Isabel dos Santos regressa às redes sociais onde mostra um novo visual e uma atitude de maior confiança, ao mesmo tempo que entra com vários processos em tribunal para enfrentar aqueles que acusa de “perseguição política” e “vingança pessoal”.
O desmoronar do império de Isabel dos Santos, que já foi considerada a mulher mais rica de África, com uma fortuna avaliada em dois mil milhões de euros, afastou-a dos meios empresariais, políticos e sociais, obrigando-a a auto exilar-se no Dubai, numa das ilhas artificiais daquele território do Médio Oriente.
Com as contas bancárias congeladas, os bens arrestados, empresas bloqueadas, a perda de participações em várias sociedades, a divulgação de documentos comprometedores nos media e as muitas ações judiciais que enfrenta em vários países, a poder da outrora chamada “Princesa de Angola” parecia condenado a ofuscar-se.
Acossada, acabaria por se afastar da ribalta. Permaneceu na sombra. Pelo meio enfrentou a morte prematura do marido, Sindika Dokolo. Perdeu a confiança de algumas das pessoas que lhe eram mais próximas, como foi o caso de Mário Leite da Silva, seu braço direito nos negócios, ou do advogado Jorge Brito Pereira, que a representou durante mais de uma década. Recentemente, as autoridades dos Emiratos Árabes Unidos começaram a dar sinais que não estão agradados com a sua presença no Dubai, devido às pressões internacionais para que as suas contas nos bancos daquele território sejam também congeladas.
As imagens que nos iam chegando mostravam uma mulher abatida, abalada e sem o glamour que tanto a caracterizava durante o seu “reinado”. Parecia o cenário perfeito para sair de cena. Perto de si tinha o seu pai, José Eduardo dos Santos, ex-presidente de Angola, que foi viver para o Dubai após a morte de Sindika Dokolo, para dar apoio à filha.
Mas Isabel não esteve parada. Bem pelo contrário. Durante este período traçou várias estratégias de defesa. Agora passou ao ataque. E em força. Mudou de atitude, de visual e de postura, passando uma imagem de maior confiança, de quem está outra vez no controlo. E fez questão de o divulgar através das redes sociais.
Contratou uma empresa de investigação israelita, a Black Cube, criada por antigos agentes da Mossad, a polícia secreta de Israel, que conseguiu captar gravações secretas de alguns membros da elite política de Angola.
No final de março iniciou uma batalha jurídica entregando estes e outros documentos do tribunal de Londres, que, alegadamente, mostravam que João Lourenço deu ordens a juízes, procuradores e até a espiões angolanos para avançarem com ações judiciais e com uma campanha política para acabarem com o seu império empresarial. Acusa ainda o atual presidente de Angola de orquestrar uma agenda política de “vingança pessoal” contra si.
Michelle Duncan, assessora jurídica de Isabel dos Santos disse na altura que “as muitas horas de gravação áudio e vídeo fornecem um relato claro das inúmeras técnicas criminosas usadas ao longo de vários anos para enquadrar, difamar e isolar ilicitamente Isabel dos Santos”.
Esta semana, Isabel dos Santos voltou ao ataque. Em entrevista à Bloomberg, no Dubai, voltou a acusar João Lourenço de estar a destruir “centenas e centenas de milhões de dólares” de valor de empresas angolanas, bem como milhares de postos de trabalho, devido aos bloqueios que as suas empresas foram alvo.
Entre estas estão a fábrica de cerveja Sodiba, que produz a Sagres em Angola, cuja atividade está abaixo de um terço da sua capacidade, os supermercados Candando que tiveram de ter apoio estatal para não fechar as portas a metade das lojas, uma cimenteira, uma fábrica de embalagens de vidro, entre outras.
Em Portugal a sua situação também não tem sido fácil. Depois de perder a sua posição acionista de 72% na Efacec, nacionalizada pelo Estado português em 2020 devido a um impasse que que comprometia a atividade da empresa, a empresária tem os outros ativos bloqueados, nomeadamente as participações na NOS, na Galp e no Eurobic.
Segundo o Correio da Manhã, este mês Portugal entregou uma carta rogatória à Procuradoria-Geral da República de Angola, com mais de sete mil páginas onde se encontram discriminados os negócios realizados entre a Sonangol, empresa que foi liderada por Isabel dos Santos entre 2016 e 2017, onde Isabel dos Santos teve uma participação no capital, e algumas centenas de empresas.
Na mesma entrevista, Isabel dos Santos ataca também o Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação, que divulgaram o relatório Luanda Leaks, afirmando que os documentos apresentados são falsos, numa operação que foi montada pelos poderes de Angola.
Nesta entrevista, Isabel dos Santos nega qualquer irregularidade e afirma que por ser filha de um presidente esteve sempre sujeita a um grande escrutínio. “Se o meu pai quisesse privilegiar os filhos e torná-los muito ricos, o mais fácil teria sido dar a concessão de direitos de petróleo ou outros contratos no setor. Não construí nada suportado no petróleo”, justificou.
Sobre as afirmações de Isabel dos Santos, o ministro da Coordenação Económica de Angola, Manuel Nunes Júnior, disse à Bloomberg que o estado angolano está a usar todos os meios legais, judiciais e diplomáticos para garantir o repatriamento” dos ativos retirados do país, concluindo que a repatriação voluntária desses bens poderia ser levada em conta durante o julgamento.
No entanto, no início do ano passado, João Lourenço fez saber que não irá entrar em negociações com pessoas acusadas de corrupção alegando que “o período de graça” para que todos os angolanos repatriassem capitais e bens no estrangeiro tinha terminado em 2018.
Apesar desta reação musculada, o cenário não é o mais favorável para Isabel dos Santos. João Lourenço acusa a família de José Eduardo dos Santos de ter desviado mais de 24 mil milhões de dólares de Angola. Deste total, os procuradores angolanos admitem que Isabel dos Santos é responsável por lesado o País em cinco mil milhões de dólares. No entanto, é a própria justiça angolana a reconhecer que este caso poderá arrastar-se por vários anos nos tribunais devido “à complexidade dos crimes de que é acusada”.
A sua meia-irmã, Tchizé dos Santos, veio também esta semana dizer que estava a ser vítima de perseguição por parte do presidente angolano por ter pedido às autoridades portuguesas uma lista com os bens que a empresária tem em Portugal.
Segundo a Agência Lusa, existe um relatório pormenorizado com os saldos bancários, os imóveis e transações bolsistas de Tchizé dos Santos. “Não estou preocupada. Se o presidente João Lourenço me quiser perseguir até à Conchichina que persiga. Ainda não está proibido aos empresários investir fora do país”, disse.
Anteriormente, Tchizé tinha apelado, através das redes sociais, ao fim desta “luta de titãs”, alegando que se “se não parar com esta luta, não haverá condições para que a economia cresça”.
Mas o fim das hostilidades é um cenário cada vez mais irrealista. E Isabel dos Santos parece, mais do que nunca, disposta a contra-atacar. Pode até reaver parte do seu antigo império empresarial e dos bens que estão congelados, mas dificilmente conseguirá recuperar a sua reputação perante a opinião pública mundial.