Dezenas de residentes da comunidade de Caimbra transformam lixo do aterro sanitário do Lobito em alimento. Agentes de saúde e professores dizem que pessoas são obrigadas a tratar doenças com raízes e folhas “cura tudo”.
Mais de 30 pessoas da comunidade de Caimbra lutam diariamente pela sobrevivência no aterro sanitário do Lobito, na província angolana de Benguela. É no lixo que dezenas de pessoas encontram o que comer e também é por viver no lixo que elas acabam por adoecer.
O soba Estevão Solino lamenta a falta de apoios para combater as doenças da comunidade. “Se falarmos das doenças… Falta mosquiteiro e medicamento também. As crianças já estão com febre e malária. Aqui, essa situação já dura um mês e alguns dias”, explica Solino.
Numa das residências de Caimbra, a DW África encontrou Marcos Joaquim, de 14 anos. O adolescente sente-se mal já há três dias e não está a tomar nenhuma medicação. “[Tenho] febre e dor de cabeça e não estou a tomar nada”, diz.
A mãe de Joaquim não esconde a tristeza ao ver doentes seis filhos. Dona Chipinha Chimungo afirma que não tem dinheiro para os levar a um centro de saúde. “As crianças não estão bem, têm febre, tosse e dor nos ossos. Não tenho dinheiro para lhes levar ao hospital, não tenho medicamento para lhes dar. Só comem se Deus quiser”, lamenta Chimungo.
Folhas “cura tudo”
Paulino Miguel, de 25 anos, diz que o que ganha do lixo não é suficiente para comprar medicamentos. “Não chega para sustentar a casa. Quem está doente é a criança. Ela está com febre e dores pelo corpo e está internada num hospital no centro da cidade”, diz o vendedor de garrafas.
A professora da comunidade, Florinda Ester, conta que, por falta de assistência médica e medicamentosa, os residentes são obrigados a recorrer a raízes e folhas “cura tudo”. Ester diz que os residentes daquela zona sempre estão doentes.
“A medicação que estão a tomar é mesmo essas raízes e folhas cura tudo. Quando têm dinheiro, vão comprar medicamentos. Nas consultas, para eles chegarem ao hospital, é muito difícil. Porque é distante e não há transporte”, explica.
Preocupação com a tuberculose
O enfermeiro Januário Branco, voluntário da Repartição Municipal da Saúde, diz que há também casos de tuberculose na povoação vizinha a Caimbra, em “Monte Gil”. Branco diz que 70% das pessoas doentes na área estão com paludismo.
O enfermeiro atribui a alta incidência de doenças aos mosquitos e moscas, que proliferam-se com as chuvas e o lixo. “Realmente a patologia principal é o paludismo. Depois de Caimbra, lá em frente, há uma outra povoação, onde duas mamães provavelmente encontram-se com tuberculose”, diz Branco.
A equipa da DW África tentou ouvir as autoridades da saúde, mas o até ao momento do encerramento desta reportagem não obteve respostas às solicitações de entrevista.