“Bornito de Sousa devia ter noção do ridículo em que está a cair” ao abrir processo contra ativista, diz analista. Ação do vice-Presidente de Angola, que envolve a filha, é rejeitada em Portugal, mas pode haver recurso.
O processo “Vestidos de Noiva” aparenta ter chegado ao fim, com o Tribunal de Instrução do Porto que decidiu no passado dia 16 de novembro não julgar Paulo de Morais. A queixa-crime foi avançada por Bornito de Sousa, vice-Presidente de Angola, a 3 de novembro, que considerou difamatórias as alegações do líder da Frente Cívica, Paulo Morais.
Este havia criticado nas redes sociais e num canal de televisão, a compra no estrangeiro, em 2014, de vestidos de noiva para o casamento da filha, Naulila Graça, que terão custado cerca de 170 mil euros. Analista alerta que a defesa de Bornito de Sousa ainda pode apresentar recurso e sublinha que o caso só serve para ridicularizar o regime angolano.
Na altura, o ativista anticorrupção lamentou nas suas alegações haver em Angola “gente a morrer de fome e de doença”, condenando a referida compra. Na opinião de Carlos Cal Brandão, advogado de Morais, o fundo da questão tem a ver com o exercício legítimo da liberdade de expressão, previsto na lei portuguesa, já que estava em causa o interesse público.
Acusações são de interesse público
“A senhora juíza considera que há um interesse público nas afirmações do doutor Paulo de Morais, no sentido de denunciar o que é o regime de Angola e a miséria do povo angolano”, explica o advogado e completa que “nos termos do artigo 180 do Código Penal Português deixou de ser crime e o processo é arquivado”.
O advogado explica que a juíza resolve arquivar o processo, mas os ofendidos têm a hipótese de recorrer para a Relação, pelo que pode haver uma decisão diferente. Posto isto, Carlos Brandão não acredita que isto venha a acontecer.
Contactado pela DW África, Paulo de Moura Marques, advogado do vice-presidente de Angola e sua filha, respondeu por e-mail e explica que “neste momento não pretende fazer qualquer comentário à decisão judicial conhecida”.
Liberdade de expressão prevalece
Orlando Castro, jornalista angolano baseado no Porto, considera a decisão do Tribunal “correta e esperada”, completando que “o direito de liberdade de expressão em Portugal não é o mesmo que o vice-presidente Bornito de Sousa pensa e que existe em Angola, são coisas diametralmente opostas”.
O jornalista pensa que se os acusados recorrerem, o resultado será igual. “Bornito de Sousa devia ter noção do ridículo em que está a cair e do contributo que está a dar para achincalhar a imagem da própria Presidência da República de Angola”, afirma.
Castro completa dizendo que “em Portugal se sabe que existem milhares de angolanos que têm de recorrer a lixeiras para comer, esta questão do custo do vestido de noiva só ridiculariza o regime”.