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Eleições em Angola: Presidente João Lourenço prometeu, “será que cumpriu a sua promessa”?

Centenas de milhares de empregos, combate à corrupção, mais e melhores infraestruturas – foram algumas das promessas do Presidente João Lourenço em 2017. Cinco anos depois, o balanço é misto.

Em agosto de 2017, quando o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) voltou a vencer as eleições, o cabeça de lista do partido, João Lourenço, assumiu a Presidência do país, sucedendo a José Eduardo dos Santos, que esteve durante quase quatro décadas no poder.

O novo Presidente prometeu resolver os problemas do povo. Na altura, garantiu que iria criar 500 mil empregos – foi uma das suas promessas mais famosas.

Há cinco anos, a taxa de desemprego em Angola rondava os 24%, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística. Mas o Governo não a conseguiu reduzir. Em maio de 2022, Angola registou uma taxa de desemprego de 30,8%, de acordo com a mesma fonte.

Numa entrevista recente à DW África, o secretário de Estado para o Trabalho e Segurança Social, Pedro Filipe, disse que a pandemia levou à perda de 200 mil empregos, que entretanto já teriam sido compensados.

Por outro lado, um relatório apresentado pelo Afrobarómetro indica que, no ano passado, quase metade dos cidadãos angolanos enfrentou uma situação de pobreza extrema, tendo ficado frequentemente sem comida suficiente, água potável, assistência médica, combustível para cozinhar e rendimento financeiro. Os economistas preveem que o rendimento médio por habitante diminua nos próximos anos.

Que propostas foram ou não cumpridas?

Muitos dos projetos de desenvolvimento prometidos pelo Governo de João Lourenço não passaram do papel. Um exemplo é a construção da primeira fábrica de fertilizantes de Angola, na província do Zaire.

Em 2017, até foi lançada a “primeira pedra” do empreendimento, mas o projeto não avançou. Só em junho deste ano foi noticiado o arranque das obras da fábrica, a dois meses das eleições.

“A produção de fertilizantes é um projeto que vem desde o tempo da administração portuguesa e que estava inserido no IV Plano de Fomento 1974-1979”, explica Manuel Alves da Rocha, economista e diretor do Centro de Estudos e Investigação (CEIC) da Universidade Católica de Angola.

“A ideia na altura e que prevalece é a de conferir à agricultura condições para aumentar a produtividade dos seus solos, tendo em vista o seu papel para a segurança alimentar do país, para a redução da pobreza, para o aumento dos rendimentos das famílias camponesas e para a construção da teia de relações intersetoriais fundamental para uma diversificação mais endógena da economia.”

Uma vez que fábrica de fertilizantes não foi construída, “é de esperar que a província do Zaire continue dependente da agricultura familiar, da atividade petrolífera e que continue a apresentar as taxas mais elevadas de pobreza em Angola”, comenta Alves da Rocha.

O aeroporto prometido à província também não foi construído. E “poderia ter sido um meio de ligação interprovincial que ajudasse a atacar as tremendas assimetrias regionais que caracterizam todo o país”.

Estradas construídas e por construir

A construção de estradas um pouco por todo o país foi outra promessa de João Lourenço. O Governo angolano conseguiu construir algumas delas, outras passaram para o próximo mandato, caso o MPLA vença as eleições de 24 de agosto.

Na província de Benguela, o MPLA prometeu, por exemplo, a construção do troço da EN100 no Lobito e cumpriu. Mesmo a tempo do início da campanha eleitoral, o troço que liga a rotunda do Africano à Unidade Operativa da Polícia Nacional foi inaugurado. Para além disto, ocorreu ainda a reabilitação da pavimentação, passeios, rede técnica e iluminação pública.

Já na província do Moxico, as promessas da construção de uma estrada no município do Lumbala Guimbo e no município dos Luchazes, ficaram por cumprir. O troço de 380 Km, em Lumbala Guimbo foi planificado. A ideia era ser asfaltado; porém, até ao momento, a via encontra-se em péssimas condições, fazendo com que cada viagem possa durar entre oito a dez horas. Em Luchazes, o projeto que previa 350 km de estrada tem apenas 50km construídos na era “pré-João Lourenço”. As obras estão paralisadas desde 2012 e o acesso à vila sede do município de Cangamba é limitado, sendo apenas possível fazer o trajeto com recurso a camiões.

