A situação avançada de pobreza em Angola tem levado à rua centenas de crianças que por meios próprios tentam encontrar o seu sustento. O assunto é visto também como resultante da falta de visão político-administrativa que deve assegurar a satisfação das necessidades prementes individuais e colectivas dos angolanos.
À luz do artigo 80 da Constituição da República e de mais legislação, o Estado deve garantir às crianças além de protecção, acesso à educação, à saúde e alimentação. O filósofo e pedagogo, José Candeeiro, entende que esta situação a que as crianças estão entregues é também resultado da “má governação e do descaminho do erário público”.
“Muitas crianças são abandonadas pelos pais e rejeitadas pelo Estado, por isso muitas encontram na rua a sua morada onde fumam, se prostituem e fazem a prática de banditismo social”, diz o analista, para quem a causa deste mal deve ser vista sob o ponto de vista da “má qualidade da relação afectiva-emocional dos pais e por outro lado, o alto índice de desemprego. Associado a isto está também o fraco nível de literacia no seio de muitas famílias”.
Apesar dos instrumentos legais existentes para a protecção das crianças, o país tem estado a viver um cenário de vulnerabilidade dos menores em relação aos diversos perigos que a sociedade apresenta.
O jurista Mbote André aponta os problemas de acesso à saúde, à educação gratuita e de qualidade, a falta de registo, o alto índice de mortalidade, assim como a precariedade das famílias como causa da presença de crianças nas ruas. Aponta de igual modo a falta de políticas estruturadas para responder aos desafios sociais da actualidade.
“Com o alcance da paz, pensamos que estes problemas da criança teriam sido resolvidos. Há muita criança abandonada, sofrendo descriminação, sem acesso à educação, saúde e registo de nascimento apesar do esforço feito pelo Governo”, diz o jurista para quem o “Executivo precisa sair do papel e partir para as acções”.
“Não bastam os discursos bonitos nos papéis, é preciso sair destes discursos e partir para as acções concretas em favor das crianças”.
Preocupado com o crescente número de crianças na rua em situação de exploração para trabalho infantil, envolvidas em acções criminosas ou a recolher comida no lixo para sua sobrevivência, o Ministério da Acção Social, Família e Promoção da Mulher, por meio do Instituto Nacional da Criança (INAC), realizou um encontro com antigos meninos de rua para reflectir sobre o problema e tentar encontrar soluções para este problema.
Elsa Bárber, Secretária de Estado pra Acção Social, Família e Promoção da Mulher, afirmou, durante a suta intervenção no evento, que o Governo tem consciência dos problemas vividos pelos menores em Angola, por isso garantiu que esforços têm sido feitos para que a situação seja ultrapassada.
Para o jurista Mbote André “não se justifica que, num país rico em recursos agrícolas existam crianças a morrer de fome”.
Governo está sem planos
O Governo angolano “está sem planos para o crescimento multidimensional e multifacético para as crianças, razão pela qual não se vêem programas exequíveis que demonstram sinais de resgate e instrução de criança para garantir o seu crescimento e desenvolvimento a todos os níveis”, defendeu José Candeeiro.
Candeeiro criticou igualmente a falta de acção do Executivo angolano em relação aos 11 Compromissos da criança ratificado por Angola.
Um investimento sério no combate contra fome e a pobreza pode concorrer para solução do problema, segundo o jurista e docente Mbote André, que apela a uma tomada de posição mais eficaz das autoridades em relação à situação por que passam os menores em Angola.
“A criança de hoje será o adulto de amanhã. E se hoje não protegermos as nossas crianças estamos a comprometer o futuro de Angola e não só. Devíamos criar instituições fortes para educação das crianças e, por outro lado cumprir com o que dizem as legislações”.
O dever de lutar pelo bem-estar das crianças é de todos, diz José Candeeiro, que apela o envolvimento de todas forças vivas da sociedade angolana a fim de se puder mudar o actual cenário nas ruas do país, onde cresce a presença de crianças desamparadas e remetidas ao abandono total.