O fecho do canal ZAP Viva, de Isabel dos Santos, vai afetar centenas de funcionários. O encerramento de mais uma televisão prova que o Governo de Angola quer controlar todos os meios de comunicação social, diz analista.
O canal ZAP Viva, que pertence à empresária angolana Isabel dos Santos e que estava suspenso desde abril do ano passado, vai encerrar e despedir centenas de funcionários. É o segundo canal a fechar portas na sequência da decisão do Ministério das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social, depois da Vida TV, que pôs fim às suas atividades em julho de 2021, deixando no desemprego mais de 300 profissionais.
A União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), o maior partido da oposição angolana, solidarizou-se com os trabalhadores afetados pelo encerramento do canal ZAP Viva e considerou que a medida que levou a este desfecho foi “política e revanchista”.
Sobre o assunto, a DW África falou com Fernando Macedo, professor de Ciência Política e Direito Constitucional na Universidade Lusófona de Luanda. O fundador da Associação Justiça, Paz e Democracia (AJPD) sublinha que o encerramento de mais uma televisão prova que o Governo de Angola quer controlar todos os meios de comunicação social, sendo públicos ou privados, mesmo aqueles detidos por pessoas ligadas ao poder, ou – como no caso da ZAP – meios de comunicação de pessoas ligadas ao poder, mas que entretanto caíram em desgraça.
DW África: Como enquadraria, como cidadão que observa a comunicação social em Angola, este encerramento de mais uma TV em Angola?
Fernando Macedo (FM): A maior parte dos proprietários de órgãos de comunicação social privados são pessoas que estão ligadas ao regime do MPLA. E Estas pessoas tiveram de facto e continuam a ter um problema de justificação dos recursos financeiros e dos processos por via dos quais legalizaram, criaram e constituíram esses órgãos comunicação social.
DW África: O canal ZAP Viva, que pertence a Isabel dos Santos, estava suspenso em Angola desde abril do ano passado e agora vai encerrar definitivamente e despedir centenas de funcionários. Concorda com o facto desses canais, mesmo pertencendo a pessoas ligadas ao poder, terem contribuído para uma certa abertura na comunicação social em Angola?
FM: Na minha perspetiva, havia uma abertura relativa, uma ilusão de pluralismo porque sempre que tocasse o sino e fosse preciso manter o poder do regime, esses órgãos não continuariam com uma comunicação social aberta, crítica e de facto imparcial. É certo que abriram de certa maneira o seu espaço para algumas vozes críticas, mas nós assistimos ciclicamente ao fecho de programas de debate, etc., nesses órgãos de comunicação social.
DW África: Este encerramento da ZAP Viva significa que o governo angolano acha que tem o direito de encerrar qualquer canal no momento em que este não lhe agrade, alegando “inconformidades legais”?
FM: Não estamos perante um problema que é no fundo sabermos quais são os critérios e a imparcialidade do Executivo angolano, liderado pelo Presidente João Lourenço, no sentido de dar igual tratamento a todos os proprietários dos vários órgãos de comunicação social. Nós temos várias rádios privadas e o que se diz é que essas rádios são propriedade de membros da nomenklatura, de oligarcas, de corruptos do MPLA. E a questão que se coloca é: esse tratamento é geral, generalizado ou é apenas uma tentativa do Presidente João Lourenço controlar tudo e todos?
DW África: No caso da Zap Viva, a dona é Isabel dos Santos, que entretanto caiu em desgraça no regime e a UNITA diz que o encerramento do canal foi uma medida “política e revanchista”. Concorda?
FM: Bem, eu gostaria de perspetivar as coisas numa lógica de combate à corrupção, mas também não posso deixar de dizer que no plano do combate à corrupção, o combate à corrupção está a ser seletivo. E portanto se não houver seriedade da parte do presidente João Lourenço, parece-me que a UNITA terá razão porque ele usa duas medidas e dois pesos. Se o Presidente João Lourenço estiver apenas a combater a corrupção em relação a algumas pessoas, isto redunda no problema de sabermos quais são os critérios que ele usa para fazê-lo. Se há mais membros do MPLA, se há oligarcas, se há corruptos que também têm outros órgãos de comunicação social, a pergunta que se coloca é por que razão o Estado só ataca alguns. E nesta lógica eu daria razão à UNITA. Nós precisamos de seriedade para termos de facto uma sociedade pluralista e que respeita a liberdade de imprensa, porque na verdade o que acontece é que na maior parte dos órgãos de comunicação social privados sejam jornais, rádios ou televisões, há uma certa abertura para conquistar audiências, etc., mas há sempre uns travões, uns limites da liberdade de imprensa. Porque se houver algum programa que começa a fazer mossa ao regime, há ordens para se fechar esse programa. Nós temos sido confrontados com esta prática.