Na perspetiva de Manuel Alves da Rocha, as infraestruturas de transportes são cruciais para tornar o país mais unido, mesmo do ponto de vista político. O economista angolano defende que “Angola devia aproveitar as condições que apresenta para se tornar numa economia mais dependente de si própria, por meio de uma intensificação das trocas domésticas, entre setores e regiões”.

Outras infraestruturas

Após cinco anos de mandato de João Lourenço, o balanço também é misto no que diz respeito à construção de outro tipo de infraestruturas. Citamos apenas alguns exemplos.

Na província de Malanje, o Governo prometeu, por exemplo, a construção da Mediateca Ngola Kiluanje, que cumpriu, e o desassoreamento do rio Malanje, que não cumpriu.

A mediateca comporta áreas de literacia digital infantil e de lazer, além de um auditório com mais de 140 lugares. Este é um dos trunfos do Governo de João Lourenço, embora as obras tenham começado com o seu antecessor, Eduardo dos Santos. Por cumprir ficou o desassoreamento do rio Malanje. Com esta obra, a cidade de Malanje poderia suportar, sem constrangimentos, as cheias provocadas pelas chuvas. Terá agora de esperar por outro mandato.

Enquanto Presidente da República, João Lourenço prometeu ainda dar uma nova imagem à cidade de Caxito, província do Bengo, através da construção de infraestruturas. A Urbanização de Caxito está a ser construída. A infraestrutura facilita o encaminhamento de águas residuais, iluminação pública, jardinagem e asfaltagem.

A promessa do combate à corrupção

À DW África, Rui Verde, jurista português, refere que o trabalho de João Lourenço nos últimos anos não foi fácil. Muitas promessas feitas pelo Presidente não terão sido cumpridas devido a um “programa duro de saneamento financeiro em articulação com o Fundo Monetário Internacional [FMI] que limitou as opções e não foi devidamente explicado à população”.

“A Presidência de João Lourenço foi atípica. Aparentemente, ninguém lhe tinha passado devidamente os dossiers de governação e ele foi andando de surpresa em surpresa. Nessa medida, houve muito improviso e teve de ser criado um programa novo de Governo. Esse programa baseou-se na luta contra a corrupção e no saneamento económico com o apoio do FMI. Não há dúvidas que houve progressos, mas não foi perfeito. Gosto de dizer que João Lourenço está a meio da ponte. Tem ainda um longo caminho a percorrer, mas já deu alguns passos”, diz Rui Verde.

A luta contra a corrupção foi uma das principais bandeiras da governação de João Lourenço, mas os críticos acusaram-no de fazer um combate seletivo, visando sobretudo elementos da família do ex-Presidente Eduardo dos Santos e outros “inimigos políticos e pessoais” do atual chefe de Estado.

O economista Manuel Alves da Rocha refere que, cinco anos depois de João Lourenço chegar à Presidência da República, a corrupção continua instalada no país, na economia e na sociedade, “não escapa a nenhum setor ou atividade”.

“As adjudicações diretas de obras do Estado e da prestação de serviços às entidades públicas – mesmo que possam estar escudadas pelas leis, muitas vezes elaboradas para esse propósito – não deixam de ser uma modalidade de exercício de corrupção, ainda que disfarçada de tráfico de influências, falta de transparência e impunidade, que o atual Presidente, aquando da sua posse, em 2017, jurou combater ferozmente”, diz Alves da Rocha.

Rui Verde considera que este foi um mandato muito difícil, com “demasiados” desafios.

“A minha apreciação não é negativa. Houve um esforço, há uma tentativa de tirar Angola do pântano e, no fim de contas, cabe aos angolanos tratar disso. A situação como estava em 2017 era insustentável. Está tudo bem? Não está, mas tenho a sensação que, embora com percalços, se tentou fazer algo”, afirma.

Oito formações políticas concorrem às eleições de 24 de agosto, as quintas na história do país. 14 milhões de eleitores estão registados para votar, incluindo, pela primeira vez, residentes no estrangeiro.

 

 

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