onde ajudou a construir e ampliar uma importante estrada de ferro. Quando engenheiros legítimos colocaram em dúvida a segurança de uma ponte desenhada por ele, subiu na locomotiva, acompanhado pela mulher e filhos, e conduziu ele mesmo o trem. Em 1924, falsificou um contrato em nome do Banco de Portugal, com o qual conseguiu mandar imprimir em Londres 200 mil notas de 500 escudos — quase um por cento do PIB português de então. Com parte desse dinheiro fundou um banco em Angola. Preso no ano seguinte, alegou que engendrara todo o esquema com o único objetivo de promover o desenvolvimento de Angola. Ainda hoje há quem acredite nele e o defenda.
Acho mais difícil simpatizar com os atuais bandidos angolanos, que usam o dinheiro de todos para comprar carros e relógios; dinheiro esse que poderia servir para formar médicos e professores, construir escolas, ou combater epidemias. A rainha destes bandidos é Isabel dos Santos, a filha do anterior presidente, José Eduardo, que ainda há pouco era celebrada em todo o mundo como uma grande empresária, a mulher mais rica da África. Mesmo caída em desgraça continua tendo inúmeros admiradores. Basta visitar a sua página no Instagram.
Já não se fazem bandidos como antigamente. Não faltam, contudo, os tolos capazes de os amar.
José Eduardo Agualusa